É preciso separar o joio do trigo no caso do relatório dos “detratores” do governo Bolsonaro

Leia no Blog do Rovai: Monitoramento de redes é algo comum em todos os governos, da esquerda à extrema-direita. E não só em governos. Empresas, clubes de futebol, ONGs etc. fazem monitoramento de redes nos seus nichos específicos

Escrito en BLOGS el

Todas as suspeitas devem ser consideradas quando se trata de suspeitar que o governo Bolsonaro tem uma Abin para vigiar jornalistas e militantes de esquerda no governo. Há vários indícios de que isso acontece, entre eles a declaração do presidente naquela reunião ministerial que levou ao pedido de demissão de Sérgio Moro.

Mas este caso do relatório que inclui jornalistas favoráveis, neutros e oposicionistas ao governo não é um esquema de arapongagem. É algo muito distante disso e é importante que se diga para não se criar um monstro.

Monitoramento de redes é algo comum em todos os governos, da esquerda à extrema-direita. E não só em governos. Empresas, clubes de futebol, ONGs etc. fazem monitoramento de redes nos seus nichos específicos.

Para vocês terem uma ideia, a ouvidoria da Revista Fórum faz um monitoramento diário das redes e o distribui todas as manhãs para a equipe de redação do site. Todos aqueles que nos xingam ou elogiam, em especial no Twitter, estão lá. A partir da organização de dados públicos.
É comum. É do jogo. E os governos devem fazer isso para saber como estão sendo observadas suas ações.

Em relação ao relatório que se tornou reportagem numa correta matéria da Folha de S. Paulo, o que se viu foi isso. Um monitoramento de redes focalizado em alguns jornalistas e influencers. Esse é o detalhe que pode ser discutido. Ele monitorava a ação de jornalistas nas redes. Mas mesmo isso não é ilegal e nem exatamente imoral. Um governo precisa saber como lidar com a imprensa.

Mas cá entre nós, esse relatório foi feito a partir de um mapeamento bastante questionável. Deveria ter divisões do tipo: ativistas, jornalistas da mídia comercial, jornalistas independentes, comentaristas, blogueiros etc.

Se possível dimensionando num período de tempo a capacidade de influenciar de cada um desses atores sociais e especificando em que temas eles mais criticam o governo. E só a partir daí fazer a divisão entre “detratores”, “neutros” e “apoiadores”. "Detratores" é um termo bem ruim, mas é tecnicamente utilizado no mercado. Em especial no mercado publicitário. Como também o termo “evangelizador”, que o relatório não usa, mas que serve para definir aqueles que defendem as ideias do contratante.

Como se trata de um relatório para um órgão governamental a agência não deveria usar o termo detratores. Se usasse positivo, negativo e neutro talvez o resultado da matéria como piada teria sido outro.

Mas o fato que mais me incomodou é que o valor do contrato que a matéria apresenta é de 2,7 milhões de reais. Como se aquele trabalho tivesse custado isso. E ele não vale isso. Este seria então o grande busílis desta questão. Poderia haver aí um desvio milionário de recursos.

Acionei a agência e descobri que o serviço do relatório custou R$ 36.343,93. Valor que não está fora dos preços cobrados no mercado.

Enfim, a piada não vai cessar e talvez até de maneira correta Bolsonaro vai pagar este preço. Mas para fazer justiça àqueles que trabalham na área e tendo visto um debate nas redes com muita imprecisão a respeito do assunto (gente falando inclusive em CPI) considerei por bem explicar como funciona este mercado.

E que fique claro. Não há nada demais em raspar os dados públicos das redes para verificar e lidar com aquilo que falam de você, sua empresa ou seu governo. É legítimo fazer isso. Mesmo que seja para saber a posição de jornalistas e/ou influencers. Até porque as informações são todas públicas.

Enfim, essa é mais uma história que mostra como esse governo é fraco e desorientado. Nem isso eles conseguiram explicar para o distinto público em defesa da contratação de um serviço corriqueiro no mercado.