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Rosângela Bittar: Valor Econômico, Via Vermelho
26 de Outubro de 2011 - 15h10
As marchas e recuos do calvário de Orlando Silva (PCdoB) no governo do PT provaram como um partido pequeno mas orgânico, com poucos recursos políticos mas densidade ideológica, pode se impor. São poucos, senão apenas dois, os que têm tais características no Brasil de hoje, e os comunistas estão reunidos em torno de uma dessas legendas.
Por Rosângela Bittar*
Orlando Silva já estava ferido de morte desde o primeiro instante da denúncia atirada contra ele. Fragilizou-se irremediavelmente com a autorização do Supremo Tribunal Federal para abertura de inquérito destinado a investigá-lo, num momento, como ontem, em que o Palácio do Planalto dava-lhe oxigênio e ainda tentava levar o público a se acostumar com a ideia de deixá-lo no cargo.
Houve justificativas para todo o agravamento de sua situação, principalmente para o despacho da ministra Cármem Lúcia, que desferiu o tiro de misericórdia. Até ela própria achou necessário esclarecer, depois da repercussão de sua decisão, que "abrir" (o inquérito) não significa "prosseguir" com ele, e que tudo dependeria do que o procurador-geral da República irá encontrar nas investigações. Não havia, porém, mais volta, a crise recrudesceu de repente.
No Palácio do Planalto, mencionava-se a diferença entre o caso Orlando e o caso Antonio Palocci, também sustentado por seu partido, o PT, que ficou quase um mês tentando equilibrar-se na cadeira de ministro da Casa Civil. Houve um momento de grande distensão da crise Palocci quando o procurador-geral deu despacho recusando a denúncia, e, sendo assim, sequer pediu autorização ao Supremo para abrir inquérito. Mesmo com isso não foi possível segurá-lo no cargo. No caso Orlando deu-se o inverso, o procurador aceitou a denúncia, pediu ao STF para abrir o inquérito e o Supremo, como foi pedido, o autorizou, levando mais tensão à crise. Se no caso anterior o ministro teve que sair apesar de libertado pelo procurador-geral, no caso Orlando, não dispensado, razão maior haveria para se ver defenestrado.
Nada disso, porém, absolutamente nenhuma argumentação, sensibilizou o PCdoB, que se manteve firme na estratégia política traçada de ficar unido em torno de seu representante no governo. E houve boa dose de racionalidade nessa decisão do partido.
O PCdoB manteve-se coeso no aguardo de iniciativas de que quem levou Mateus ao mundo. Ou seja, deixou o caso, seu desfecho e as soluções futuras integralmente nas mãos da presidente Dilma Rousseff, e nada fez para facilitar a arrumação política.
Os princípios dos comunistas têm nitidez. Em sucessivas reuniões nos últimos dias, o PCdoB avaliou minuciosamente a questão. O primeiro ponto do arrazoado é que Orlando Silva, alvo do PM João Dias, dono de ONG brasiliense que denunciou esquema de desvio de verbas no Ministério do Esporte, não viu nada ser provado contra ele. Toda a artilharia, então, foi redirecionada para o partido.
Sem as provas, a presidente Dilma Rousseff manteve seu apoio a Orlando Silva, como fez durante algum tempo com Palocci, Wagner Rossi, Alfredo Nascimento e Pedro Novais, os ministros do seu governo que depois caíram por denúncias de corrupção.
O PCdoB recusou-se, durante todo o período no pelourinho, a abandonar Orlando, a especular sobre substituição por outros nomes do próprio partido, ou a avançar em soluções que não considerou de sua alçada. Ontem, no momento de mais intensa pressão pela demissão do ministro do Esporte, agora politicamente inviabilizado pela decisão do Supremo, integrantes da cúpula partidária ainda desfaziam uma a uma as especulações sobre substituições. Manuela D'Ávila (RS) será candidata a prefeita em Porto Alegre; Aldo Arantes (GO) é um quadro importante mas não foi sondado; Aldo Rebelo (SP) não foi sondado; Flávio Dino (MA) não foi sondado. Luciana Santos e Jandira Feghalli, também citadas, não foram sondadas. E assim todo o PCdoB tinha ouvidos moucos.
"No PCdoB não tratamos de nomes, estamos apoiando o Orlando", foi o slogan partidário nos últimos dias de especulação. A estratégia estava fundamentada no fato de que, se o ministro saísse sem provas, ficaria carimbado como corrupto. E não houve voz dissonante ou divisão interna, como nas demais agremiações da base de apoio a Dilma.
As razões em torno de novas escolhas de substitutos davam menos consistência ainda às especulações e fortaleciam a estratégia do PCdoB. Por exemplo, dizia-se que Dilma escolheria Dino para resolver um problema do seu desafeto José Sarney nas eleições municipais de São Luis (MA), afastando-o de uma vitória certa no ano que vem; ou que escolheria Aldo Rebelo para afastá-lo da disputa da presidência da Câmara, não levando risco ao acordo de revezamento PT-PMDB. Se os partidos e esses políticos estivessem livres de perder seus lotes no governo como estão de a presidente Dilma levar em conta essas questões e estar pensando, no momento, em presidência da Câmara e prefeitura no Maranhão...
O PCdoB avaliou, em seus debates, que para a presidente a preocupação certa, e era a que ela estava manifestando, tinha relação com a Copa do Mundo e a Olimpíada, dois problemas de tamanho amazônico dos quais o governo tem que dar conta, e não está dando.
E, por último, talvez o mais importante a incentivar o partido a manter-se na rota, o PCdoB avaliou que a responsabilidade das irregularidades denunciadas estava muito definida, e longe do partido e de Orlando Silva. Este era apenas o secretário executivo, vindo de São Paulo para um Ministério dirigido, à época, por Agnelo Queiroz, atual governador de Brasília, que depois migrou do PCdoB para o PT. Foi ele quem levou o PM João Dias para o partido e que mantinha relações com as causas brasilienses do atual arrastão de denúncias.
Agnelo, no momento de fogo mais alto, estava em vilegiatura internacional atrás de exibições em estádio que constrói em Brasília. Não acusou ainda o golpe da abertura de inquérito no Supremo Tribunal Federal, como o PCdoB e Orlando Silva já acusaram, e que ocorreu exatamente no dia em que se declarava mais animado com as perspectivas futebolísticas da capital federal.
*Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília, do Valor Econômico
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