Aleluia, Amém, Alá, Sauidi, Axé

Deparei-me com um quadro em que havia a oração de Dom Pedro Casaldáliga. Com a transcrição dessa poesia abraço as leitoras e os leitores da Fórum. Foi o modo que encontrei de sair do meu lugar com a minhas apreensões pessoais e olhar para o “corredor” cheio de gente com a mesma necessidade essencial: acolhimento

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Cheguei cedo à escola para a reunião. A pauta seria meu filho. Avaliação final que me diria se ele prosseguiria com a turma ou ficaria retido na mesma série. Enquanto esperava os professores, tomava um café na secretaria. Faço o tipo tranquilo, menos quando o ponto de pauta são os meus filhos. Fui para o corredor e olhei aquelas crianças “sonâmbulas” chegando para mais um dia de aula. Fui acometido pela vontade de abraçar a cada uma. Que diversidade linda.

Lá no fim do corredor, entre tantos, o olhar do fundo eu conhecia profundamente. Acenou e entrou em sua sala de aula. Sempre econômico nos gestos, mas intenso no olhar. Entrei na secretaria e afundei na primeira poltrona livre. Escondi o rosto e chorei. Um cansaço tenso. Um medo de ser reprovado. Um sentimento de desamparo que não sei explicar. Esse negócio de socialização é difícil pra caramba.

A Escola Oga Mitá (casa da criança em tupi-guarani) é laica e profundamente respeitosa. Adota como posicionamento político-pedagógico o resgate à nossa história, à nossa cultura e o respeito às diferenças étnicas, de gênero, de valores e socioculturais.

Enquanto tentava esconder o rosto, olhei para a parede e tive uma visão do cuidado de Deus. Digo, não foi uma experiência do tipo individualismo esotérica. Transcendência que não se restringe às barreiras religiosas. Amor que vai além das minhas cercas ou mesmo das minhas crenças religiosas.

Deparei-me com um quadro em que havia a oração de Dom Pedro Casaldáliga. Com a transcrição dessa poesia abraço as leitoras e os leitores da Fórum. Foi o modo que encontrei de sair do meu lugar com a minhas apreensões pessoais e olhar para o “corredor” cheio de gente com a mesma necessidade essencial: acolhimento. Depois de aprender a soletrar “ma-mãe” e “pa-pai” e talvez “lua”, as crianças do mundo inteiro aprenderão a soletrar PESSOA. E numa canção de ninar com música herdada de Milton Nascimento ou de uma flauta andina, as crianças do mundo inteiro cantarolarão: -“P” de povo -“E’’ de esperança -“S” de solidariedade” (dois “S”, que solidariedade é plural) -“O” de oração -“A” de amizade, alegria, amor... E a criança judia dirá: Aleluia! A criança cristã dirá: Amém! A criança muçulmana dirá: Alá! A criança indígena dirá: Sauidi! E a criança negra gritará: Axé! Mas todas elas com voz de PESSOA, com esse único, plural e maravilhoso sotaque da voz HUMANA. Porque é essa teologia que gera cidadania, que respeita o estado laico, que gera insurreição e esperança. É quando se vence preconceitos e sacraliza a vida, por que é assim que se obedece a Deus. Foto de capa: Pedro Dias/Flickr