Escrito en
BRASIL
el
Deputados que compõe a chamada "bancada da bala" expulsaram movimentos de direitos humanos que queriam convidar os parlamentares para um debate a respeito da morte do garoto Ítalo, de 10 anos, assassinado pela Polícia Militar depois de ter sido acusado de roubar um carro no dia 2 de junho
Por Victor Labaki
Nesta quinta-feira (30) um grupo de entidades que atuam na defesa dos direitos humanos marcaram um debate às 17h30 na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) para discutir a morte do garoto Ítalo, de apenas 10 anos, assassinado pela Polícia Militar depois de ter sido acusado de roubar um carro no dia 2 de junho.
Antes do horário marcado, às 16 horas, a Frente Parlamentar de Segurança marcou uma palestra solicitada pelo deputado Coronel Camilo (PSD). Os coletivos e movimentos sociais foram até o Auditório Paulo Kobayashi, onde estavam os deputados, para tentar convidá-los para o debate sobre o assassinato de Ítalo e tentar pressioná-los para a instauração de uma CPI para investigar o genocídio da população negra e periférica no Estado de São Paulo.
Ao chegar ao auditório os coletivos e movimentos sociais foram expulsos pelos deputados que integram a Frente Parlamentar da Segurança, que fecharam as portas da reunião e não compareceram ao debate organizado pelas entidades. Um homem que pediu para não ser identificado disse que um dos policiais que fazem a segurança da Alesp chegou a dar voz de prisão para ele por tentar permanecer no auditório. "O que aconteceu foi que estava tendo uma discussão aberta sobre segurança pública e a gente foi entregar um convite para um dos deputados, fecharam as portas, eu entrei pela outra porta e sentei lá. Estava apenas assistindo. Veio um outro PM que eu não consegui identificar o nome e me ameaçou dar voz de prisão em uma salinha que tem nos fundos, foi quando eu saí e me retirei", disse.
[caption id="attachment_86282" align="alignleft" width="349"] Douglas Belchior, professor e ativista do movimento negro[/caption]
Douglas Belchior, professor e ativista do movimento negro, comentou que não está surpreso com a atitude dos deputados da chamada "bancada da bala", nome dado aos parlamentares que defendem um endurecimento das leis e pedem maior repressão policial.
"Isso representa o que eles são, o estranho seria se a gente fosse recebido de braços abertos por assassinos. Eles são assassinos, representam assassinos, representam as forças politicas que implementam essa politica de segregação social e racial em São Paulo", completou Belchior.
A cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil
O membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos, o advogado Ariel Castro Alves, disse que isso só mostra como esses deputados são contra o diálogo e são contra o respeito aos direitos humanos.
"Isso mostra claramente o quanto os deputados ligados a Polícia, a chamada bancada da bala, não querem diálogo com a sociedade civil. Eles são contra os direitos humanos, eles são contra entidades da sociedade civil e são a favor da violência contra os estudantes em manifestações sociais. Eles são a favoráveis a criminalização dos movimentos sociais e são favoráveis também ao homicídio de adolescentes e jovens por parte da policia".
PM paulista mata em média dois adolescentes por mês desde 2010
Uma funcionária do gabinete do deputado Coronel Camilo disse que houve um mal entendido e que a reunião era uma discussão interna e por isso foi fechada. A assessoria de imprensa oficial da Alesp informou que o encontro era para auxiliar pré-candidatos às eleições de 2016, mas que o encontro era aberto ao público.
O debate "Ítalo Presente! Contra o genocídio da infância e juventude preta, pobre e periférica" foi organizado pelo Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo e recebeu o apoio de diversos movimentos sociais e associações que lutam pelos direitos humanos.
[caption id="attachment_86281" align="alignleft" width="399"] Ariel Castro Alves, membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos[/caption]
Ariel Castro Alves disse que a violência policial é corriqueira. Segundo o advogado, no ano de 2015 foram quase 600 mortes de pessoas em supostos confrontos policiais e citou o relatório divulgado pela Ouvidoria da PM-SP que aponta que 181 crianças e adolescentes de 0 a 16 anos foram mortos por policiais nos últimos dez anos.
"Existe um processo de extermínio de crianças, adolescentes, jovens e que nós precisamos juntar forças de entidades da sociedade civil e todas as instituições para se contrapor a essa situação", completou o advogado.
Belchior disse que o movimento negro historicamente denunciou a morte de pessoas por agentes do Estado, mas que o debate de hoje procurava sensibilizar a sociedade por se tratar de uma criança de 10 anos.
"Será possível que a morte de crianças tem o poder de comover a sociedade ou nem isso? (...) A gente espera que consiga sensibilizar a sociedade para um tema tão atual e tão recorrente que é o assassinato em massa da população pobre pelas forças do estado. A partir daí discutir o óbvio que é uma sociedade que investe muito mais na repressão e não nos direitos só pode resultar em uma sociedade violenta em que o assassinato e a morte não comove mais ninguém".
Fotos: Vera Massaro/ALESP