Mesmo sem ter oficialmente entre seus eixos temáticos a questão da “comunicação”, a 2ª Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Conapir) debateu a urgência de políticas públicas de corte racial para o setor. A ausência de um espaço oficial na Conappir - sentida pelos participantes e cobrada da organização do evento - não impediu que jornalistas, comunicadores, ativistas e movimentos sociais negros conseguissem pautar o tema na Conferência.
Em reunião com o ministro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Edson Santos, eles defenderam a criação de um grupo de trabalho para formular ações governamentais sobre comunicação e igualdade racial. Diante das propostas apresentadas, Santos se comprometeu a avaliar a possibilidade de implantar uma instância com o papel de trabalhar questões relacionadas à comunicação.
A inexistência de cobertura da grande mídia comercial sobre os quatro dias de debates e os recentes editoriais contrários às políticas de cotas causaram indignação nos presentes e levantaram no evento a reflexão sobre a invisibilidade característica do tratamento dado à população negra nos meios de comunicação.
Convidado para a programação cultural da conferência, o rapper Mano Brown, do grupo Racionais MC´s, protestou contra o discurso da imprensa sobre as cotas nas universidades. “O estudante da cota não deve ser visto como um beneficiado. Tem que ser visto como um cara que trabalhou muito e não foi indenizado pelos direitos. Não como quem vai receber esmola do patrão”, defendeu Brown.
No painel temático sobre saúde, a jornalista Kelly Quirino, de Bauru (SP), chamou a atenção para a falta de cobertura jornalística a respeito da saúde da população negra. “O movimento negro tem um trabalho de longa data na questão de saúde e isso não é pautado nos jornais. Não encontro matérias sobre doenças prevalentes na população negra, como anemina falciforme e mioma uterino”, destacou Kelly, que faz mestrado em Comunicação Midiática na Universidade Estadual Paulista (UNESP).
A presidente do Geledés - Instituto da Mulher Negra, Nilza Iraci, lembrou que o Brasil não cumpre recomendações internacionais (como a Declaração e o Plano de Ação de Durban) no sentido de incorporar os meios de comunicação nas políticas de combate ao racismo: “temos feito pesquisas sobre isso e constatamos que a mídia brasileira invisibiliza a mulher negra e adota um discurso que contribui para a persistência do racismo e da intolerância religiosa”, disse.
Enegrecer a Confecom
Frente a este quadro, ativistas envolvidos com a temática defenderam a participação dos movimentos e entidades negros e da Seppir no processo de organização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), cuja etapa nacional está marcada para dezembro deste ano em Brasília.
A atuação da secretaria neste processo foi um dos principais pleitos na moção apresentada pelas Comissões de Jornalistas pela Igualdade racial (Cojiras) ao plenário do evento. De acordo com o coordenador da Cojira-DF, Sionei Leão, o objetivo principal é garantir espaço para o debate de temas como: racismo, homofobia e intolerância religiosa nos meios de comunicação e regularização de rádios comunitárias quilombolas, negras, indígenas e ciganas, além da aplicação nos cursos de comunicação da lei 11.645/08 (Lei de Inclusão da História e Cultura Afro-brasileira, Africana e Indígena nos Currículos Escolares).
“Já foram autorizadas 60 rádios comunitárias em áreas quilombolas, mas temos dificuldade em garantir o funcionamento delas. É necessária uma política de apoio a essas rádios, que têm um papel fundamental na divulgação de informações de utilidade pública nas comunidades”, ressaltou Josué Franco Lopes, comunicador negro, representante da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) e integrante da Comissão Organizadora Nacional da Confecom.
O jornalista Dojival Vieira, editor da Afropress (Agência de Informação Multiétnica), chamou a atenção para a necessidade de investimento público na imprensa alternativa que prioriza o tema igualdade racial. “O governo federal tem aumentado a distribuição de recursos para a mídia regional e, ainda assim, esses recursos não chegam para nós. A mídia étnica anti-racista deve ser priorizada dentro de uma política pública de combate ao racismo. A Seppir precisa se envolver nisso”, reclamou Dojival.
Para “enegrecer” a Confecom, a presidente do Sindicato de Jornalistas de Alagoas e integrante da Cojira-AL, Valdice Gomes, defendeu que os comunicadores e movimentos sociais negros se mobilizem para garantir a participação, como delegados, nas etapas estaduais e nacional. “Precisamos chegar com força nas estaduais, pautar o debate e exigir que ele seja feito, ainda que de maneira transversal, na Conferência Nacional”, afirmou Valdice.
Apoio governamental
Na abertura da 2ª Conapir, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Luiz Dulci, ressaltou a importância da Conferência Nacional de Comunicação e reconheceu que ela se tornou realidade a partir da “contribuição de vários setores do movimento negro”.
O ministro da Seppir, Edson Santos, em coletiva à imprensa, disse que tem dialogado com o Ministério das Comunicações no sentido de garantir a regularização de rádios comunitárias em áreas quilombolas. Santos também revelou ter se reunido recentemente com a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert) para reivindicar uma cobertura mais parcial da política de cotas. “É fundamental que essa cobertura permita à sociedade brasileira formar sua própria avaliação sobre essa política”, defendeu o ministro.
Participe
Para fazer parte da mobilização em defesa de uma política pública de comunicação para a igualdade racial, envie seus contatos para o e-mail // cojiras@gmail.com
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. Comunicadores, ativistas e entidades negras interessadas em subescrever a moção dos participantes da 2ª Conapir devem acessar www.abaixoassinado.org/abaixoassinados/4592. O texto será apreciado pelo Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial (CNPIR), em agosto. |