Quase três meses de governo e parece que a presidenta Dilma Rousseff estabelecerá um outro padrão na relação do governo com a mídia velha e nas relações internacionais.
Primeiro, sem nenhuma necessidade a presidenta vai a uma festa privada dos Frias como presidenta. Ela tinha agenda ocupadíssima no dia, um encontro com os governadores do Nordeste, saiu de lá correndo para fazer seu discurso mais lamentável até o momento.
Depois estabeleceu boas relações com programas voltados para o público feminino da classe C primeiro na Ana Maria Braga, depois na Hebe.
O programa da Hebe ontem só tendo muito bom humor para assistir, não há análise semiótica que resista a um espetáculo tão triste de exibição limítrofe de uma senhora que beira os 80 anos. Dilma até que se esforçou, mas visivelmente era difícil conversar com aquela senhora Gracinha! Num dado momento eu achei que a Hebe iria perguntar por que Dilma foi presa. Para sintetizar digamos que Ana Maria Braga perto de Hebe é assim uma Simone de Beauvoir.
Finalmente, a visita de Obama. A assessoria da embaixada estadunidense no Brasil faz uma pataquada desrespeitosa para recepcionar Obama. É como se estivéssemos no século XVI! Resta saber se Dilma vai dizer amém à compra de caças dos EUA que não transfere tecnologia e nos torna dependentes. Acompanhemos.
Para encerrar esta relação ambígua estabelecida por um governo progressista com os barões da mídia mais conservadora e golpista, a presidenta oferece um almoço de boas vindas ao presidente Obama no Itamaraty (liturgia do cargo), mas convida para participar do rega-bofe nada mais nada menos que: João Roberto Marinho (Globo), Luis Frias (grupo Folha), Amilcare Dallevo (RedeTV!), Edir Macedo (Record) e Nelson Sirotsky (RBS) dentre outros.
Há algo muitíssimo curioso nos sinais ambíguos desses dois primeiros meses de governo para além dos elogios rasgados à presidenta na mídia velha (que sempre tenta criar uma cisão nas relações pessoais da presidenta com o ex-presidente): todos os tucanos de carteirinha da elite paulista com quem conversei passaram a admirar Dilma. Falam com prazer inenarrável e com um olhar de alívio comovente sobre como esta mulher culta e respeitável está 'corrigindo' todos os erros do 'ex-operário atrevido' que se meteu a ser presidente. Enchem a boca pra falar do 'acerto' de não aumentar o salário mínimo, aplaudem o corte de 50 bilhões no orçamento e o fim da 'farra' de alimentar esses 'parasitas do funcionalismo público', de como ela é 'democrática' e respeita a 'imprensa livre no Brasil', diferente daquele' inculto que não lia jornais' e se orgulhava de ser 'analfabeto' e ainda por cima falava com 'blogueiros sujos.' Estão realmente felizes com o que eles vêem como sinal de reaproximação com o mundo civilizado (leia-se Estados Unidos) e não como fez o 'metalúrgico com o Irã e seus amigos ditadores'.
Eu ando com bastante saudades do Cara, particularmente de como ele compreendeu, embora muito tardiamente, que não se alimenta escorpiões, porque é da natureza desses nos picar as costas. Será que é por isso que a presidenta tem de pagar este ônus? Acompanhemos, pois de fato ainda é muito cedo para taxar Dilma como uma 'Obama de saias'.