País ficou 60% mais pobre, afirmam críticos do leilão do campo de LibraComemorada pelo governo, a licitação do maior campo petrolífero do pré-sal é duramente criticada por trabalhadores e especialistas, que questionam cálculos da ANP sobre lucro do Estado na operação
Por Cida de Oliveira, da RBA 21/10/2013 20:59, última modificação 21/10/2013 21:38
FERNANDO FRAZÃO/AGÊNCIA BRASIL. Para o governo, fato de não terem se registrado consórcios concorrentes não é motivo para preocupação
Leia mais: Para CUT, escolha do consórcio liderado pela Petrobrás está longe de ser o melhor cenário, FUP continua a greveSão Paulo – O leilão do campo de Libra, realizado na tarde de hoje (21) no Rio de Janeiro, foi comemorado pelo governo. A participação da Petrobras, de 40% sobre o petróleo explorado, e os cálculos da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) de que o Estado ficará com 73 dos lucros do bloco do pré-sal é vista como um resultado positivo pela administração Dilma Rousseff.
No entanto, a realização do leilão e o seu resultado foram alvos de críticas de trabalhadores e especialistas. Para o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, o país ficou 60% mais pobre. "Até o leilão, o Brasil tinha 100% do maior campo do pré-sal. A partir de então, tem no máximo 40%", disse.
"A entrega de 60% de Libra para as empresas estrangeiras é um dos maiores crimes de lesa-pátria que já tivemos no país. Um dia triste para o povo brasileiro", lamentou. "O leilão foi um fiasco e o governo ainda comemorou".
Além dos 40% da Petrobras, o petróleo será divido entre a francesa Total (20%), a anglo-holandesa Shell (20%) e as chinesas CNPC e CNOOC (10% cada). O consórcio pagará 41,65% do excedente de óleo bruto ao Estado brasileiro. Além disso, as empresas tiveram de depositar R$ 15 bilhões para poder participar do leilão.
Para Moraes, o fato de a Petrobras ficar com 40% do campo – 30% assegurados pelas regras do edital mais os 10% de participação no consórcio vencedor – não chega a acalmar os ânimos daqueles que defendiam a exploração exclusiva pela Petrobras como prestadora de serviço.
De acordo com ele, a FUP se debruçará detalhadamente sobre o edital e contratos em busca de alternativas jurídicas ainda cabíveis para anular a licitação. Outra ação será a de promover campanhas educativas para a população. "O brasileiro tem de passar a entender de petróleo e gás para não vir a ser lesado como foi hoje", disse.
Menos para a educação
O consultor da Câmara dos Deputados para Assuntos de Petróleo e Gás, Paulo César Ribeiro Lima, questionou os cálculos da ANP. De acordo com ele, com base no edital do leilão, a participação da União será muito menor que o anunciado, podendo chegar a 9,93% (de 41,65%) caso o valor do barril de petróleo despenque no mercado internacional e a produtividade da produção de Libra também seja reduzida.
Para ele, esse cenário não é tão improvável assim, uma vez que a produção mundial pode ser elevada principalmente pelo aumento da produção americana de Shale oil, categoria de óleo extraído do xisto betuminoso. Além do mais, o preço do barril já chegou a R$ 60,00 e a produção já caiu a menos de 4 mil barris diários.
"Pelas regras, a remuneração de 41,65% é calculada numa perspectiva de produção de 12 mil barris por dia, cada um no valor entre 100 e 120 dólares. Se ambos subirem, o percentual sobe para 45,56%. Mas se caírem, pode chegar a 9,93%", afirmou. "Quem perde com isso é a educação, que receberá 75% dos royalties, e a saúde, que ficará com 25%.". Os royalties correspondem a 15% do valor do barril.
Essa matemática, conforme Lima, chega a ser mais desfavorável ao país do que em um regime de concessão. "Por esse regime, Libra pagaria perto de 40% independente da produção e do preço do barril".
Conforme ele, as regras estabelecidas para o leilão de Libra são diferentes daquelas do regime de partilha de outros países. "Se Libra fosse na Noruega, o governo norueguês ficaria com mais de 60% da produção, e não as empresas; aqui não teve leilão, e sim um acordo entre a Petrobras, que é mais privada que estatal, com 53% de capital social estrangeiro, e as companhias multinacionais."
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, saiu em defesa do modelo e disse que o governo não pretende promover mudanças para os próximos leilões, que devem ocorrer apenas a partir de 2015. "Como nós estamos falando de grandes somas de investimentos, e também de grande capacidade tecnológica, isso limita um pouco a participação", disse. “[Outras empresas] não devem ter participado por questões estratégicas, ou têm outros investimentos a fazer, ou não cabia no portifólio, ou não julgaram interessante. Cada empresa é que deve dizer. Mesmo que seja um consórcio, mas ele foi um consórcio com várias empresas e é perfeitamente satisfatório.”
Coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, entende que o resultado do leilão não chegou a surpreender e ficou bem abaixo da necessidade de recursos para a educação. "Infelizmente o governo não conseguiu acertar um valor maior para o maior campo. Apesar da riqueza que ele trará, estimulando toda a cadeia produtiva do petróleo e gás, não podemos esquecer o retorno que deixaremos de obter", disse.
Para o conselheiro do Clube de Engenharia Paulo Metri, embora a União ganhe com os royalties que serão arrecadados com a licitação e produção do campo de Libra, perde porque a maioria (60%) dos lucros ficarão com as empresas estrangeiras. "Foram criadas regras que permitiram que o consórcio, e não a União, fique com a maior parte dos lucros."
Para Metri, o fato de a Petrobras ficar com 40% da participação só é positivo num panorama em que a estatal ficasse de fora. "Porém, é ruim quando a Petrobras poderia ter ficado 100%", disse, destacando o artigo 12 da Lei 12.351, de 2010, que permite à União contratar a petroleira nacional sem licitação em caso de preservação do interesse nacional e ao atendimento dos demais objetivos da política energética.
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