Qualquer solução simplória para o combate à violência urbana no Rio (e certamente em Salvador, Recife, nas periferias de São Paulo e outros centros urbanos tão violentos quanto os morros cariocas) é inócua além de ridícula.
Sem políticas públicas que atuem em várias frentes nada mudará: é preciso combater a corrupção policial e investir na reeducação desses policiais que indiferenciam bandidos de cidadãos e agem como justiceiros e não como policiais; é preciso a presença do poder público real e concreta, atuando nos prejuízos causados por governos que por mais de um século ignoraram a população pobre nos morros e permitiram a construção de um poder paralelo; é preciso fazer uso da inteligência policial e aplicar a Justiça aos bandidos do topo - os chefes das reais quadrilhas que não vivem nos morros, os que fazem quantidades absurdas de armas e drogas chegarem ao morro. É quase uma reivenção da sociedade: distribuir a renda, incluir, e, igualmente, distribuir cidadania, inclusive, reconhecendo que os pobres têm direito à Segurança Pública.
Foi o @cadulessa há pelo menos um ano que me chamou a atenção para as mudanças que vinham ocorrendo no Complexo do Alemão. Já naquela época ele apontava mudanças significativas e se mostrava otimista. Talvez isso aqui, aqui e na matéria que reproduzo abaixo, possamos entender o porquê de ao menos entre os mails e manifestações no twitter que recebi esses dias dos cariocas da minha timeline (e este grupo está longe de achar que pobre é bandido e tem de morrer) a maioria venha apoiando com otimismo e esperança as ações do Bope que vem ocorrendo no Rio. Eles também, sem perder o espírito crítico, têm uma impressão próxima à do ex-comandante do Bope, ou seja a de que as UPPs são sim diferentes e fazem diferença em relação à polícia bandida ou um exército bandido que sobem o morro pra entregar pra facção rival um rival ou as milícias e seus caveirões que apavoram os moradores das comunidades pobres do Rio.
Em mails e comentários no twitter vi professores de periferia que convivem com as crianças e adolescentes obrigados a viver no meio da guerra de um crime organizado cuja crueldade ultrapassa qualquer limite (seus rivais queimados em pilhas de pneus, cabeças decapitadas e expostas na rua tal qual um Tiradentes do século XXI, corpos abandonados dentro de carrinho de supermercado....) defendendo a ação do Bope e explicando que os eventos recentes no Rio são traficantes acuados que tentam reagir às mudanças que efetivamente estão ocorrendo com as UPPs.
Eles não enxergam essas ações como as de uma polícia assassina e corrupta que sobe o morro pra matar inocentes. As facções em guerra no Rio, quando invadem uma comunidade não vão só, seguem com sua clientela e expulsam moradores do morro invadido.
Outra coisa que me chamou muito a atenção: a gente não vê, nem nas cenas de guerra espetacularizadas pelas tevês brasileiras (que como diz o Gerson Carneiro conseguem fazer barulho até com uma bolinha de papel) os moradores revoltados com o Bope e moradores de favela carioca sempre resistiram à criminalização da polícia que os tratam como bandidos. Eles falam e denunciam abertamente a barbárie contante a que são submetidos pela violência policial.
Há informações que o corpo da UPPs são de novos policiais, com formação diferenciada, as UPPs já foram tratadas positivamente em matérias de jornais internacionais. Algo de novo parece que está efetivamente ocorrendo nas ações de Segurança Pública do Rio de Janeiro. Não há o romantismo na bandidagem como nos relata Celso Athayde e sua convivência com seu Rogério durante infância e adolescência.
E parece que, finalmente, o poder público no Rio de Janeiro (com o apoio do governo federal) abandonou as soluções simples: criminalizar e exterminar a população pobre. Se ações como as relatadas abaixo se espalharem por todas as comunidades do Rio, veremos os cariocas de todos os grupos sociais finalmente de posse de sua cidadania e com todas as condições para desfrutarem a cidade mais bela do mundo.
Lula: “Não há bandido que consiga vencer a dignidade” Do blog do Planalto 25/10/2010Presidente Lula cumprimenta moradores do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Foto: Ricardo Stuckert/PR
Para vencer o tráfico de drogas e a violência é preciso oferecer escola, saúde e emprego, “porque não há bandido que consiga vencer a dignidade, o povo trabalhador”, afirmou o presidente Lula nesta segunda-feira (25/10) em cerimônia de entrega de unidades habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. O presidente ressaltou que quando há respeito ao povo, quando não há distinção entre as pessoas pobres e ricas, é possível fazer as coisas melhorarem.
O filho de vocês agora pode estudar em uma escola com ar-condicionado. Isso não poderia continuar ser privilégio de poucos. Não pode o filho de um estudar com ar condicionado e o filho de outro não conseguir nem escrever pelo suor que escorria sobre o caderno. Isso não é favor, é reparação aos anos de descaso que o Rio de Janeiro teve em outros governos.
Ao falar sobre o Rio de Janeiro, o presidente foi enfático ao afirmar que é urgente tirar a cidade das páginas policiais, pois apesar de haver tráfico de drogas – e há em todos os lugares – a grande maioria da população é trabalhadora. Lula fez questão de elogiar a administração do governador reeleito Sérgio Cabral Filho, que tem trabalhado com afinco para fazer a cidade e o estado retomarem o caminho do crescimento, desenvolvimento e justiça social.
A gente tem que trabalhar para o Rio de Janeiro não aparecer nos jornais apenas nas páginas policiais; o Rio não é lugar só de traficante – isso tem em qualquer lugar. Nós temos que provar todo santo dia que a maioria do povo vive se seu trabalho, de seu suor e de seu salário… Só tem um jeito de as pessoas não serem molestadas: é trabalhar, serem honestas, como todo mundo aqui no Rio faz. Ouça aqui a íntegra do discurso:
As 582 moradias fazem parte do programa Minha Casa, Minha Vida e foram entregues, gratuitamente, a famílias com renda de zero a três salários mínimos. As unidades habitacionais fazem parte dos condomínios Jardim das Acácias e Palmeiras, cada um com 291 residências. Distribuídas em 13 blocos de quatro andares, as moradias têm área de 44,90 m2 a 50,61 m2, dois quartos, sala, banheiro e cozinha. Os condomínios também contam com área de lazer, salão de festas, praça de esportes e churrasqueira.
Logo depois, o presidente Lula foi a Manguinhos, também no Rio de Janeiro, entregar outro lote de apartamentos do programa Minha Casa, Minha Vida, que integra um amplo projeto de intervenção na comunidade, com saneamento e urbanização de assentamentos precários. Durante a cerimônia foram assinados novos contratos, que financiarão 440 unidades habitacionais para famílias com renda de três a seis salários mínimos, e quatro condomínios para famílias com renda de zero a três salários mínimos, totalizando 1.260 unidades habitacionais. Ouça aqui o discurso do presidente Lula em Manguinhos: