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Lisete Arelaro, representante docente do Conselho Universitário da USP, diz ser inadmissível a presença da PM no campus e vê motivos políticos por trás da situação
Por Camila Souza Ramos
A força tática da Polícia Militar (PM) voltou a entrar no campus Butantã da USP hoje, 3, por decisão judicial que determina a desobstrução do prédio da Reitoria, onde estava programado para haver um piquete dos funcionários. É a segunda vez em dois dias que a PM entra na cidade universitária por solicitação da administração da USP.
A última vez em que a Polícia Militar entrou no campus foi em 1979, no governo do general Figueiredo, para reprimir o movimento estudantil na universidade, um dos principais focos de oposição ao regime na época. A professora Lisete Arelaro, da Faculdade de Educação e representante docente do Conselho Universitário, lamenta a atitude da reitora em não dialogar com os funcionários e também por chamar a polícia sem antes consultar o conselho. Para ela, um grupo de professores que apoia decisão quer agradar o governo estadual visando as eleições para reitor no fim do ano.
Confira a entrevista abaixo na íntegra .
Fórum - Há 30 anos a Polícia Militar não entrava no campus da USP. Como você interpreta a volta da sua presença?
Lisete Arelaro - É uma coisa absolutamente terrível de ser aceita por qualquer professor, aluno e funcionário de qualquer universidade, em especial a Universidade de São Paulo, que historicamente tem resistido, em momentos muito mais graves que o atual. Sempre defendemos que a força do argumento é o que mantém exatamente a coerência da nossa atuação. Portanto, para nós, é inadmissível, em nome de uma suposta segurança do campus, que a reitoria convide a polícia - até porque a polícia não entra aqui a não ser que seja devidamente autorizada pela reitoria – para ser a intermediária em uma discussão das questões trabalhistas e também das próprias ações da reitoria.
Nós estamos em uma situação bastante delicada. Considerei uma agressão de uma gravidade imensa o que aconteceu, não somente na segunda-feira. Para se prevenir em relação a uma suposta ocupação, você chama preventivamente para impedir que isso aconteça. Isso, pra mim, indica a fragilidade das condições de negociação que a reitoria tem hoje. Espanta-me também que todos os pró-reitores não tenham se manifestado preocupadamente com essas questões.
Acho extravagante por parte da própria reitora ficar escondida. Não há uma forma de encontrá-la, eu também gostaria de conversar com ela sobre o que aconteceu aqui.
Deveria ter uma reunião emergencial do Conselho Universitário para que houvesse aqui uma resposta. No entanto, fico surpresa com essa forma, que alguns consideram até moderna, de evitar o conflito, ao invés de conversar. Nós somos um tipo de profissional que acredita muito que é conversando que a gente se entende, que adquire novas ideias, novas posições. A reitoria acha que é com as armas que se evitará um conflito maior. Isso é um equívoco extremamente lamentável. Neste momento, de novo a polícia está no campus, o que a mim já parece uma provocação. Tem alguns grupos aqui da universidade que continuam quietos e outros que estimulam, lamentavelmente. Esses são para mim são os adversários da universidade pública.
Fórum - Que grupos são esses?
Arelaro - São todos aqueles que não consideram que não consideram que seja grave a entrada da polícia militar no campus como intermediária para a resolução de eventuais conflitos. Tem os que ficam quietos, e continuam dando aula como se não estivesse nada acontecendo, e aqueles que estimulam. Aqui dentro há diferentes visões. A universidade só se sustenta se ela estimular o debate e se for tolerante à divergência. Então me surpreende que nós estejamos em uma posição de uso da força, e que ela seja argumento para evitar que o Fórum das Seis se encontre novamente com o Cruesp e continue conversando. Há a procura para entregar a solicitação de continuidade das negociações, mas fica uma situação ridícula, porque ninguém sabe onde a reitora está.
Fórum - Esse grupo de professores que se omite ou estimula a ação da polícia é majoritário dentro do Conselho Universitário?
Arelaro - Não, acho que não. A reitora não está fazendo isso unilateralmente, deve ter grupos que a apoiam para ela ter essa posição. Como não somos nós, são os outros. Essa atitude não é uma atitude que um reitor tomaria por si só. Para essa questão o Conselho Universitário não foi consultado. Mas na reunião do Conselho de dezembro de 2008, a reitora colocou a possibilidade da entrada da PM no campus se ela solicitasse. Isso deu legitimidade para fazer o que fez, embora isso seja ilegal. Esse é um local de ensino. Em nenhuma escola pode entrar polícia militar. A PM só entra se um diretor, que será responsabilizado pelos dois lados, chamar.
Tem o seguinte: é lógico que aqui não é um lugar de passeio da polícia militar. Ela está aqui a serviço, ela foi convocada por alguém para estar aqui dentro. Em nenhum lugar em que se tem escola a PM tem autorização pra entrar. Aliás, em nenhum prédio público. Ela não foi criada para isso e só pode entrar armada se isso tiver sido solicitado.
A polícia é bem objetiva, obedece ordens. No caso específico, essa iniciativa própria ela não toma. Até porque aqui, por suposto, não há bandido, não há altas corrupções para justificar essa polícia aí.
Fórum - Existe alguma relação entre essa demonstração de força e as eleições para reitor ao fim do ano?
Arelaro - Entendemos que ela havia resistido heroicamente ao não tomar essa atitude em 2007, na situação especial da ocupação da reitoria. Mas existe um grupo que defende isso e que quer usar a polícia para demonstrar força. Como ela resistiu naquela ocasião, imagino que agora esse grupo tenha voltado a atacar, tentando dizer que é possível.
Esse tem sido também o comportamento do governo Serra. Esse grupo vem agradando o governo estadual ao demonstrar força. Uma força que historicamente o PSDB tem mostrado em não atender, em especial, os sindicatos. Não temos um mapa ainda dos candidatos (a reitor). Mas se for isso, lamento profundamente. Quem acha que vai se eleger com essa atitude está muito enganado, vai contra a preservação da história corajosa que a USP mantém. Ela só é uma grande universidade, uma das melhores do mundo, exatamente porque teve sempre coragem de se apresentar em momentos muito complicados.
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