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Imagem rara na África do Sul: negros e brancos brincam juntos na entrada de um jogo de rugby, em Soweto
Quando cheguei à África do Sul, minha primeira impressão ao andar por Johannesburg foi de certa frieza. Sobre isso, escrevi aqui
Nos últimos dias, tive duas oportunidades para mudar um pouco (ressalto, um pouco) essa visão.
Primeiro, fui ao Soccer City (foto ao lado) – principal estádio da Copa, onde vão acontecer a abertura e a final do Mundial. Acompanhei o amistoso entre a seleção local e a Colômbia. Um belíssimo espetáculo... da torcida.
No caminho pro estádio, dezenas de pessoas saíam dos carros e ônibus, com bandeiras e vuvuzelas – a dançar e festejar no meio da rua.
Festa bonita, para um futebol foi sofrível. A África do Sul não mostra a criatividade e a capacidade de improviso de outras seleções africanas que surpreenderam no passado recente - como Gana, Nigéria, Camarões e Costa do Marfim.
O time dirigido por Parreira joga de forma burocrática (perdão pela redundância: Parreira e futebol burocrático). Há probabilidade enorme de a África do Sul fazer a pior campanha de uma seleção anfitriã, em toda a história das Copas do Mundo.
No jogo com a Colômbia, ganhou por 2 a 1, com a ajuda do juiz – os dois gols foram em pênaltis pra lá de duvidosos.
Mais interessante foi o espetáculo que acompanhei sábado: pela primeira vez na história, o rugby (que é o esporte preferido pelos brancos aqui) fez uma final num estádio dentro do bairro negro de Soweto.
Dizer que Soweto é um “bairro negro” reduz a história dessa imensa aglomeração urbana, na periferia de Johannesburg. Soweto é o bairro onde vivia Nelson Mandela. É o bairro da resistência negra ao Apartheid.
A maioria dos brancos preferiu ir ao estádio de ônibus fretado. Por medo.
Mas o fato positivo: centenas de brancos foram de carro particular, estacionaram os veículos nas ruas, e caminharam tranquilamente por Soweto – fazendo grande festa com as bandeiras azuis do “Bulls”, o maior time de rugby da África do Sul. Para nós no Brasil, algo absolutamente normal. Mas muitos torcedores brancos jamais haviam pisado no terroitório negro de Soweto.
Nas ruas, havia emoção. E surpresa dos dois lados. Os brancos, por perceberem que – sem a cultura do medo - podiam - sim - conviver alegre (e respeitosamente) com os negros.
Entre os moradores de Soweto, surpresa também: por ver que os brancos podem andar por ali não para agredir, prender ou matar (como fazia a polícia branca do apartheid).
Foi um belo espetáculo fora e dentro do estádio. Nunca havia acompanhado um jogo profissional de rugby – um esporte empolgante, e ainda pouco praticado no Brasil.
Mesmo quem não entende todas as regras, vibra com as arrancadas incríveis, e com certas manobras que lembram movimentos militares.
O que qualquer um entende é que esse foi um dia histórico.
Dia em que negros na arquibancada aplaudiram jogadores brancos em campo.
Dia em que brancos abraçaram negros nas calçadas, em volta do estádio, agradecendo a boa acolhida em Soweto.
Num país como a África do Sul, isso não é pouco.
Foi uma tentativa (até bem sucedida) de reduzir as tensões. Mas seria ingênuo (e seria uma tremenda recaída no ôba-ôba boleiro) dizer que o “esporte ajudou a dissolver as diferenças na África do Sul”.
Foi apenas uma trégua. Tênue. A tensão segue no ar. Assim como a frieza e até uma certa tristeza – que pode surpreender o visitante em Johannesburg.