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Muita gente já escreveu sobre o anunciado fechamento do Cine Belas Artes, na rua da Consolação, esquina com a avenida Paulista, em São Paulo. Quero meter minha colher nisso.
Quando cheguei em São Paulo, aos 16 anos de idade, já existia aquele cinema, mas seu nome era Trianon. Não era um cinema especial, de filmes de arte.
Alguns anos depois, ele mudou de nome, de estilo e de público. Passou a ser uma referência em São Paulo. Ir lá, em uma de suas salas, era não só a certeza de ver bons filmes, mas também de encontrar muita gente legal.
Já na fila para comprar ingresso, a gente tinha uma sensação de estar num lugar especial, com gente discutindo tudo quanto era assunto ligado às artes e à política, e escritores vendendo seus livros a preços baratos. Na década de 1970, comprei livros do Plínio Marcos ali.
Depois da sessão, o costume era atravessar a rua e discutir o filme tomando uma cerveja ou conhaque numa mesa ou no balcão do Riviera, bar tradicional da região, imortalizado por Angeli, com sua personagem Rê Bordosa. Os garçons eram um caso à parte. Havia um que bebia do meu copo.
Claro que eram outros tempos. Muita coisa mudou. O Riviera, foi para o beleléu há muito, já que o estilo e os preços dos bares de hoje são outros, como aqueles caros e barulhentos da Vila Madalena.
Outros cinemas gloriosos se fecharam antes dele. Os grandes cinemas eram quase todos no centro, cada um com suas características bem conhecidas. O República, com a maior tela. O Marrocos com a melhor sala de espera, enorme, com sofás forrados de couro legítimo. O Ouro com apresentação de um pianista entre as sessões.
Lembro-me bastante do Olido, que tinha ao lado de sua entrada um bar que servia café espresso, na época chamado “café cremoso”. Era o único lugar de São Paulo, pelo menos que eu conhecia, que tinha esse café. Mesmo quando ia a outro cinema, costumava passar lá para tomar um.
Na avenida São João, depois da Duque de Caxias, havia o Comodoro, mais conhecido como Cinerama, que era uma técnica usada fazer a gente se sentir dentro do filme, com uma tela curva e três projetores que funcionavam simultaneamente.
E havia muitos outros, dezenas. Entre eles, Marabá, Ipiranga, Paissandu, Art Palácio, Lido, Metro, Metrópole, Copan... No bairro da Liberdade havia cinemas que só passavam filmes japoneses.
E vários cinemas de arte, como o Coral, o Arouche e o Bijou.
Nos bairros também havia muitos cinemas bons. Na avenida Celso Garcia havia um com mais de três mil lugares. Em Pinheiros, onde eu morava, tinha o Jardim, um cinema grande que hoje virou agência de banco, e ao seu lado o Fiametta, na rua Fradique Coutinho, hoje cine Uol, pouco freqüentado, e também o Festival e o Goiás.
Foram todos virando igrejas pentecostais, lojas ou agências bancárias... O Astor, belíssimo, ali pertinho do Belas Artes teve um fim menos inglório, virou uma grande livraria. Mas eu o preferia como cinema.
Enfim, os tempos são outros e não adianta lamentar. O negócio agora é ir a um cinema de shopping, impessoal, e já entrar com um balde de pipoca e outro de coca-cola. Algum velho ranheta, de outros tempos, pode reclamar do seu barulho mastigando pipoca ou chupando o canudinho no balde de refrigerante. Mas será ele a exceção, o “errado”, e não você.