Em entrevista a Fórum, Sérgio Haddad, coordenador da Ação Educativa e diretor de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), analisa o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Para ele, a iniciativa do governo é positiva, mas desconsidera a necessidade de participação da comunidade na escola e da sociedade no desenvolvimento das políticas. Ele comenta ainda comenta a pesquisa Educação e Exclusão no Brasil, lançada na terça-feira (27) na Ação Educativa, em São Paulo.
Por Brunna Rosa
Em entrevista a Fórum, Sérgio Haddad, coordenador da Ação Educativa e diretor de Relações Internacionais da Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), analisa o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Para ele, a iniciativa do governo é positiva, mas desconsidera a necessidade de participação da comunidade na escola e da sociedade no desenvolvimento das políticas. Ele comenta ainda comenta a pesquisa Educação e Exclusão no Brasil, lançada na terça-feira (27) na Ação Educativa, em São Paulo.
Sérgio afirma que a formulação do PDE deveria ser discutida em conjunto com a sociedade e se mostra preocupado com algumas das ações anunciadas pelo governo. Ao lançar a pesquisa Educação e Exclusão no Brasil, foi ressaltada a importância da presença da comunidade local no cotidiano da escola e da elaboração, pelo Estado, de políticas públicas destinadas a promoção da igualdade de acesso e de inclusão dos grupos mais vulneráveis. Segundo a pesquisa, a educação, apesar de ser considera um dos fatores mais importantes para a mudança do padrão de desigualdade, a experiência brasileira desafia está lógica.
Fórum - Qual a sua opinião acerca do PDE? SÉRGIO HADDAD -- O PDE ainda está em processo de formação. O anúncio foi feito em “Powerpoint” (programa de computador que organiza apresentações no modelo de slides ou transparências) e não há nenhum projeto ou documento definitivo. Só houve indicações das linhas gerais. Sobre os indicativos, primeiramente, o anúncio de que o plano está voltado para a educação global, incluindo o ensino básico, é um grande avanço. Até o final da gestão do Fernando Henrique Cardoso a educação estava focada no ensino fundamental, deixando de lado a educação infantil e o ensino médio, o que gerou uma limitação muito grande no desenvolvimento do setor no país. O PDE tentará reverter a situação ao centrar suas ações nos municípios.
Precisamos ficar atentos para algumas ações anunciadas pelo Governo Federal, como os indicadores técnicos que dizem respeito a indicadores de qualidade no ensino dos municípios, pesquisas ou provas, como a “provinha Brasil”, utilização das premiações, como as gincanas ou olimpíadas de português. Precisamos acompanhar e verificar como serão construído os indicadores para selecionar os municípios que receberão o apoio financeiro e técnico do Governo Federal.
É positivo que se realizem avaliações em relação ao desenvolvimento do ensino infantil, porém é insuficiente. A qualidade da educação não muda e o governo não conseguirá acompanhar todos os municípios, por mais que se invista em tecnologia, sem pensar no problema educacional de uma forma mais ampla, não conseguiremos resolvê-lo.
A sociedade civil está participando da formulação do PDE? HADDAD -- A principio não. O projeto ainda está muito calcado sobre a idéia de gestão, como se o problema de educação fosse só de gestão. É também, mas o plano é insuficiente do ponto de vista da participação. Somente quando os grupos sociais e a comunidade de uma maneira geral -- professores, pais, funcionários, alunos e a sociedade civil -- participarem por meio de conselhos de escola, conselhos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) ou mesmo através dos conselhos municipais é que o mecanismo de gestão tem condições de ser mais controlado, pressionado e implementado.
Fórum - Quando o presidente Lula diz que precisamos de um “mutirão pela educação” ele não está incluindo a sociedade na construção do projeto? HADDAD -- Ele está tentando chamar a sociedade, que ainda desconhece o plano. Mas o projeto ainda está muito empresarial. A sociedade não conhece, não está envolvida e desconhece os mecanismos tradicionais que são os conselhos.
Para concluir a avaliação das linhas gerais do PDE, considero positiva a institucionalização da EJA (Educação de Jovens e Adultos) nas escolas públicas, desde que fique aberta a possibilidade de as organizações da sociedade civil atuarem em setores que normalmente o poder público não opera. A idéia de criar um banco de tecnologias educacionais a ser aplicada de município em município, dependo o tipo de dificuldade que cada um enfrenta, é pouco operativo. Não se consegue reduzir a educação a apenas experiência técnicas que são transmitidas de um lado para outro.
Fórum - A discussão sobre a educação tem a ver com um estudo recém produzido pela Ação Educativa, coordenada pelo sr., chamado Educação e Exclusão no Brasil. O sr. poderia comentar a respeito? HADDAD -- No Brasil, o processo de exclusão na educação vem ocorrendo sobretudo de duas formas: falta de acesso às escolas ou inserção precária dos alunos no sistema de ensino. Neste estudo, realizado por demanda da agência internacional Save the Children, trato a questão da oferta pública da educação no Brasil que, ao longo do século passado, cresceu consideravelmente, e da não-qualificação da educação. A questão é como esses fatores são reproduzidos pelo próprio sistema.
Duas idéias básicas me orientaram. Primeiro é a relação entre educação e desenvolvimento. Especialistas apontam que a educação está diretamente ligada ao desenvolvimento e mudanças no padrão da desigualdade. No estudo aponto exemplos que demonstram que não é uma relação imediata. Depende-se do tipo de educação e do tipo de desenvolvimento que se tem. Analiso, por exemplo, o caso brasileiro após a Segunda Guerra Mundial, onde o Brasil obteve um crescimento econômico muito grande e, concomitantemente, ampliou seu sistema escolar. Isso não gerou melhoria de condições de vida para a população, porque esse tipo de desenvolvimento foi marcado pela exclusão social e concentração de renda. A outra idéia é que, olhando os dados de escolarização no país, percebemos que os grupos com menores condições de acesso são aqueles que recebem as piores condições de escolaridade. Há uma correlação direta entre os grupos mais vulneráveis e a escola de pior qualidade. No atual momento quando tratamos de escola pública e dizemos que deve ser aquela escola que dá um atendimento a todos e de qualidade devemos saber que, antes disso acontecer, deveríamos ter políticas específicas para aqueles grupos mais vulneráveis. A oferta igualitária para grupos desiguais significa nos reportarmos a desigualdade, isso é, a desigualdade continuará a se reproduzir enquanto o poder público não se preocupar em ter uma ação compensatória e políticas públicas específicas para esses grupos mais vulneráveis.