Como prometido trago outro texto para auxiliar no debate sobre a PEC37 já que tem muita desinformação maniqueísta e simplista travestida de meme no Facebook.
Leia também: Igor Nogueira: DO PORQUÊ DEVEMOS SER A FAVOR DA PEC 37
ENTENDENDO A PEC 37Por: Solano Miguel de Ibanhes e Camila Herédia Miotto , por mail e também publicado aqui
Mais do que apresentar pontos de vistas sobre determinados assuntos, válida também é a difusão de informação. E um dos pontos importantes a ser discutido, seja na pauta do Congresso ou das atuais manifestações, é a PEC 37, mas antes de rotulá-la, seguem abaixo alguns apontamentos.
O QUE É A PEC 37?
Antes de começar a explicar o que se busca com a sua aprovação, importante fazer alguns esclarecimentos. Afinal, o que é uma PEC? PEC significa Proposta de Emenda à Constituição, pois para serem feitas alterações no texto constitucional há algumas regras (art. 60 da CF/88)e um longo caminho a percorrer dentro do Congresso Nacional.
A PEC 37 foi apresentada em 08/06/2011 pelo Deputado Federal Lourival Mendes, do PT do B/MA e sua emenda assim dispõe:
“Acrescenta o § 10 ao art. 144 da Constituição Federal para definir a competência para a investigação criminal pelas polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal.”
Com a leitura do inteiro teor da PEC 37, percebe-se que o se busca, ao contrário do que se tem divulgado, é a exclusividade da Polícia Judiciária na investigação CRIMINAL.
Isso porque a atual redação do art. 144 da CF/88 trata da segurança pública, que é dever do Estado, é que é exercida através das Polícias Federal e Civil, elencando ainda a destinação da investigação das mesmas.
Caso aprovada, será incluído o § 10, que terá o seguinte teor:
"A apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo, incumbem privativamente às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente".
Não há qualquer menção de que tenha sido retirado o poder investigatório do Ministério Público, até porque este não consta na Constituição como será demonstrado adiante. A PEC busca definir de forma clara a exclusividade na investigação criminal realizada pela Polícia Judiciária.
POLÍCIA JUDICIÁRIA: O QUE É E O QUE FAZ
É de competência da polícia federal e das polícias civis dos estados a função de polícia judiciária. São chamadas de judiciárias por auxiliarem o judiciário no procedimento preparatório ao processo penal, coletando provas, ou seja, na realização da investigação. Suas funções estão especificadas no artigo 144, parágrafos 1º e 4º da Constituição Federal.
Cabe à polícia federal apurar as infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme (art. 144, § 1º, I), além de reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho (art. 144, § 1º, II).
Já às policias civis dos estados, que são dirigidas por delegados de polícia de carreira, cabe à apuração das infrações penais, exceto as militares (art. 144, § 4º).
MINISTÉRIO PÚBLICO: O QUE É E O QUE FAZ
Ministério Público é, segundo o art. 127 do CF/88, “uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.”
Quanto às suas funções (art. 129 do CF/88), destacam-se duas relevantes para a presente discussão: III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais.
Pela redação da CF/88, não se permite e nem se proíbe expressamente que o Ministério Público investigue diretamente os crimes.
Atualmente, há entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal), no sentido que o MP pode investigar diretamente através de seus próprios órgãos, como, por exemplo, acontece através da GAECO (Grupo de Atuação Especial em Combate ao Crime Organizado).
Para uma melhor análise da proposta, deve-se atentar que ao MP nunca foi privado o direito de participar das investigações da polícia, e que continuará não sendo caso a PEC 37 seja aprovada, uma vez que esta busca, numa análise mais simples, definir expressamente a “liderança” na investigação criminal e não excluir colaboradores.
PROCESSO PENAL: FASE PRÉ-PROCESSUAL E FASE PROCESSUAL
Feitas as breves considerações sobre a polícia e o MP, vale também entender um pouco de como funciona o processo penal no Brasil. De forma bem sucinta, é possível resumi-lo em duas fases: pré-processual e processual.
Na primeira fase, a pré-processual, é que se realiza a investigação. Hoje, em regra, os inquéritos criminais são conduzidos pela polícia federal e civil. Nessa fase, há apenas um investigado e não um acusado ou réu.
Como já dito, durante as investigações ou mesmo antes dessa começar, o Promotor de Justiça (representante do MP) pode requisitar qualquer diligência à polícia (art. 129, VIII da CF/88), que deve ser, obrigatoriamente, cumprida.
Findada a investigação, o delegado de polícia deve analisar todas as informações obtidas e relatadas, para assim enviar ao MP.
Através das informações relatadas, o Promotor de Justiça analisa o caso e se embasa para oferecer a denúncia ou não. Caso ela seja oferecida, dá-se início à segunda fase, a processual. E para oferecê-la basta a prova da materialidade e indícios de autoria.
Caso entenda pela ausência de crime ou ainda quenão haja indício sobre a autoria, pode novamente requisitar diligências ou o arquivamento do inquérito (investigação). E mesmo depois de arquivado, havendo notícia de novas provas poderá requerer o desarquivamento e novas diligências.
A PARIDADE DE ARMAS NO PROCESSO
O princípio da paridade de armas é um dos mais importantes, senão o mais, do atual processo penal brasileiro, consiste em assegurar a igualdade entre as partes no processo, decorre do princípio constitucional do contraditório, garantindo que nos atos do processo ambas as partes sejam ouvidas.
Por isso um órgão imparcial é responsável pela investigação (polícia judiciária), sob controle externo do ministério público que pode participar da mesma. Constatado o crime, o ministério público acusa dando início ao processo penal, no qual o réu será defendido por advogado ou defensor público. Um juiz ou o júri popular (casos de crimes contra a vida) imparciais julgam.
É um princípio que reflete o aspecto democrático da nossa Constituição, dando importante atenção ao processo penal, para evitar abusos e injustiças, principalmente ao tratar sobre tirar a liberdade de alguém.
PORQUE É IMPORTANTE APROVAR A PEC?
O ministério público não tem função constitucional para investigação criminal, mas através de seu conselho nacional, por meio de uma resolução, se concedeu o direito de promover a investigação criminal. Legislou em causa própria, usando uma interpretação absurda de que a Constituição ao não impedir a investigação pelo ministério publicou, autorizou implicitamente. A constituição listou todas as funções do ministério público, inclusive sua participação na investigação, se o constituinte quisesse que ele tivesse poder de investigação, constaria no artigo 129.
A PEC tem o objetivo de deixar claro que o ministério público não tem esse poder, que ele não pode violar o princípio da paridade de armas. A PEC não retira poder do ministério público de investigar, porque ele nunca teve esse poder. Se a PEC for aprovada o ministério público poderá continuar participando da investigação, mas essa será realizada pela polícia judiciária, garantindo mais justiça nos processos criminais.
Quando a polícia judiciária investiga, o ministério público participa e faz o controle externo, ele fiscaliza o trabalho da polícia. Então o fato da polícia judiciária ser subordinada ao executivo não impede que os investiguem, já que o ministério público pode requisitar abertura de inquérito e tem o dever de denunciar a inércia policial diante de crimes. Agora, quando o ministério público investiga, quem fiscaliza? Se o ministério público investiga e não acusa por interesses escusos, quem cobra? Quem garante que não levantará provas interessantes somente à acusação? Tem certeza que VOCÊ gostaria de ser investigado e processado pelo mesmo órgão?
OUTROS PAÍSES?
Algumas pessoas começaram a espalhar a ideia que apenas três países no mundo não permitem que o ministério público investigue. Antes lembro que a PEC não impede, o ministério público poderá participar das investigações. Os países seriam Uganda, Indonésia e o Quênia. Fizemos então um levantamento de informações sobe esses países que segue abaixo.
Em Uganda o Ministério público participa das investigações criminais, podendo direcionar a polícia para uma investigação, aconselhando o "criminal investigationdepartment" quanto às investigações e desde 2009 o chefe do MP pode investigar crimes de corrupção com ajuda dos promotores e da polícia. Verifiquei em: DPP e Public Service
No Quênia é meio complicada a coisa, os promotores assim como aqui na Brasil atualmente, podem direcionar e supervisionar a polícia em uma investigação, mas lá existe também uma figura muito esquisita que é o promotor policial, que nem precisa ser formado em direito. Difícil comparar com o Brasil antes ou depois da PEC. Verifiquei em: ODPP
Na indonésia o MP (Kejaksaan) pode investigar alguns crimes, incluindo o crime de corrupção, além de participar e supervisionar a investigação de outros crimes. Verifiquei em: kejaksaan e Unafei
Como se vê não é verdade o que estão espalhando por aí. Mas podemos citar alguns países onde o ministério público só participa da investigação, como será no Brasil caso a PEC seja aprovada. São eles, Inglaterra, País de Gales, Irlanda, Irlanda do Norte, Canadá, Chipre, Dinamarca e Finlândia. Podem verificar o sistema dos europeus citados aqui: E-Justice Europa e do Canadá aqui: JUSTICEBC.
Por Solano Miguel de Ibanhes, bacharael em Direito e Camila Herédia Miotto, advogada, ambos
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