Humanismo, esta é a real tradição hebraica

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Nota do PT condenando as ações genocidas de Israel em Gaza provoca reações externas e internas. Abaixo dois artigos respondem a esta reação e a meu ver vale conhecê-los.

Carta aos companheiros críticos da Nota do PT


Por Max Altman

Permitam-me uma digressão. Grande parte dos meus quase 72 anos dediquei ao exame e à militância ativa por uma paz justa e duradoura entre Israel e os países árabes. Os judeus progressistas e de esquerda saudaram a decisão das Nações Unidas em 1947 que resultou na Partilha da Palestina. Apoiaram vivamente as lutas pela Independência de Israel, em 1948, a um tempo que condenavam duramente o massacre terrorista de Deir Yassin perpetrado pelos grupos israelenses Irgun e Stern, bem como a tentativa das monarquias árabes de sufocar militarmente o nascente Estado. Deixaram de apoiar o governo de Israel quando no início dos anos 1950 resolveu atrelar sua política aos interesses geoestratégicos dos Estados Unidos na região. Anos mais tarde, em 1982, já como presidente da associação mantenedora da Escola Scholem Aleichem e dirigente da Casa do Povo, entidades judaicas progressistas, ajudei a organizar o ato público e pronunciei o discurso central de condenação à chacina de Sabra e Chatila de setembro de 1982. Durante a I Guerra do Líbano, uma milícia de libaneses cristãos, sob os auspícios do exército de Israel, massacrou milhares de refugiados palestinos, encurralados num campo de refugiados, homens, mulheres, crianças e velhos, sob os olhares complacentes dos generais. O recentíssimo e premiado filme israelense “Waltz with Bashir” narra essa atrocidade com acuidade meticulosa, sem omitir a participação de israelenses. A manifestação reuniu mais de duas mil pessoas. A reação de setores da direita da comunidade judaica foi jogar gasolina no meio-fio, atear fogo que correu ladeira abaixo queimando pneus de carros ali estacionados.


Em meados dos anos 1990, já membro do coletivo da Secretaria de Relações Internacionais, respeitando criteriosamente as teses defendidas pelo Partido a respeito, ajudamos a fundar, organizar e dirigir o Movimento Shalom Salam Paz que se constituiu em Ong em setembro de 2000. Esse movimento congregava brasileiros de ascendência judaica, sionistas e não sionistas, de esquerda e centro-esquerda, brasileiros de ascendência árabe, moderados e menos moderados, os de ascendência palestina e todos aqueles dispostos a lutar por uma paz justa e duradoura no Oriente Médio e em particular, entre Israel e os palestinos. Foi extremamente difícil conciliar as posições, houve pressão das Federações judaica e árabe e do consulado de Israel, porém conseguiu-se aprovar os pontos básicos: desocupação dos territórios palestinos ocupados com a Guerra de 1967; respeito à Resolução 242 das Nações Unidas com o reconhecimento pelos palestinos do Estado de Israel com fronteiras demarcadas, reconhecidas internacionalmente, seguras e definitivas; criação do Estado palestino, laico e viável; estabelecimento de Jerusalém leste e oeste como capital de ambas as nações; reconhecimento do direito de retorno dentro de limites a serem acordados; direito de acesso à água definidos em acordo binacional; facilidade do direito de ir e vir e do comércio binacional. Forças internacionais sob a égide da ONU garantiriam o cumprimento das decisões. O Shalom Salam Paz levou essas idéias a dezenas de faculdades e colégios, a diversas instituições, deu dezenas de entrevistas a jornais, rádios e televisões, participou de debates, esteve presente nos Fóruns Sociais Mundiais e foi fundamental na organização de um grande ato público na sede do Partido em plena campanha eleitoral de 2002, com a presença de lideranças das comunidades judaica, palestina e árabe, assim como artistas dessas comunidades.
Uma diabólica espiral de sangue e dor, com raros interregnos, tomou conta da região nos últimos 60 anos. Guerras convencionais, ações terroristas e retaliações terroristas sem fim e com teor cada vez mais cruel e aterrador atingindo pessoas inocentes, governos árabes massacrando palestinos, assassinato de Rabin, negociações de paz torpedeadas ao sabor de interesses estratégicos e de poder, massacre de Munique e chacina de Jenin, intifada um e dois, quando ainda não existiam os foguetes Qassam e as armas eram pedras, homens-bombas explodindo seus corpos em restaurantes, tréguas e cessar-fogos violados a qualquer pretexto.

Esse é o quadro. E qual é a causa? Desde 1948, os palestinos estão condenados a viver submetidos a uma revoltante humilhação. Perderam suas terras, perderam a liberdade e nunca puderam formar e organizar seu Estado. Hoje o cerco se estreitou e se tornou cruel. Sem permissão, não têm acesso à água, a alimentos, a medicamentos. Não têm em pregos nem vida econômica normal. Não podem ir de Gaza à Cisjordânia, seus dois pedaços de terra. Não lhes permitem circular extramuros sem passar por vexaminosos controles. Gaza se transformou numa prisão quando seus habitantes votaram em quem seus vizinhos acharam que não deveriam ter votado.

A Palestina hoje é muito menor que a que sobrou da Guerra dos Seis Dias. Colônias são assentadas em suas terras e atrás vêm os soldados corrigindo a fronteira. Se há resistência, apela-se para a legítima defesa. Se os assentamentos não são suficientes, que se erga um muro comendo mais pedaços de terra. Se olharmos comparativamente os mapas vemos que pouca Palestina restou.
Israel não costuma cumprir as resoluções das Nações Unidas e conta para isso com o respaldo dos Estados Unidos. Não acata as sentenças dos tribunais internacionais e viola com freqüência a Convenção de Genebra que regula atos de guerra. Israel é uma potência militar, suas forças armadas são bem treinadas e dispõem de armamentos modernos e sofisticados, capazes de manter a incolumidade do país. Mas não podem estar a serviço dos sucessivos governos israelenses que adotaram a estratégia belicista para impor à região seus objetivos políticos. Sabemos que a atual composição do eleitorado israelense levará ao governo líderes que abraçam a solução bélica. Se de um lado, moralmente, não pode um povo que ao longo da história sofreu o que sofreu impor a outro povo sofrimentos que teve de sofrer, de outro, só a pressão dos povos e da comunidade internacional poderá levar as partes a uma séria mesa de negociações. Geograficamente – e isto é ineludível – Israel é território do Oriente Médio, tendo como vizinhos em todas as direções países árabes. Não é possível sentar-se o tempo todo sobre a ponta da baioneta, ao preço de transformar a nação numa simples fortaleza. Inexoravelmente, vai ter de conviver no futuro, e pacificamente, com seus vizinhos.

Contudo, a comunidade internacional deve abandonar os discursos vazios, as declarações ardilosas, a indiferença, as manifestações altissonantes, comportamentos ambíguos que servem de amparo à impunidade. Que os países árabes deixem de lavar as mãos. Que países europeus, que durante séculos costumavam praticar a caça aos judeus e há décadas passaram a cobrar essa dívida histórica dos palestinos, ponham de lado a hipocrisia de derramar umas tantas lágrimas enquanto celebram secretamente outro lance de mestre. E que os Estados Unidos, sob nova direção, deixem a parcialidade e ajudem a construir a paz justa entre Israel e palestinos, que seguramente servirá para estendê-la a outros rincões.

O Partido dos Trabalhadores historicamente defendeu a coexistência pacífica dos povos, mas jamais a coexistência pacífica entre opressor e oprimido, entre ocupante e ocupado. Esteve ao lado dos timorenses contra o ocupante indonésio, ao lado do povo negro da África do Sul contra os opressores do Apartheid. E estaria ao lado da resistência argelina contra o ocupante colonial francês se àquela época existisse.

O PT quis manifestar toda a sua indignação contra os ataques do exército de Israel, que se reivindica capaz de operações cirúrgicas, contra alvos civis, escolas e hospitais que ostentavam bandeiras da ONU, provocando terríveis mortes de crianças, mulheres e anciãos inocentes. E ressaltou, para por em evidência a crueldade da injustificável ação, que ataques em retaliação contra civis era prática do exército nazista. O exército israelense, o mais moderno e sofisticado do mundo, sabe divisar bem o objetivo. As vítimas civis são chamadas de danos colaterais. Em Gaza, de cada dez danos colaterais, três são de crianças. Não há guerra agressiva que o agressor não diga ser guerra defensiva. Bush invadiu o Iraque para evitar que o Iraque invadisse todo o Oriente Médio.

Por que pretender que numa nota sobre acontecimento gravíssimo e pontual, o PT deva abrandar a condenação para repisar sua histórica condenação ao terrorismo e a defesa da existência de Israel dentro de fronteiras seguras e reconhecidas? Lembro-me que durante a campanha presidencial de 2002, Lula seria recebido pela comunidade islâmica numa multitudinária concentração num restaurante de São Bernardo. Tivemos oportunidade de antes trocar idéias com Lula. Naqueles dias tinham ocorrido atos de terrorismo e retaliações terroristas. Em seu discurso, Lula reafirmou seu apoio à causa palestina, à constituição de um Estado viável, laico e reconhecido ao mesmo tempo em que ratificou a condenação ao terrorismo e a defesa da existência do Estado de Israel. E o mesmo fez, semanas depois, numa concentração no clube A Hebraica.
Não é preciso insistir com os companheiros firmantes da carta ao presidente Berzoini, alguns com altas posições dentro do governo, outros no exercício de sua militância, que o governo lida com questões de Estado e o partido opera no plano programático, político e ideológico. Nem por isso, Lula evitou tratar o ataque a Gaza como “chacina”, o assessor especial Marco Aurélio Garcia como “terrorismo de Estado” e o ministro Amorim como “agressão injustificável”.
O Partido dos Trabalhadores tem relações de camaradagem com partidos e organizações de esquerda, de centro-esquerda e progressistas de todo o mundo, inclusive de Israel. As pontes que deseja construir e manter devem ser alicerçadas em princípios comuns, de soberania, de autodeterminação dos povos, de relações fraternais entre povos e nações, de solução pacífica e justa para os confrontos internacionais. Dizer a verdade em momentos cruciais, manifestar indignação quando princípios fundamentais são violados, ajuda a construir entendimento. A dissimulação jamais contribui para uma concertação sólida.

Sem surpresa leio que os principais porta-vozes da direitona em nosso país, opositores raivosos do governo Lula e do nosso partido, defendem pontos de vista opostos ao expresso na Nota do PT e brandem em seu apoio a carta ao companheiro Berzoini. Com surpresa recebi mensagem eletrônica de um representante da organização sionista Bnei Brit, em resposta a observações que fiz ao BBPress, que, à parte, conclui com o seguinte: “No anexo para assinatura e posterior envio para a Clara Ant do Documento de desacordo de Militantes do PT à nota do Partido.”

Tomei conhecimento da Carta ao presidente nacional do PT pela Folha de sábado, 17 de janeiro. Cruel ironia, bem ao lado, estava estampada uma matéria que relatava o desespero do médico palestino que trab alhou num hospital de Israel, Deen Aboul Aish, cujas três filhas foram mortas por disparo de um tanque israelense: “Minhas meninas estavam sentadas em casa planejando seu futuro e, de repente, foram bombardeadas”, disse em hebraico o ginecologista. O Exército disse que a casa de Aish foi atingida porque um franco-atirador disparou do local. Aos prantos, respondeu: “Tudo o que foi disparado de minha casa foi amor, abraços e atos de paz.”

Max Altman é do coletivo da Secretaria de Relações Internacionais do PT

Fonte: PT.org


20/01/2009 - 13:24
Calma, companheiros

por Mohamed Habib

É bom ter sempre vivo na memória os registros daquilo que se passa em nossas vidas. Lembro–me muito bem da reunião do DN do nosso PT, por ocasião da campanha Lula Presidente para o primeiro mandato, em 2002, quando o partido precisava se posicionar em relação ao conflito palestino israelense no seu programa de governo. Dois intelectuais petistas, cada um representando um dos dois lados envolvidos no conflito, foram convidados para debater a questão naquela reunião, criando, assim, as condições propícias para o DN definir a posição partidária. Na mesma reunião haviam convidados não petistas ocupando as primeiras fileiras do auditório, representando a comunidade e as instituições judaicas brasileiras. Não havia convidados representando as comunidades árabes.
Os intelectuais petistas convidados para o debate foram: o Prof. Dr. Paul Singer (Titular da USP) e eu assinante deste artigo (Titular da UNICAMP). Fui o primeiro a expor a minha posição, na qual, resumidamente, e sem relatar o histórico do conflito, terminei dizendo: “Sou totalmente favorável e defensor de que cada criança israelense tenha o direito de nascer e crescer numa pátria livre, autônoma e independente, vivendo em paz e harmonia dentro de seu país, o qual deve ser respeitado e harmonicamente relacionado com os seus vizinhos. E, com a mesma ênfase, sou totalmente favorável e defensor de que todas as crianças palestinas tenham o direito de nascer e crescer numa pátria livre, autônoma e independente, vivendo em paz e harmonia dentro de seu país, o qual deve ser respeitado e harmonicamente relacionado com os seus vizinhos. Assim sendo, defendo a criação de dois estados vizinhos, um israelense e outro palestino, através de um processo coordenado e monitorado pelos organismos internacionais”.

O meu colega na academia e companheiro no partido, Prof. Paul Singer, declarou a sua total concordância com a minha posição acima escrita e recomendou que essa deveria ser a posição do partido, o que de fato aconteceu. O partido assumiu essa posição no seu plano de governo.

Posso até entender que o nosso governo petista possa flexibilizar posições de programas e até contrariar outras posições como, por exemplo, no caso dos transgênicos, que no programa somos contra, porém, os companheiros do governo, através de medidas provisórias e com os votos dos aliados da base de apoio do governo no Congresso, aprovaram em definitivo o cultivo e a comercialização desses produtos, cedendo às pressões das multinacionais e de seus lobistas. Entretanto, como partido, a mudança programática nunca deve acontecer, e a militância deve continuar preservando os princípios do partido, quando se tratar da defesa da dignidade humana, da democracia e do respeito aos direitos humanos. Senão, seremos apenas uma legenda de aluguel, para não chamar de outra coisa.

No período de mais de seis anos do governo Lula, assistimos a freqüentes conflitos de pequenas dimensões entre israelenses e árabes. No entanto, dois foram dramáticos. Em julho de 2006, o sul do Líbano foi invadido pelo exército israelense. Foram mais de mil mortos, a maioria civis, crian ças, mulheres e velhos. Os refugiados que abandonaram as suas cidades, ultrapassaram um milhão de pessoas. Israel destruiu totalmente a infra-estrutura do sul do Líbano, como pontes, estradas, estações geradoras de energia, outras de tratamento de água, reservatórios de petróleo, escolas, hospitais e centenas de prédios residenciais. O cessar fogo chegou 33 dias após a invasão, através da Resolução do Conselho de Segurança da ONU (número 1701), porém a desocupação concretizou-se 45 dias após a Resolução. Israel não foi punido, como sempre, e sequer pagou um centavo de indenização. É a lei do mais poderoso.

O segundo conflito é o atual massacre que os palestinos da faixa de Gaza sofrem desde o dia 27/12/2008. Hoje, e após 23 dias, Israel perdeu 13 soldados e 3 civis; Gaza, por outro lado, perdeu mais de 1250 palestinos, além de mais de 5500 feridos. É a política da terra arrasada: milhares de prédios totalmente destruídos, abastecimento de água e de energia cortados e todas as entradas bloqueadas. Escolas, hospitais e até instalações da ONU foram impiedosamente bombardeadas. A superioridade militar de Israel foi empregada visando aniquilar a população de Gaza. Trata-se de um verdadeiro genocídio. Israel decidiu pelo cessar fogo unilateral. Porém, continua ocupando com os seus tanques e soldados toda a cidade e todos os povoados de Gaza, prontos para voltar a massacrar a população civil, incluindo as crianças, caso os grupos de resistência à ocupação tentarem revidar a invasão, num total desrespeito à dignidade e à inteligência humana.

Pergunta-se: por que tudo isso? A resposta de Theodor Herzl, o pai intelectual do sionismo, está no seu livro “O ESTADO JUDEU”, publicado em 1896. Pode-se, também, perguntar à Organização Sionista Mundial (OSM), criada em 1897, que decidiu com enorme precisão pela criação de um estado judeu na Palestina no prazo de 50 anos. Que precisão! Mas que precisão? A Resolução 181 da ONU, de 29 / 11/ 1947, concedendo 53% da Palestina à comunidade judaica para a criação do Estado de Israel, enquanto o restante (47%) seria suficiente para os palestinos, foi aprovada, exatamente, 50 anos após. Foram 33 votos favoráveis, 30 contra e 3 abstenções. A Palestina na época contava com 30% judeus, a maioria absoluta de imigrantes recém chegados, e 70% de nativos palestinos.

Outros acontecimentos históricos devem ser resgatados para que os nossos companheiros possam analisar o quanto foram precipitados ao criticar a nota do partido. Ano de 1917, em que o Ministro do Exterior da Inglaterra, Artur Balfour, em apoio à comunidade judaica, conseguiu aprovar no Congresso britânico a sua proposta de apoiar o projeto sionista de criação de um estado judeu na Palestina. A manifestação ganhou, desde então, o rótulo de “Declaração Balfour”.

Uma outra data é 1922, quando a Liga das Nações aprovou o “mandato britânico na Palestina”, nome pomposo e um eufemismo para uma ocupação militar daquele país. E os britânicos anunciaram que sairiam da Palestina no prazo de duas décadas; até lá os palestinos estariam em boas condições para, autonomamente, governar o seu país. Mesmo sob a ocupação britânica, milhares e milhares de palestinos eram massacrados e outros expulsos das suas cidades e aldeias. Os registros históricos dos anos 1930 e 1940 sobre a ação do governo britânico e a formação de campos de refugiados no sul do Líbano, na Jordânia e na Faixa de Gaza, falam por si. Os grupos armados Irgun, Haganah e Stern Gangs, tanto quanto a Agência Judaica por Israel (AJI), foram considerados pelo governo britânico, no dia 24 de julho de 1946, como organizações terroristas, devido aos massacres e à expulsão de palestinos de seus lares, cidades e lavouras.

Os nossos companheiros precisam lembrar que a ocupação militar inglesa durou até 14 de maio 1948, um dia antes da proclamação do estado de Israel, para que logo em seguida começasse o plano governamental israelense de limpeza étnica e total eliminação do povo palestino, ou pela expulsão ou pelo extermínio. Tanto a direita quanto à esquerda israelense concordam com isto. A diferença entre eles está nas dimensões do Estado judeu. Enquanto a esquerda se contenta com a Palestina, a direita quer um país maior, cobrindo a área entre os rios Nilo e Eufrates.

Desde 1967 até hoje, a área sobre a qual o estado israelense está instalado equivale a 78% da original Palestina. E, ainda desde a mesma data, o restante (22%), onde, hoje, vivem os palestinos, é ocupado militarmente pelo exército israelense, e os massacres nunca pararam. Esses territórios palestinos são chamados pela ONU de “territórios palestinos ocupados”. O pior é que essa porcentagem de 22%, onde os palestinos “vivem” é dividida em duas áreas totalmente isoladas uma da outra, sem nenhum contato. O palestino não tem o direito de se deslocar de uma área para outra para visitar os seus familiares. Ainda mais: cada uma dessas duas áreas recebeu dezenas de assentamentos e colônias, que pela “lei” israelense se tornam territórios israelenses, com estradas que se interligam e que são, também, considerados territórios israelenses, onde o palestino não pode pisar e muito menos atravessar. Resultado: o povo palestino está totalmente fragmentado, sem infra-estrutura mínima, sem exército e sem autonomia; enfim, uma nação em que a vida de seus habitantes não vale mais nada. Mas como a dignidade ainda não foi atingida. Essa vida, que não vale mais nada, começa a ser usada nos momentos de desespero até mesmo como veículo explosivo contra alvos israelenses.
Ao longo das décadas, a tática é a mesma: efetuar, periodicamente, uma grande ofensiva; o mundo assusta-se, mas esquece de discutir o conflito desde o seu início e tenta resolver apenas essa nova situação. Israel abre mão de uma parte do território conquistado na ofensiva, e, injustamente, conquista outro. Hoje está acontecendo a mesma coisa.

Israel também firma acordos bilaterais com governantes árabes. A cláusula principal determina o não envolvimento destes em qualquer conflito entre Israel e os palestinos. É isto que deixa o Egito, além de vários outros países, com as mãos amarradas, sem poder fazer absolutamente nada diante de cada operação de massacre que os palestinos sofram. Uma situação parecida acontece em outras regiões do mundo, inclusive aq ui, na América do Sul. São as assinaturas de acordos contra terrorismo, racismo e anti-semitismo. Se alguém criticar, a posteriori, qualquer agressão israelense contra palestinos, é imediatamente taxado de anti-semita. Intelectuais judeus e árabes que se opõem à política israelense são taxados de anti-semitas, como por exemplo, Robert Fisk, Noam Chomsky, Ilan Pappe, Eduard Said e muitos vários outros.

Estamos falando de dois povos: um invadido e ocupado militarmente pelo outro. Um tem o 4º exército mais forte e mais equipado do planeta. O outro nem exército tem. Um tem armas nucleares, aviões F-16, tanques e helicópteros militares de última geração. O outro sequer granada manual pode ter. Um usa armas, inclusive químicas proibidas pela lei internacional, o outro usa foguetes artesanais fabricados nos seus quintais de casas. Os grupos populares palestinos de resistência à ocupação estão sendo chamados pelo governo sionista, lamentavelmente, de terroristas. Parece-me que o estado israelense quer convencer o mundo de que os palestinos não podem ter o direito de se defender da violência e da barbárie, e sim a obrigação de morrer em silêncio. Aliás, sob o som dos bombardeios e dos mísseis israelenses, porém sem reclamar.

É mais um crime de guerra que o estado sionista vem cometendo para manchar, cada vez mais, a sua história e levar qualquer cidadão comum a perguntar: é possível que um povo que sofreu com o Holocausto nazista da Alemanha permita que os seus governantes cometam crimes semelhantes contra crianças e civis indefesos de um outro povo?

Faço uso das palavras do companheiro Valter Pomar, por ocasião da sua resposta aos 36 companheiros que criticaram a nota do partido, dizendo: “A nota do PT limita-se a apontar um fato: o exército nazista ficou conhecido por retaliar civis. E matar civis, mesmo numa guerra, não pode ser considerado algo "banal". Quem "banaliza" a violência é quem aprova, silencia, ou tergiversa sobre o que se passa em Gaza.”.

Manifestantes carregam charge do brasileiro Laruff em protesto contra a ofensiva israelense em Gaza. Lahore, Paquistão, 20 Jan de 2009.

Mais uma página da história da humanidade está sendo escrita, hoje com o sangue palestino. Os nossos 36 companheiros petistas, independentemente dos motivos que os levaram a criticar a nota do partido, precisam lembrar de que, hoje, é muito difícil ocultar os crimes que estão sendo cometidos pelo estado de Israel, e que a sociedade civil, inclusive a brasileira, está acompanhando o nosso comportamento, sejamos parlamentares, governistas ou mesmo assessores. E, sempre, um amanhã se tornará um hoje.

Mohamed Habib é militante do PT e professor da Unicamp

Fonte PT.org