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Colunista da Fórum, o historiador Leandro Seawright Alonso questiona: "Pode um gari denunciar a sua invisibilidade ao utilizar roupas usadas por prefeitos afeitos ao marketing e outras castas da elite?"
Por Leandro Seawright Alonso*
Escrevo este texto tomado por muito respeito e gratidão às trabalhadoras e trabalhadores que realmente zelam da cidade de São Paulo, onde moro, e das demais cidades do país.
As indumentárias dos garis não são “multiformes”; garis não vestem o que querem como eu faço corriqueiramente e não se vestem como outros dignos trabalhadores brasileiros. Nós nos vestimos de maneira plural – quando queremos, combinamos cores e escolhemos as roupas segundo a nossa vontade, segundo as nossas identidades. Assim como em outras categorias de trabalhadoras e trabalhadores, os garis se vestem de maneira “uniforme”. Porque fazem parte de um campo de invisibilidade social “uniforme” (COSTA, 2008). As explicações, no entanto, para o uso do “uniforme” são “multiformes” – justificadas de várias formas; mas, não estou interessado nelas. Aliás, rechaço-as. Porque a vida não é realmente “uniforme”, posto que as pessoas se casam ou não, são pais, mães ou não, fazem escolhas afetivas ou não. Por lógico, escolhem as suas roupas – desde que inseridas em um campo social de visibilidade.
As pessoas exercitam a sua humanidade escolhendo. No ato volitivo, fazemo-nos.
E há uma política na e da indumentária que veste o corpo.
O corpo é centro de política.
Mas, este texto não é acerca de obviedades. Não precisamos dizer o óbvio.
Lógico que um prefeito pode (no sentido de “poder” mesmo) fazer marketing vestindo “uniforme” sem deixar de ser “multiforme” porque, depois de alguns minutos, ele acelera e torna a se trajar de maneira plural outra vez. Alguns atestam, de diferentes formas, que o melhor é se vestir com camisas brancas ou azuis para produzir mais “confiabilidade”. Aliás, vestir-se, por outra estratégia, de trabalhador braçal, embora não seja condição para ser realmente trabalhador, faz que você se pareça com quem labore desta forma.
Vestir-se como gari é um discurso.
Sem obviedades, para testar as classes e “castas sociais”, faço a pergunta reversa: e um gari, pode parecer prefeito? Ao vestir-se como, elegantemente, um prefeito comumente se veste, um gari pode constituir uma ordem discursiva diferente daquela de sua classe original, de sua casta? Seria, então, possível instaurar uma política indumentária de superação da “casta dos sudras”?
Ao tentar fazê-lo, ele seria interditado – impedido – por, entre outras, duas das três técnicas possíveis em A Ordem do Discurso, “L'Ordre du discours”, de Michel Foucault.
- Ele seria interditado pela palavra.
- Ele seria segregado pela loucura.
“Bom dia… sou ditador”: o Estado de Exceção como “regra” no Brasil contemporâneo
(Foto: Fabio Arantes/ Secom)