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Medida beneficia multinacional estrangeira e mostra limites no trabalho das autoridades fitossanitárias do país
Por Marco Piva
O nome parece de remédio: benzoato de emamectina. Aplicado em camundongos, cães e coelhos, se mostrou neurotóxico e altamente perigoso à saúde humana. Por isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) indeferiu o pedido de registro feito pela Syngenta, uma gigante química com forte atuação na agricultura. No estudo, a Anvisa afirma: “A substância demonstra um perfil toxicológico bastante desfavorável, tanto do ponto de vista agudo como crônico. Particularmente, os efeitos neurotóxicos são tão marcantes e severos que as respostas de curto e longo prazos se confundem (...) Incertezas no que diz respeito aos possíveis efeitos teratogênicos e as certezas dos efeitos deletérios demonstrados nos estudos com animais corroboram de forma decisiva para que não se exponha a população a este produto, seja nas lavouras ou pelo consumo dos alimentos”. A agência conclui: “O produto técnico ora em pleito é considerado impeditivo de registro, do ponto de vista da saúde humana”. Mas, isso foi em 2007. No dia 3 de abril deste ano, a agência pediu autorização para registrar o agrotóxico em regime de urgência e foi atendida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) por meio da Instrução Normativa nº 13. O objetivo declarado é combater a praga Helicoverpa armigera que infestou a produção de algodão e soja, dois dos principais produtos do agronegócio brasileiro. Diz o artigo 1º da IN: “A Secretaria de Defesa Agropecuária (DAS) poderá autorizar a importação e aplicação, em caráter emergencial, de produtos agrotóxicos, registrados em outros países, que tenham como ingrediente ativo único a susbtância benzoato de emamectina (...)”. A demanda dos produtores chegou à mesa da presidente Dilma Roussef pelas mãos do governador Jaques Wagner, cujo estado que dirige é um dos mais prejudicados pela praga. O que em princípio parece uma medida adequada diante de um problema grave tem uma história contraditória. No início de 2011, a mesma Anvisa decretou o fim do metamidofós, que cuidava do combate a esse e outros tipos de praga. Introduzido no Brasil pela Bayer no início da década de 60, esse ingrediente ativo se tornou um dos mais importantes defensivos agrícolas da agricultura. Mas, em meados da década de 90, a patente expirou e a fabricante alemã foi se desinteressando pelo ingrediente, que virou genérico e passou a ser produzido por algumas empresas de pequeno e médio porte, a maioria brasileiras. Na sequencia, conseguiu o registro de uma nova patente à base de neonicotinóide para substituir o metamidofós a um custo quatro vezes maior para o agricultor. Apesar dos alertas dos estudos científicos internacionais, nesse momento a Anvisa não considerou como definitivos os efeitos devastadores do novo produto na reprodução das abelhas, que foram sumindo em quantidades espetaculares em cada país onde o agrotóxico foi sendo aplicado. Resultado: a substituição do metamidofós pelo neonicotinóide abriu brecha para a extinção dos chamados “insetos do bem” e resultou no ressurgimento de pragas antes controladas como o Helicoverpa armigera. Em reunião realizada no dia 29 de abril, a Comissão Europeia para a Saúde, mesmo sob forte pressão contrária de gigantes químicas com a Bayer e a Syngenta, tomou uma decisão histórica. Baseada em relatório negativo da Autoridade Europeia de Segurança Alimentar (EFSA), determinou a suspensão por dois anos da fabricação e comercialização de neonicotinóides por causa dos seus efeitos perversos no ciclo de reprodução das abelhas e da interferência no ecossistema. A principal substância aplicada no Brasil a base de neonicotinóide é o imidacloprid, com 29 registros, sendo 15 deles da Bayer. Mas, o problema não é somente ambiental. O custo dessa substituição e a recente aprovação em regime de urgência do benzoato de emamectina vão provocar um prejuízo adicional de 2,5 bilhões de reais à agricultura brasileira somente neste ano, impactando fortemente o preço dos alimentos e a balança comercial do país. Os produtores rurais estão apavorados com a praga e com o bolso. Novamente, o governo fica a reboque dos acontecimentos e precisará disponibilizar recursos para garantir a sobrevivência dos agricultores brasileiros. Nesse meio tempo, e outra vez, as poucas empresas multinacionais que controlam o milionário mercado de agrotóxicos, avaliado em 10 bilhões de dólares, engordarão os lucros de suas matrizes. Enquanto isso, uma das últimas fábricas brasileiras, a Fersol, várias vezes premiada pelo seu compromisso social, agoniza. Em tempo: o metamidofós não é proibido em nenhum outro país da América Latina. Argentina, México e Colômbia são os principais mercados do produto, agora importado exclusivamente de Taiwan.Marco Piva é jornalista.