"Fabricando temor e sustentando temor, tornando a insegurança a síntese de todos os medos, faz com que a gente não perceba o medo de perder o emprego, o medo de não ter mais um sistema previdenciário, o medo de não ter mais garantias e direitos sociais, tudo isso está embutido em um medo generalizado da insegurança", analisa.
[caption id="attachment_137438" align="aligncenter" width="600"]
É bom lembrar que há uma tensão constitutiva entre a concepção militar do Exército e a concepção militar da Polícia Militar. É muito interessante a gente lembrar que as várias vezes que o governo militar e as Forças Armadas atuaram no Rio você não teve uma integração, ou uma articulação ou uma subordinação. Pois há doutrinas, filosofias militares distintas. Normalmente quem colabora mais, quando se tem presença de militares controlando a segurança pública, e não é de agora, é a Polícia Civil. Tem que lembrar que a segurança pública deixou de ter militares em seu comando no governo Brizola. Nós passamos quase 180 anos com atores militares chefiando a PM do Rio de Janeiro ou ocupando a secretaria de Segurança Pública. Se tem uma novidade é o comando civil das polícias do Rio de Janeiro a partir de 1982, 1983. É bom lembrar que nesses períodos que tinha general no comando quem mais obedecia era a Polícia Civil. Quem tinha mais a ganhar com recursos extras era a Polícia Civil. Essa se mostrava mais obediente e mais aliada que propriamente a PM, que sofre de disfunção militar. Ela sequer tem hoje uma estrutura de comando e controle militar. O que reflete o que estamos vendo. A operação da Maré, aquele 'tiro, porrada e bomba', com mais de 160 tiros, uma exuberância, um gasto excessivo de munição, desnecessário, razão munição X taxa de acerto, de tiro defensivo, é nula, o que mostra incapacidades e incompetências. Foi feito por quem? Quem tem praticado o caveirão voador? Não tem sido a Polícia Militar. A PM já aprendeu, desde a queda do helicóptero no Morro dos Macacos, que não existe plataforma de tiro móvel em segurança pública. Isso maximiza temor, insegurança, acidente e incidente na gestão da segurança, na redução dos riscos. Quem tem feito isso é a Polícia Civil. Então, olha bem como é interessante o que se passa aqui. Você tem uma disputa. Quem disse que bater continência quer dizer obedecer? A polícia trabalha com uma lógica tático-operacional, e o Exército com o inverso. Portanto há conflitos deliberados, que fazem com que a PM cruze os braços e aguarde o espetáculo feito por outros. Fórum - Dados da Comissão Popular da Verdade mostram que o número de tiroteios e mortes causadas por intervenção policial aumentou desde o início da intervenção. Um outro dado interessante é que, com a intervenção, se diminuiu em 39% a apreensão de armas, fuzis e metralhadores. O que estes dados significam, na sua opinião? [caption id="attachment_137437" align="alignleft" width="432"]Abandonou-se a segurança para a produção de teatralidade

Queria chamar atenção que na Maré, por exemplo, quando as Forças Armadas estiveram lá por um ano, estimou-se em torno de R$650 milhões. Os dados do Ministério da Defesa dizem que foi R$450 milhões. Vamos tomar esse número. Um ano para servir de sentinela de condomínio popular, guarda de guarita. Por que essa é a experiência que eles tem, é ficar na guarita. Por isso eles fazem cerco. Como o crime é itinerante, o policiamento tem que ser dinâmico. Ele vai estar onde tem mais fluxo de população, acompanhar circulação e deslocamento das pessoas, é isso que reduz o crime da esquina que todo cidadão está exposto. O cidadão está amedrontado, assustado, você anda pela rua você vê cercos sem qualquer lógica. Você está sempre sob tensão. E manter as pessoas assustadas, sob tensão e inseguras, tem rendimento político. Por que faz com que a gente não consiga se mobilizar em torno de uma agenda construtiva de direitos para os policiais e para a cidadania. Voltando ao caso da Maré, olha que interessante: você gastou R$450 milhões e não se produziu resultado algum, melhora nos indicadores de segurança pública. Por que não se está fazendo segurança pública. É uma propaganda para dizer: olha como é legal fazer guerra, olha como é legal fazer bico na segurança. As pessoas complementam seus orçamentos. As Forças Armadas complementam fazendo esse bico sem gerar qualquer resultado. Não há doutrina para isso. Vai gerar espetacularização do medo, do temor, que retroalimenta discursos autoritários e catárticos. Não melhorou as condições das apreensões e nem prisões.O que estamos vendo é que sai um traficante de estimação e entra outro, para que possa contribuir com recursos eleitorais
No caso da Maré, se gastou esses R$450 milhões. Digamos que você quisesse fazer um programa de redução de riscos de juventude em vulnerabilidade, já que jovens são aqueles mais expostos a praticar violência e serem vítimas de violência. Digamos que situação é: quero fazer algo para além do imediato, para além do espetáculo do visível. Se você fazer um projeto, um programa de empreendedorismo, seja cultural, seja de esportes, 'meu filho, começa aqui a fazer alguma coisa da sua vida', com CPF individual de cada jovem. Editais assim. Se quisesse fazer isso para 10 mil jovens da Maré, o que é muito mais do que precisa, você gastaria R$100 milhões, por um ano. Se você quisesse abrir as ruas, criar mobilidade, porque para que você possa prover segurança a ambulância tem que chegar, o Correio, assim como a viatura da polícia. Quer dizer, acessibilidade, mobilidade urbana. Como a gente mede que tem segurança? Quando tem circulação de ir e vir. Se quisesse fazer um programa de abrir ruas, tirar as comunidades populares de seu confinamento, integrá-las à cidade: na Maré, com R$50 milhões você abria. Não estou falando nem de urbanizar, estou falando de abrir. Não é ficar tirando barricada de manhã para ela voltar a noite. É isso que eles estão fazendo aqui, brincando. Brincando de virilidade. Aqui no Rio nós temos uma política dos 3 “s”: primeiro você dá um susto na população, depois cria um surto de insegurança, e depois produz soluços de operações. São soluços, são espasmos. Se quisesse investir em inteligência, com mais R$10 ou R$15 milhões você resolvia. Se gastasse R$150 milhões dos R$400 que foram gastos, teria feito alguma diferença. O problema não é do dinheiro ou preparo e competência. O problema é de prioridade política. O Rio de Janeiro vive esse espetáculo, tanto é que os tiroteios aumentaram, as chacinas aumentaram. Todo mundo fica nervoso. Aí as pessoas pedem mais repressão. A repressão é um fim em si mesma. E quando ela dá certo ela é cara, e quando dá errado, quando é burra, é mais cara ainda. E é sempre escassa. Por isso você fica morrendo na praia e enxugando gelo. Essa é a razão de ser das operações. Elas não controlam território, elas não controlam população, fluxos. É essa teatralidade que é um comercial macabro que não serve ao cidadão, não serve ao policial que tem um armamento vagabundo. Serve a quem? Quem está ganhando com esses recursos licitatórios aqui? O plano é sempre custeio e aquisição. É sempre isso. Vou ali faço um bico, uma faxina, em compensação ganho mais um troco para complementar minha renda orçamentária. É propaganda de uma guerra? Qual guerra? Alguém aqui decretou independência? O Comando Vermelho decretou independência, soberania sobre território? Há recrutamento para montar um exército rival? O crime não precisa disso, o crime corrompe. É só pagar propina.Manter as pessoas assustadas, sob tensão e inseguras, tem rendimento político. Por que faz com que a gente não consiga se mobilizar em torno de uma agenda construtiva de direitos para os policiais e para a cidadania
Um outro dado: aqui no Rio de Janeiro essa brincadeira de guerra tem um mapa político, geopolítico, eleitoral. Que é ampliar o o território e influência da milícia. A milícia hoje é o principal problema no Rio de Janeiro. Por que ela é o crime dentro do Estado. Ela tinha um percentual pequeno de territórios no Rio, hoje ela está chegando na metade. Então, estamos falando de uma unidade criminosa que financia campanhas eleitorais. Estão usando o Exército de bobo, as Forças Armadas de bobo, estão se expondo ao ridículo, porque não conseguirão produzir resultado. Não diminuirão o crime.O problema é de prioridade política
Fórum - Você acredita que esse clima de insegurança e medo, como você falou, criados intencionalmente, como projeto político, terão reflexos eleitorais? Jacqueline Muniz - É possível. O medo é um péssimo conselheiro. Diante do medo e do agravamento do temor nós abrimos mão dos nossas garantias individuais e coletivas em favor do fortão da esquina que venha resolver de imediato nossos problemas. Por que segurança e medo não se adiam. Não dá para dizer que vai sentir medo só daqui a três meses, medo se sente no aqui e agora. O problema é que o miliciano simpático, o traficante gente boa, e todos os outros fortões de ocasião, são os libertadores de hoje e os tiranos de amanhã. Ou seja, eles vão cobrar taxas. Custa caro ficar brincando de chefe de disciplina. Nós aqui temos mal hábito de achar que nossa igualdade e liberdade é como um playground, você fica ali até a hora que chega um chefe de disciplina que desliga os brinquedos e diz que ninguém mais vai brincar de democracia. O problema é que dar golpe custa caro. E tem uma coisa, a fantasia do poder moderador no Brasil, que é dado a dois atores, as Forças Armadas e aos meios de comunicação. Eles aprenderam que não é necessário gastar arma, por que o recurso coercitivo é escasso. Por isso que fazem operações que eu chamo de soluços. O programa dos três “s”. Por que isso? Por que fabricando temor e sustentando temor, tornando a insegurança a síntese de todos os medos, faz com que a gente não perceba o medo de perder o emprego, o medo de não ter mais um sistema previdenciário, o medo de não ter mais garantias e direitos sociais, tudo isso está embutido em um medo generalizado da insegurança. A população não está errada em pedir segurança. É que aqui já se abandonou a segurança há muito tempo em favor da fabricação de temor, e do agravamento desse temor. Isso é construído e administrado pelo governo. Por que soluções de segurança pública são mais baratas que a farra da gastança licitatória. O que é segurança pública no cotidiano? Monótono, por que quando dá certo a gente não vê. Aqui tem que ser barulhento. Polícia ostentação. Crime ostentação. É uma incompetência de todos os lados. Por que na verdade quanto mais ostentação criminosa você faz mais você tem que fechar o seu negócio. Imagina, você tem uma boca de fumo que precisa dar dinheiro, isso é um negócio. Todo dia você dá tiro para cá e tiro para lá? Seu cliente não vai lá. Da mesma maneira uma polícia barulhenta gera medo, gera insegurança, maximiza o risco dela mesma. São todos polícia do depois. A expectativa é que, maximizando o medo e insegurança, as pessoas escolham um protetor de ocasião. O problema é que a teatralidade excessiva, o espetáculo quando é de mau gosto, a gente espectador observa que a coisa não está indo bem. Então aqui o remédio amargo da intervenção gerou exceção. Para fazer um omelete, tem que quebrar um ovo. Parabéns, quero saber quem vai ceder os ovos? Por que até agora os ovos são os filhos dos pobres, são os pretos pobres que moram longe. Eu quero saber quem vai entregar seus filhos? São os pobres, de onde saem as polícias. A polícia no Rio de Janeiro não é branca, em sua maioria mora na periferia. Quem são os matáveis? Os policiais e as comunidades populares. O que há aqui é uma economia politica do clima que visa uma ambição, gerar monopólios ou quase monopólios. O problema aqui é que nossas facções são muito barulhentas, desorganizadas. Elas tem unidade tática mas não unidade política. De um lado o PCC e de outro a milícia. Uma espécie de novo Tratado de Tordesilhas político. Vai diminuir tiroteio, vai ficar invisível, todo mundo ganhando na farra da corrupção e da violência, e na invisibilidade.Aqui no Rio de Janeiro essa brincadeira de guerra tem um mapa político, geopolítico, eleitoral. Que é ampliar o o território e influência da milícia
Estamos falando de uma unidade criminosa que financia campanhas eleitorais
Queria lembrar um ponto que falei na minha entrevista em fevereiro, que teríamos censura, uma defasagem no acesso aos dados. É o que está acontecendo. A gente não sabe os custos dessa operação, a gente estima os custos a partir das anteriores que o Ministério Defesa teve que prestar contas. Um gasto absurdo, os resultados políticos são, sim, perigosos, porque fabrica-se esses fantoches, ventríloquos, que prometem o santo graal, o fim do pecado da humanidade. Por isso mesmo eles não podem ser testados, nenhum deles fez nada de objetivo e concreto pela segurança pública, vivem de discursos catárticos. Por que morte de cidadão e morte de policial é palanque eleitoral. Cada policial morto dá um velório, cada velório permite que um ventríloquo irresponsável diga que precisa agravar a repressão. Só que eles são tão estúpidos, porque repressão é caro e nobre, ela é o recurso necessário em democracias, cara e nobre. Mas se você aplica ela toda hora você vai gerando escassez, e inviabilidade de sustentar o efeito repressivo. Por isso que as operações aqui tem prazo de validade. Igual remédio velho. Não tem como sustentar nem aqui e nem lugar nenhum do mundo. Só serve para atender a um projeto de poder. Um projeto político que é produzir insegurança, maximizar medo, deixar todos feito barata tonta e criar a síndrome da pequena autoridade na esquina. Agora está todo mundo para predar, porque não há governabilidade. Quem pensa que o general dá um soco na mesa e na esquina se obedece, está enganado. Está cada um tirando o seu, cada cabeça uma sentença. Você anda pelo Rio de Janeiro e é bom ter passaporte com bastante vistos. Se você parou por um policial também vai ser parado pela milícia, tem que dar satisfação por sair de casa. Essa é a realidade.Fabricando temor e sustentando temor, tornando a insegurança a síntese de todos os medos, faz com que a gente não perceba o medo de perder o emprego, o medo de não ter mais um sistema previdenciário, o medo de não ter mais garantias e direitos sociais, tudo isso está embutido em um medo generalizado da insegurança
Quero lembrar que a experiência de jovens soldados com rua é sentinela e guarita de ponto turístico. Se você for no Forte de Copacabana, que é das Forças Armadas, você vai ver o soldadinho de chumbo parado. É o máximo que ele pode fazer. Não que sejam incompetentes, eles não são qualificados para tomar decisões em tempo real como a polícia. Então vemos cercos e espetáculos, só que isso agrava temor. E torna todo mundo mais abusado. O policial fica mais abusado e o criminoso também. Resumo: mais chacinas, mais predação e mais gasto de dinheiro público. Fórum – O ministro da Segurança Pública anunciou recentemente que estuda estender o período da intervenção. Enquanto o interventor diz que não. Por que acha que há esse interesse no governo em continuar esse projeto? E se há esse interesse, acredita que há riscos de essa lógica se expandir em outros locais, de modo a expandir esse projeto político? Jacqueline Muniz - As Forças Armadas não têm pernas nem condições de ficar brincando de síndrome do cabrito em todo o território nacional. Quanto mais se gasta em recursos repressivos, mas se limita. Por que é escasso? Pois mobiliza muita gente. As Forças Armadas são níveis de prontidão, formas de espera para a ação. Não tem como amanhã, se o ministro resolver brincar de John Wayne, de Charles Bronson, de colocar Forças Armadas em todo lugar, não há nem diesel para isso. Sequer conseguem cumprir a missão de defesa nacional. As Forças Armadas hoje ficam topando esse mico da segurança para ver se ganham um caraminguá e recompletam seus recursos, porque na hora que o Brasil precisar de defesa em suas fronteiras, nos estamos despreparados., apesar de ter tido um alto investimento nos governos Lula e Dilma. Outra coisa óbvia é que não estão entregando o que prometeram. Não tem como reduzir a corrupção dando soco na mesa, ou na lógica do eu mando você obedece. Afinal, a disciplina militar não produz controle da ação da polícia. Por que eu posso ser disciplinado para praticar delito. O que produz controle de polícia não é disciplina militar, disciplina militar serve para produzir um ethos militar, mas não produz controle nem aqui e nem em lugar nenhum. Para produzir controle de polícia são outras coisas que a gente precisa, controlar o uso potencial e concreto de força. E a qualidade decisória, a chamada workmanship de polícia. Obviamente que ninguém governa nada aqui. Qual foi o plano proposto? Para melhorar a comida na rua, eu mudo os eletrodomésticos da minha cozinha. Isso não tem impacto. As atividades propostas no plano da intervenção todas são atividades meio, não têm nenhuma correlação com a dinâmica criminal. Se fabricam Godzillas poderosos, que são fabricados por esse discurso para dizer: 'olha como é difícil enfrentar um monte de moleque magrelo com arma na mão'. Arma cedida pelo mesmo consultor macabro. Aqueles que armam o crime são aqueles que vendem arma vagabunda para a polícia. Então há uma economia criminosa que opera em rede. Você pode por 20 leões rugindo que os ratos vão passar entre as pernas dos leões. O combate a criminalidade é feito no cotidiano, e não com esse espetáculo. Quantos contêineres de arma que chegam no Galeão foram apreendidos pela intervenção? Qual foi o dinheiro recuperado no crime que tesá investido em entidades religiosas? Ou com advogados pombos correio? Vemos algum impacto? Não. A razão de ser de um soldado é obedecer. Quem comanda e manda é quem tem voto. É assim no mundo democrático para a espada não ficar uma espada louca de Highlander. Por isso é que Forças Armadas profissionais tem comando civil. O ministro está blefando. Ele fica jogando dos dois lados porque se beneficia desse discurso. No Rio de Janeiro não está clara a candidatura, o partido do governo está em frangalhos, afinal, uma das bases criminosas desse partido estava aqui. E o Rio de Janeiro repercute internacionalmente. Tem que criar uma dificuldade para vender e negociar facilidades eleitorais nos bastidores. E com isso, torna a polícia trouxa, a PM faz papel de boba, a Polícia Civil faz papel de boba, e o Exército de biruta de boneco de posto. As Forças Armadas sabem disso.Só serve para atender a um projeto de poder. Um projeto político que é produzir insegurança, maximizar medo, deixar todos feito barata tonta e criar a síndrome da pequena autoridade na esquina
Agora, as Forças Armadas, de uma maneira geral, dizem que não gostam de políticos, mas nunca saíram da política. Eles sabem comandar, mas não sabem governar. Por isso dá trabalho dar golpe. O golpe político, policial-jurídico, tem mais rendimento a baixo custo e produz efeito. Não precisa hoje dar golpe militar, isso gasta. Não tem como sustentar. Estamos falando de um projeto político em parceria com lógicas criminosas. As pessoas ficam cheirando pó de mármore, as pessoas têm onda cheirando maisena.. Você acha mesmo que a estrutura do crime, a dinâmica criminosa no Rio de Janeiro é por conta de droga? Isso é um cinismo. O que está em jogo aqui é a venda de banda larga, é o arrendamento de territórios que o Estado faz para o crime, é a arrecadação a partir da prestação de serviços essenciais à população que é terceirizada para o crime. Temos governos autônomos aqui, por isso tem que ter passaporte. Quem vai te pedir documento? É a polícia? Por que tem várias. Tem polícia do bem e a polícia dos bens. Como o comando não é burro, em alguns territórios você vê até inscrições bíblicas que o comando usa para dizer 'aqui começa meu território'. E nenhum crime gera governo autônomo se não tiver chancela do estado. Então, quem administra esse espetáculo, essas mortes, são atores de dentro do Estado. E quando falo Estado, não falo governo, falo atores do parlamento, do Executivo... Isso tem rendimento político. Está dando errado para a população, para o policial. Mas está dando certo para atores políticos que sustentam discursos catárticos. Por isso é legal essa repressão burra. Na verdade é um discurso legal, catártico, que esses malucos fazem porque sabem que não pode ser demonstrado na esquina. Então, fica sempre como uma promessa, ninguém pode cobrar. É um pouco essa lógica aqui.Há uma economia criminosa que opera em rede
Quero acrescentar que daqui a pouco o Rio de Janeiro vai ter um novo Tratado de Tordesilhas. Vamos ver um silenciamento, que tem a ver com a censura de um lado e a gestação de monopólios políticos criminosos aqui. Espero que isso não aconteça como aconteceu no México e em outros lugares do mundo. Aí vai todo mundo achar que tem segurança. Mas não tem, o que há é um efeito de segurança, ocultando projetos de poder. É importante que a gente preste atenção nisso.Estamos falando de um projeto político em parceria com lógicas criminosas