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A eleição de outubro será a marca de corte de uma nova etapa do golpe, a sua fase 2. Muito mais dura, muito mais violenta, muito mais anti-democrática, muito mais objetiva em relação aos objetivos que levaram à grande articulação para derrubar Dilma.
O que se está vendo até agora não é nem o café pequeno do grande banquete que vem sendo preparado para contentar não só as elites econômicas, como os mais variados interesses que se uniram neste projeto.
Até as eleições, Temer e seus aliados vão tomar cuidado. Porque eles sabem que têm necessidade da desculpa das urnas para dar alguma legitimidade ao que virá.
Mesmo que seja uma legitimidade ilegítima, a mídia já prepara o discurso do dia seguinte eleitoral.
O PT será o maior derrotado nas urnas (e ao que tudo indica isso de fato ocorrerá) e a interpretação será a de que o Brasil quer seguir em frente. Não está mais disposto a olhar para trás. E que os votos no PT deram esse recado.
A interpretação permitirá, entre outras coisas, agir de forma muito mais violenta com os movimentos sociais, que serão tratados como braço armado do petismo.
A fase 2
Entre os acordos do golpe, o mais importante é o econômico. Ele prevê privatizações em massa, entrega do Pré-Sal, reforma da previdência, com ampliação do tempo de trabalho, e reforma trabalhista, que deve aumentar a jornada de trabalho e permitir contratações com imensa flexibilidade, o que enterrará a CLT.
Os dois últimos pontos são altamente tóxicos do ponto de vista social e vão ser fundamentais, quando de fato se tornarem propostas no Congresso, para engrossar o caldo das ruas.
Esses manifestações se forem crescendo poderão parar o país num grande Fora Temer. E o governo, cujo ministro da Justiça, Alexandre Moraes, é "especialista" em lidar com movimentos sociais, sabe disso.
E tem uma fórmula que considera imbatível para lidar com o problema. Bombas, porrada, prisões arbitrárias e a transformação dos atos em imensas zonas de conflito, para amedrontar os mais cuidadosos.
Depois das eleições, haverá uma enxurrada de prisões de lideranças sociais em todo o país. Num primeiro momento as secundárias, para buscar a desarticulação dos movimentos, mas se isso não for suficiente, a mira vai se deslocar para gente como Boulos, Stédile, Wagner da CUT, presidentes de sindicatos importantes, lideranças dos movimentos de mulheres, a garotada do Levante, do MPL, da UNE etc.
Até agora, por exemplo, o governo Temer não deu explicação alguma para o caso do capitão do Exército que estava infiltrado em movimentos de jovens. Como se aquilo não representasse uma grave ameaça à democracia.
A mídia e os nossos tão atentos repórteres e colunistas desses veículos tradicionais, também ignoraram o fato.
Mas esse é um pedaço importante do rabo que deixa à vista o pitbull do golpe.
Esses agentes estão atuando em todos os cantos do país não só para passar informações, como para criar tumultos e plantar provas que levarão vários manifestantes à cadeia.
A prisão dessas lideranças será justificada sempre como em defesa da ordem e da democracia. E a partir de outubro/novembro estará ancorada no discurso do resultado eleitoral. Na história da minoria que quer bagunçar com o país.
A perseguição terá outros capítulos
Se as lideranças sociais da cidade serão presas e se no campo pode vir a ocorrer a eliminação pura e simples de muitas delas, o clima de terror não está limitado a esses grupos.
Em setores médios, por exemplo, haverá uma imensa caça às bruxas daqueles que não estiverem dispostos a fazer a lição de casa do golpe.
Nas redações dos veículos tradicionais ainda há uma parcela de 10% a 20% de jornalistas que são corretos. A grande maioria, infelizmente, ou faz cara de paisagem ou assumiu o discurso dos donos dos veículos, que estão entre os principais acionistas do que virá.
Os jornalistas corretos serão intimidados a se calar ou a aderir. Caso não aceitem, serão demitidos. O medo, colocará muitos em situação de submissão. A coragem, fará muitos se tornarem donos do próprio nariz em novos veículos de resistência que serão criados.
Mas a situação dessa nova mídia, mais independente e livre, também não será fácil. O envolvimento do poder judiciário com muito do que virá não será algo apenas para inglês ver. Como nunca foi nos golpes que o Brasil já viveu. E a judicialização será o caminho para derrotar a blogosfera.
Alguns blogueiros já estão gastando mais tempo com advogados do que com produção de reportagens e artigos. E a tendência é a intensificação deste caminho por parte não só do governo, mas de todos os setores que compõem a nova aliança de poder.
Artistas e grupos culturais dissonantes também serão acossados, como já ficou claro na perseguição a Aquárius. Haverá ainda imensa asfixia econômica às universidades públicas e instituições de pesquisa. Exatamente para limitar a ação dos setores de opinião mais independentes.
Programas sociais
O governo não vai desmontar todos os programas sociais de uma vez. Vai fazê-lo aos poucos e garantindo que restem exatamente aqueles que permitirão maior controle da base atingida.
Essa estratégia será utilizada para fortalecer o campo político aliado nas regiões onde as ações dos governos Lula e Dilma provocaram maiores transformações, em especial no Norte e no Nordeste.
Programas que hoje são gerenciados de forma técnica serão municipalizados para se transformarem em moeda eleitoral. O governo federal entrará com os recursos. E os aliados municipais garantem o cabresto. Até porque o PMDB sabe que fortalecer o cabresto municipal é a sua chance de continuar à frente do governo central.
Se isso vier a dar certo, em pouco tempo boa parte das bases sociais do Lulismo poderão voltar à dependência do passado e acabarão não tendo muita condição de reagir à tutela dos coronéis locais.
Como já ensinou o velho Marx, o lumpesinato não faz a revolução. E sequer consegue resistir.
Nas grandes cidades, o aumento do desemprego e da injustiça social também vai produzir novos bolsões de miséria. E uma imensa nova geração de lúmpens.
A Lava Jato e 2018
É fato que essa agenda não é assim tão simples de se impor por conta das contradições da sociedade e dos conflitos internos dos grupos que se aliaram para o golpe. Mas é este o projeto que está na mesa. É o projeto que será tentado não num parto natural, mas à fórceps.
É isso que com um detalhe aqui ou acolá passa pela cabeça de todos que se uniram nessa aventura monstruosa de colocar a democracia brasileira em risco.
Na cabeça desse grupo não há espaço para perder as eleições de 2018, mesmo que seja necessário dar um novo golpe, que seria a fase 3, implantando um semi-presidencialismo e unificando todas as eleições para 2020.
A Lava Jato, depois da denúncia contra Lula, já chegou onde deveria. E a própria denúncia contra Lula, pode ter decretado o seu fim.
A vaidade de Deltan Dellagnol parece ter sido fatal para a operação. E já há quem trabalhe com a hipótese de que o bad boy com cara bom moço foi encorajado a fazer uma peça acusatória, mesmo que sem sentido e frágil, para que pudesse vir a ser desmoralizado depois.
Não há outra explicação para os textos de um certo blogueiro da Veja que não seja a voz de um ministro do Supremo com o qual ele compartilha longos telefonemas. E ao mesmo tempo os interesses de um certo ministro das Relações Exteriores que ele chama de amigo. E de quem se orgulhava de compartilhar da "intimidade da família".
O blogueiro saiu atirando na acusação de Dallagnol mesmo sem lê-la, como pode ser conferido no seu primeiro texto sobre o tema.
Sinto informar, mas enganou-se redondamente quem comemorou a ação como um ato de honestidade intelectual. O que se deve depreender daquilo é a tentativa de fazer a Lava Jato subir no telhado. Mas não sem antes empurrar Lula do telhado das acusações que ele vem enfrentando com dignidade e coragem de admirar.
Voltando às eleições
O campo progressista tem pouca margem de atuação neste momento. O momento é muito mais de esperar os erros do lado de lá para tentar ganhar alguma força do que sair agindo na base da louca, como se diz no Nordeste.
É quase certo que as urnas de outubro trarão notícias terríveis para o PT e muito ruins para os outros partidos aliados dos governos Lula e Dilma.
Mas mesmo neste mar revolto, algumas coisas deveriam ser tentadas. E há o que se tentar.
Em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Recife e Fortaleza, por exemplo, que são grandes e simbólicas, há em menor ou maior dose, alguma chance de vitória do campo progressista. Ou mesmo de derrotas menos impactantes.
Se a hipótese de que uma derrota fragorosa da esquerda pode levar ao endurecimento das ações do governo faz sentido, seria razoável buscar com todas as forças acordos ainda no primeiro turno que evitassem, por exemplo, que candidaturas progressistas morressem abraçadas já nesta fase inicial.
Um movimento nacional de unificação de candidaturas com o objetivo de defender a democracia e tentar garantir desde já alguma unidade para o que virá deveria ser tentado e colocado como ponto central das articulações nos próximos dias.
E os movimentos sociais é que deveriam chamar os partidos para sentarem e construírem acordos, porque mais do que os partidos, quem vai pagar a conta principal da repressão na fase 2 do golpe serão os movimentos.
Mesmo se isso vier a acontecer será muito difícil sair dessa eleição cantando vitória. Mas não é disso que se trata agora. É de buscar criar um campo de alianças mais solidário, generoso e capaz de resistir.
Que entenda o momento atual com a dimensão que ele tem e não como um pequeno freio de arrumação que pode garantir a alguns um pouco mais de espaço no futuro breve.
Se o golpe for bem sucedido na sua fase 2 vai sobrar muito pouco para o campo progressista nos próximos cinco a dez anos. E pode ser ainda pior. Talvez isso permita empinar um projeto baseado numa ação de força para até 15, 20 anos.
Um projeto com base num sistema de exceção um pouco mais sofisticado, mas na mesma linha do Brasil ame-o ou deixe-o é o que se vai tentar.
E aí, amigos, como já disse o Jânio de Freitas, talvez o passaporte atualizado seja muito mais do que um capricho, mas uma necessidade para conseguir resistir e sobreviver.