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Bernardo Tabak expôs os hematomas após ser agredido, no último sábado (13), ao filmar abusos cometidos por guardas municipais
Por Redação
No último domingo (14), o jornalista Bernardo Tabak resolveu denunciar, em seu perfil no Facebook, a agressão sofrida por guardas municipais na Praça Mauá, na Zona Portuária do Rio de Janeiro. O caso ocorreu no sábado (13) quando foliões já se dispersavam, por volta das 5h, após aproveitarem o carnaval no Tecnobloco, que desfilou pela madrugada e não tinha autorização da prefeitura.
Tabak mostrou os hematomas decorrentes do episódio. Ele contou que apanhou, foi algemado e levado à delegacia porque filmava com seu celular a agressão a uma mulher. O jornalista encerra o depoimento pedindo providências da Guarda Municipal e do prefeito, Eduardo Paes, para a apuração dos fatos. “O legítimo carnaval de rua não merece estas manchas roxas”, afirmou.
Confira o texto na íntegra:
A BUNDA É MINHA, E A PRAÇA É DO POVO - COMPARTILHEM!!!
(Manifesto contra a truculência da Guarda Municipal do Rio contra foliões no carnaval de rua)
Nunca imaginei em 40 anos de vida que iria fazer uma exibição pública da minha bunda. Mas também, jamais pensei que seria algemado e preso, depois de tomar muita porrada e ser enforcado pela Guarda Municipal do Rio de Janeiro (GM-Rio). O motivo? Estar filmando tamanha truculência e bestialidade dos agentes do Grupamento de Operações Especiais (GOE) contra foliões na madrugada de sábado, 13 de fevereiro de 2016.
Estava no bloco Tecnobloco, um dos melhores do carnaval deste ano: som de primeira, galera arrepiada e arrepiando. Desfile lindo, sem qualquer problema. Saiu 1h30 do Largo de São Francisco, desceu Uruguaiana, Carioca, Nilo Peçanha, dobrou Primeiro de Março, Candelária, evoluiu pela Presidente Vargas e Rua do Acre. Tudo só alegria, música e dança, sem qualquer problema. Em alguns momentos, agentes da CET-Rio ajudaram a desviar o trânsito.
Até adentrarmos a Praça Mauá, já no finzinho, por volta das 5h. Bateria dispersando. Multidão embriagada de cerveja e felicidade: um desbunde. Quando aparecem pelotões de guardas municipais, cada um com uns dez agentes, escondidos atrás de seus escudos: em vez de confete e serpentina, espocam pelo ar bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral. O “buummm” das explosões abafam os últimos instrumentos tocando.
Não presenciei o começo do tumulto. Estava no meio da praça. Mas vi de longe uns guardas batendo em gente gratuitamente, indiscriminadamente, que tentavam simplesmente se desvencilhar da confusão. Afirmo: não vi qualquer depredação durante todo o desfile, não vi pichações e não vi ninguém lançando garrafas contra a GM-Rio (nem em nenhum dos vários vídeos que já assisti até agora). Revoltado, recorri ao melhor instrumento de denúncia que aprendi a usar nestes 15 anos como jornalista: informação e divulgação. Foi demais para eles.
Só deu tempo de ver dois botinudos, com capacetes e raiva, vindo em minha direção. Mais dois segundos, e um já tinha arrancado meu celular e atirado longe. Enquanto eu levava chutes e porrada de cassetetes. Gritava com eles: “Que isso!!! Tá maluco?! O que eu fiz?!!” Não adiantava, já estavam cegos e surdos. Catando cavaco, fui atrás do meu telefone, que consegui ver onde tinha caído. Eles vieram atrás, tomaram de novo e só vi um deles pisando em cima. E perdi contato visual com meu celular quando um deles, por trás, como todo covarde, me deu um mata-leão – na delegacia soube seu nome: Souza. Tinha mais um próximo que não consegui ler o nome: vários estavam sem identificação.
Bati no braço dele: 1, 2, 3. ˜Não tou conseguindo respirar!!” Me arrastam até próximo das vans da GM-Rio, provavelmente para não serem filmados. Me tacam no chão, me algemam. Eu berro: “Porra!!! Caralho!!! Pra que isso?! Eu não tou resistindo a nada!” Um deles: “Cala a boca! Tá preso por desacato!”
Desacato por filmar truculência cometida por agentes públicos?! Mas essa é o meu ofício! Mesmo não estando em serviço, não deixo de ser repórter: somos jornalistas 24 horas, já determinou Zuenir Ventura. Já passei por situações perigosas, da pacificação no Alemão, com o tiro comendo solto, até a ditadura no Egito, onde muitos têm medo de falar. Mas aqui é uma democracia, e posso gritar, espernear, dar entrevista: e filmar! E não só repórteres podem fazer isso, e sim qualquer cidadão, qualquer um. Me disseram que a forma como os guardas agiram lembrou a época do nosso regime militar. Uma pena para o Rio, pois quem me falou isso viveu a ditadura. Em tempo: encontrei meu celular. Onde: no banco de trás da van da GM-Rio. Destruído, mas ainda acendendo a luz indicativa que está carregando!!! E, oxalá, vou conseguir tirar os vídeos que fiz.
Os guardas gritaram aos foliões que não podiam subir na estátua no centro da Praça Mauá. Ora essa: por quê? A estátua tem arquibancadas circulares, um convite a subir, sentar e admirar ao redor. Pra que tanto trabalho em revitalizar tudo aquilo, inaugurar dois museus, abrir vista pra Baía de Guanabara, se não nos deixam admirar? Uma amiga disse que logo que foi inaugurada, skatistas relataram ter sido proibidos de andar ali. Fica a impressão de que a Prefeitura do Rio está de birra com a Praça Mauá. Eu posso andar de bicicleta na praça interna do Museu do Louvre e debaixo da Torre Eiffel. Quando tá calor, as fontes de dezenas de cidades pelo mundo são tomadas pelas pessoas para se refrescar.
Em Roma, juventude e turistas comem sanduíches e tomam cerveja nos pedestais de esculturas com centenas de anos. E não se pode sentar na arquibancada da estátua do centro da Praça Mauá? E por conta disso estou com minhas nádegas, coxa e alma completamente feridas?
A bunda é minha, só faz carinho e, principalmente, bate, quem eu quiser!!! A praça é do povo, e podemos sentar, deitar, cantar, tocar e tomar cerveja onde quisermos!!!
Zuenir me recorda também a Cidade Partida, que agora transportou-se para o carnaval, dividido entre os blocos oficiais e os que não fazem parte da lista da prefeitura. Na abertura não oficial do carnaval, guardas municipais já haviam disparado bombas contra o bloco Boitolo. E há outros relatos de restrições, ataques e patrulha contra blocos que não recebem patrocínios, mas desfilam como sempre foi feito no Rio, à moda antiga, tomando as ruas, fantasiados, sem precisar registrar hora e local junto à burocracia municipal.
No boletim de ocorrência feito pelos guardas municipais do GOE, Souza e Gomez – que dentro da van da GM-Rio, com toda sua polidez, não se cansou de me chamar de “seu merda” -, estava que me prenderam usando de ˜força moderada”. Olhando meus hematomas, não quero imaginar quando eles baterem pra valer. Sabendo que uma colega jornalista sofreu luxação no braço, que vai ficar engessado por duas semanas, e que um rapaz, produtor audiovisual, teve que passar por cirurgia, com fratura exposta no cotovelo, quero estar bem longe do Rio quando a Guarda Municipal enfiar a porrada de verdade.
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Finalizo este manifesto solicitando providências e profunda apuração dos fatos ao presidente da Guarda Municipal do Rio, Rodrigo Fernandes, e à autoridade maior da cidade, prefeito Eduardo Paes, que já encontrei em tantas coberturas, inclusive numa entrega da chave da cidade ao Rei Momo, com sorrisos, abrindo nosso carnaval. O legítimo carnaval de rua não merece estas manchas roxas, senhor prefeito. Mas, mesmo doendo, isso não vai me impedir de vestir minha fantasia e fazer a festa.
Fotos: Arquivo pessoal