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Por Glauco Faria
Desde o início da operação Lava Jato, quando evidências de formação de cartel de empreiteiras e desvios na Petrobras começaram a vir à tona, a mídia tradicional tem adotado uma linha narrativa que tem sido a tônica dos últimos anos. Mas, no caso específico da estatal, também está posta de forma explícita a forma como os grupos midiáticos querem que a companhia seja conduzida.
A grande preocupação do noticiário quando Graça Foster nem tinha anunciado sua saída era se o próximo presidente agradaria ou não à entidade algo fantasmagórica – mas real demais – chamada “mercado”. O circuito financeiro gostaria de um nome que rezasse no altar do tripé econômico e de outros dogmas tão cultuados por fieis da orientação ortodoxa. Acharam que a fatura estava ganha, mas, no final, o nome de Aldemir Bendine frustrou o mercado. Nada a ver com sua competência, mas sim com a expectativa de que fosse escolhido alguém com a visão privatista.
Esse tipo de visão norteou a gestão da empresa durante muito tempo nos anos 1990. No final do segundo governo FHC, por exemplo, a flutuação do preço do barril de petróleo ditava o reajuste dos combustíveis, causando imprevisibilidade quanto à inflação. O complexo industrial da Petrobras, que atuava e atua em áreas distintas, foi em parte fragmentado, enfraquecendo e diminuindo o raio de ação da estatal.
A partir de 2003, a companhia voltou a estar alinhada aos interesses estratégicos governamentais. E foi graças a ela que a crise internacional de 2008/2009, que dizimou empregos na Europa e nos EUA, não teve um impacto tão grande no Brasil. Depois de investir, em média, cerca de 0,8% do PIB brasileiro entre 2003 e 2006, a empresa chegou a 1,3% em 2008 e a 1,9% em 2009. Em 2010, eram 183 projetos do plano estratégico da empresa incluídos no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).
Mas o grande impulso econômico dado pela Petrobras foi o ressurgimento da indústria naval. No ano 2000, era uma área que contava com menos de 2 mil empregados e hoje estima-se que conte com 82 mil trabalhadores. Que já sentem a ameaça do desemprego.
Em novembro, o número de postos de trabalho no setor era de 85 mil. A queda se deu por conta de demissões feitas pelo estaleiro Ilha S.A. (Eisa), no Rio de Janeiro, que não têm relação com a crise atual. Mas a Petrobras já convidou fornecedores estrangeiros para participar de processos licitatórios que envolvem a construção de módulos de compressão de gás, que estavam a cargo da Iesa Óleo e Gás, cujo contrato com a estatal foi rescindido em 2014.
Após o início da divulgação (e dos vazamentos) da Lava Jato, alguns veículos de imprensa começaram a fazer verdadeiras campanhas para que a Petrobras passasse a contratar fornecedoras sediadas no exterior, já que boa parte das empreiteiras estão envolvidas nas investigações. Estaleiros europeus, chineses e de outras partes do mundo estariam ávidos para entrar no Brasil e fornecer equipamentos para a petroleira. Interesses que seriam também de alguns governos locais, dada a situação do desemprego em alguns países.
Com o BNDES empurrando para a próxima diretoria a decisão sobre o socorro à empresa Sete Brasil, responsável pela construção de 29 sondas de perfuração para a Petrobras nos próximos anos, o efeito dominó pode ser ainda pior. Como parte das contratadas da Sete já realizaram investimentos, fornecedoras que estão no andar de baixo desta cadeia podem quebrar, gerando a extinção de postos de trabalho.
Em função disso, o silêncio do governo em relação aos efeitos que podem ser gerados a partir dessa mudança de conduta da Petrobras é mais que preocupante. É preciso abrir canais de diálogo com o Ministério Público, o Judiciário e outras instâncias institucionais para que as investigações – que estão em curso e não foram concluídas ainda, diga-se – não possam ser fatais para a geração de empregos em um momento difícil da economia brasileira.
Se trabalhadores já pagam a conta pelos desvios, pela formação de cartel e também pela cobertura predatória da mídia tradicional, não podem pagar ainda pela inação governamental diante de um possível desmonte de um setor econômico nacional. É preciso olhar um pouco menos para a bolsa e mais para o chão da fábrica.
Punições precisam acontecer, assim como o aperfeiçoamento de mecanismos que evitem relações pouco transparentes entre o poder público e o privado, evidenciadas no episódio. Mas o trabalhador não pode, mais uma vez, pagar a conta pelo que não fez.