Texto final prevê a regulamentação do princípio de neutralidade por meio de decreto presidencial
Por Felipe Rousselet
A comissão especial da Câmara dos Deputados que o Marco Civil da Internet no Brasil deveria ter votado nesta quarta, 11, o substitutivo apresentado pelo deputado Alessandro Molon (PT). Porém, por falta de quórum, a votação foi adiada novamente e deverá acontecer somente na primeira semana de trabalho após o recesso parlamentar (de 18 a 31 de julho).
A versão final do texto foi divulgada por Molon, relator do projeto, nesta quarta, com algumas alterações. O texto preliminar foi disponibilizado para consulta pública no site e-Democracia entre os dias 4 e 6 de julho. Em apenas três dias, recebeu 109 contribuições e foi visualizado mais de 14 mil vezes. Se for aprovado na comissão, o projeto de lei seguirá para votação no plenário da Câmara dos Deputados, e ainda dependerá da aprovação do Senado e da promulgação da presidenta Dilma Rousseff para entrar em vigor.
O Marco Civil da Internet define os princípios para o uso da rede mundial de computadores no Brasil. Estabelece os direitos dos usuários, as obrigações dos provedores de serviços e as responsabilidades do Poder Público.
Uma das principais mudanças no texto refere-se à atuação do CGI (Comitê Gestor da Internet) sobre a definição do conceito de neutralidade na rede, que é a garantia de tratamento igualitário dos dados que trafegam na internet. A neutralidade na rede impede que provedores privilegiem alguns serviços em relação a outros. O tratamento igual de informações na rede impede que operadoras de telefonia, que oferecem serviços de internet móvel, por exemplo, reduzam a banda de serviços de voz por IP nos celulares, o que impediria o uso do Skype, privilegiando assim o uso das ligações convencionais.
"O CGI vai continuar a ser decisivo sobre a definição de neutralidade, sem ser o órgão regulador. Não propomos em momento nenhum que ele regulasse essa questão, mas o governo entendeu que, do jeito que estava escrito, o CGI regulamentaria, que não é o papel dele, de fato", afirmou Molon. De acordo com o novo texto, a neutralidade será regulada pela Presidência da República, após consulta ao CGI, por meio de decreto.
Para o ciberativista João Carlos Caribé, regulamentar a internet por decreto é algo perigoso para a rede. “Essa questão da neutralidade é tão cara à Internet, que se for feita uma regulamentação ruim, ela pode acabar com a Internet. O perigo todo é que com a cabeça analógica da Dilma, está arriscado ela se alinhar com o Paulo Bernardo [Ministro das Comunicações ], que só segue os interesse dele e das empresas telecomunicações”, criticou Caribé.
Outra mudança importante no texto refere-se à retirada de conteúdos da internet. Na versão anterior do projeto era permitido que terceiros ou provedores, responsáveis pela guarda dos dados, retirassem conteúdos do ar. Agora o texto só permite acesso aos dados, e a retirada dos mesmos, mediante ordem judicial.
Segundo Caribé, essa mudança no texto é uma forma de evitar a censura de conteúdos na rede. “Acho melhor. Existia um parágrafo que permitia que o próprio provedor de acesso virasse um juizado privado. Uma forma de censura. As críticas que podem surgir daí seriam sobre sobrecarregar o judiciário. Mas a solução é aprimorar o judiciário. Criar um juizado especial para a demanda da internet. Está na hora de pensarmos em coisas mais práticas nesse sentido”, afirmou.
Na opinião de Caribé, para que o texto do Marco Civil fique perfeito é preciso retirar a regulamentação do princípio da neutralidade por decreto, porém ele ressaltou a importância do projeto ser votado logo. “Essa questão da neutralidade por decreto é muito perigosa. Deveria ser mantida essa questão como no texto anterior e o art. 5 [sobre retirada de conteúdo] como está agora. Daí sim teria que votar logo. Se votar agora o perigo é como vai vir o decreto depois. Mas pelo menos a vantagem do decreto é que ele tem de ser discutido na Câmara, onde é possível ter uma interferência da sociedade. Se fosse uma decisão da Anatel, nós só poderíamos interferir judicialmente”, frisou.