O maior protesto ocorreu durante a fala do secretário de Vigilância em Saúde, Jarbas Barbosa. Por representar o governo federal no evento, Jarbas foi interrompido com coros de: “Ô, Dilma, que papelão, não se governa com religião”, referindo-se à interferência recente de setores evangélicos nas campanhas de prevenção. Um dos cartazes pedia “Uma política de saúde laica”.
[caption id="attachment_18457" align="alignright" width="300"] Os militantes protestaram contra a influência religiosa nas decisões do Estado (Guilerme Kardel/Dep. de DST, Aids e Hepatites Virais)[/caption]Jarbas respondeu aos ativistas dizendo que os encontros fortalecem a todos os envolvidos na luta. Ele reforçou a importância do ativismo no controle da epidemia e destacou, entre as prioridades da pasta, a promoção de uma semana de mobilização intensa pelo teste de HIV antes do 1º de dezembro, Dia Mundial de Luta contra a Aids.
O diretor-adjunto do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Eduardo Barbosa, também apontou a importância dos encontros na revisão das estratégias nacionais contra a epidemia. Segundo ele, a resposta do País contra a aids surgiu a partir de um esforço conjunto entre o governo e a sociedade civil.Mas a presidenta Dilma Rousseff não foi o único alvo dos ataques. Os ativistas exibiram também cartazes contra o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e o governador Geraldo Alckmim e também levaram “cartão vermelho” dos manifestantes Marcos Boulos, que representou o governo estadual na cerimônia, e Maria Cristina Abatte, da prefeitura de São Paulo. A redução de leitos hospitalares para pacientes com HIV e aids, a dificuldade de atendimento médico e o fechamento de equipamentos de atendimento preventivo foram os principais motivos de protestos no Estado e na cidade.
Estado laico
“Urge lutar para a retomada do Estado verdadeiramente laico porque em muitos países estamos vendo como o fundamentalismo religioso – dos pentecostais no Brasil ou dos católicos em muitos países hispano-americanos católico – prejudicar seriamente o combate à aids”, disse Pedro Chequer, representante do Programa das Nações Unidas para o HIV/aids (Unaids) no Brasil.Norman Gutiérrez, do Centro para a Educação e Prevenção da Aids, da Nicarágua, concordou lembrando que, em seu país, muitos funcionários da saúde norteiam suas práticas por crenças religiosas pessoais que contrariam as estratégias de prevenção ou tratamento preconizadas. “O combate à aids exige mais que boas diretrizes técnicas, é preciso uma mudança cultural, compreender e reeducar hábitos, o que só será possível com intensa participação das organizações sociais, sobretudo daquelas que representam os grupos mais vulneráveis”, frisou Gutiérrez.
Exatamente por isso, o debate destacou a necessidade de se fortalecer em cada país uma instância nacional multidisciplinar responsável por articular as organizações da sociedade civil, as autoridades nacionais da área de saúde, as agências internacionais de financiamento e o setor acadêmico, responsável pela formação dos profissionais de saúde. Esta instância estabeleceria as diretrizes das políticas de combate à aids e para onde deveriam ser direcionados os recursos. O debate também destacou a necessidade de que as estratégias de prevenção e tratamento levem em conta não apenas o perfil epidemiológico geral da doença em cada país, mas as especificidades locais, tanto culturais como da epidemia.
Ovacionados
Beto Volpe, da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e Aids (RNP+), foi o mais aplaudido da cerimônia. O ativista disse que a formação da mesa representou muito bem o descaso do governo no enfrentamento da epidemia. “Era para a presidenta Dilma ou o ministro Padilha estarem aqui”, disse. Beto criticou o veto federal ao kit anti-homofobia destinado às escolas públicas, o fundamentalismo religioso presente nas tomadas de decisões dos governos e a grande dificuldade dos municípios em usarem as verbas dos Planos de Ações de Metas (PAMs) contra a epidemia.Já o presidente do Fórum de ONGs/Aids do estado de São Paulo, Rodrigo Pinheiro, denunciou a superlotação nos hospitais, as altas prevalências de HIV em populações específicas, como homens que fazem sexo com homens e profissionais do sexo, e o fechamento de leitos para pacientes com HIV e aids. Mesmo representantes de organizações internacionais apontaram a perda do caráter referencial que o Brasil tinha nas políticas públicas de combate à Aids. A brasileira Alessandra Nilo, secretária Regional da LACCASO (Conselho Latinoamericano e do Caribe de ONG/AIDS), fez seu discurso em espanhol com o objetivo de contemplar os participantes latinos no evento. Segundo Alessandra, o Brasil, que sempre foi referência para os países da região, hoje passa por uma situação critica. “Eu queria dar boas vindas a todos, mas em especial aos ativistas que, diante desta realidade, devem estar perdendo o sonho de acabar com a aids”, finalizou. O IX Congresso Brasileiro de Prevenção das DST e Aids, II Congresso Brasileiro de Prevenção das Hepatites Virais, VI Fórum Latino-americano e do Caribe em HIV/Aids e DST e o V Fórum Comunitário Latino-americano e do Caribe em HIV/Aids e DST seguem até a próxima sexta-feira, 31 de agosto, no Centro de Convenções Anhembi com o lema "Sistemas de Saúde e Redes Comunitárias".