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Por ocasião das manifestações de junho de 2013, o que dava certo alívio aos governos era que a força da massa era tanto pulverizada como difusa. Não se sabia muito bem de onde vinha nem para onde ia. Isso era constatado pelos gritos e cartazes. Insatisfações de grupos os mais distintos. Reinvindicações de entidades por direitos. As minorias nos ombros das multidões hasteavam suas bandeiras. Servidores públicos hostilizavam os governadores locais. Sindicatos mais sisudos dividiam as pistas com curiosos que só queriam fazer um self maneiro.
As manifestações de março de 2016 têm sim as multidões, mas além dela, grupos de poder mobilizados, articulados e entusiasmados com o projeto comum: interromper o Governo Dilma, estraçalhar o PT e calar de uma vez por todas o Lula.
A capital do país mudou de sede: Av. Paulista, 1313 - Cerqueira César, São Paulo - SP, 01311-923. Neste endereço fica a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Ícone da elite econômica do país revolta-se contra a corrupção. A força do símbolo. Como galinha, a FIESP reuniu debaixo das suas asas os pintinhos. Acolhedora essa entidade que coloca sempre os interesses do Brasil à frente de tudo. A entidade dos patrões sabe o que é melhor para a economia do país. Governo bom é governo sem iniciativa, responsivo apenas aos ventos do mercado. O que é bom para o patrão é bom para o empregado.
As Organizações Globo entraram de cabeça como a principal voz descontente. Relacionaram corrupção ao ex-presidente Lula, à presidenta Dilma e ao Partido dos Trabalhadores. As Organizações dos Marinhos reforçam a percepção de que se trata do ator político mais forte deste país. Paira acima dos partidos. Influencia tanto a dona de casa como magistrados togados. É o que temos de mais visível do que chamam de opinião pública. Mas não podemos ser simplórios dizendo que a Globo empurrou as multidões “alienadas” para a rua. Ela percebeu a onda de insatisfação e sugeriu quais eram os responsáveis e como deveriam ser punidos. Nos megaeventos políticos deste país, os Marinhos, além da construção das narrativas, figuram como um dos atores principais que ocupa o centro do palco. São consistentes, pois sua atuação “apartidária” transcorre desse jeito por meio século sem conhecer ameaças sérias. Nenhum agente “aloprado” do Ministério Público ousaria investigar a Rede Globo porque não se deixam pautar por rumores e pela rede de boataria.
Ainda que não seja possível carimbar tudo o que aconteceu como trabalho organizado dos partidos de oposição, mais do que em 2013, fez-se sentir a presença das estruturas que insinuam candidaturas messiânicas. Jair Messias Bolsonaro (Não inventei o Messias. O sobrenome dele é esse) desfilou entre os descontentes com tamanha desenvoltura. A musa incontestável das manifestações. O PSDB tem parcela de responsabilidade pelos milhões de manifestantes na paulista. Bonito vê caminharem de braços dados o Aécio e o Alckmin. Até a Marina Silva tocou tambor para o ritmo da marcha, mostrando o seu já conhecido traquejo para frases de efeito nos momentos oportunos. O inimigo comum une os rivais. Essa gente impoluta repudia veementemente a corrupção.
O herói da hora é o juiz Sérgio Moro. As multidões exigem “justiça”. Dessa vez as expectativas criadas pelas investigações foram tão grandes que o final feliz tem a ver com prisão. O mundo idealizado: Dilma deposta, PT extinto e Lula sem voz. No entorno, empresários e políticos, presos. O trabalho seletivo dos agentes do judiciário está grotescamente jogando-o na vala comum. “Encontramos o tumor maligno e vamos extirpá-lo!” Esse populismo de setores do Judiciário encontra eco nos meios de comunicação interessados em espetáculo. Quem deu uma cambalhota hoje, amanhã vai ter que voar se quiser continuar sendo protagonista do espetáculo.
Recuso-me a desqualificar as multidões que foram à rua. Mas é inegável que está em curso tentativas de canalização da fúria, da insatisfação. Os próximos dias serão reveladores. Alguns daqueles que dormiram satisfeitos achando que são protagonistas de uma revolução, talvez comecem a desconfiar que são meros figurantes de um golpe.