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Texto de Flávia Simas
O fim de semana passado foi marcado em todo mundo pela luta pelo direito ao aborto seguro. Embora a situação continue catastrófica em muitos países (alguns deles com a situação absurdamente brutal, vide El Salvador), há uma luz no fim do túnel, uma centelha de esperança, vinda diretamente da África, de um país lusófono como nós: Moçambique.
Foi aprovada no parlamento de Moçambique, ainda em julho deste ano, uma nova lei que garante o direito das mulheres ao aborto seguro, e isso coloca o país como a quarta nação africana a assegurar que as mulheres tenham completa soberania sobre seus corpos (os outros países são Cabo Verde, África do Sul e Tunísia). A lei precisa apenas ser promulgada pelo presidente Guebuza, o que (espera-se) ocorrerá antes do fim de seu mandato.
A aprovação de tal legislação é extremamente importante, tendo em vista o fato de que na África estima-se que cerca de 1.7 milhões de mulheres são internadas todos os anos com complicações decorrentes de aborto clandestino (dados da OMS). Dessa forma, Moçambique passa a ser uma nação pioneira no reconhecimento do direito ao aborto como um direito humano e, mesmo que ainda haja entraves (especialmente em áreas rurais onde os profissionais de saúde podem se negar a realizar o procedimento, à revelia do que está na lei), as mulheres do país possuem um grande motivo para comemorar.
Em linhas gerais, a lei prevê que a mulher tem direito ao aborto seguro até 12 semanas de gestação, e apenas precisa dar seu consentimento ao médico para ter o procedimento realizado em um hospital. Quando tratar-se de menor de idade, os pais precisarão consentir por ela. Estão previstos também os casos de estupro e má-formações que tornariam a vida inviável no pós-parto. Leia abaixo, na íntegra, os dados de um folheto divulgado pela Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos:
Sabia que?
Existe uma nova lei aprovada em Moc?ambique que permite realizar um aborto seguro?
O aborto inseguro tem contribui?do para a morte de muitas mulheres e raparigas, ou para a sua incapacidade reprodutiva, em todo o pai?s. Alia?s, e? um dos factores que tem concorrido para o aumento da mortalidade materna em Moc?ambique.
Quando e? que os abortos na?o sa?o permitidos?
Quando sa?o praticados fora das unidades sanita?rias, por pessoal na?o profissional e sem o consentimento da mulher. Por exemplo, mesmo que um enfermeiro ou me?dico pratique uma interrupc?a?o volunta?ria da gravidez, esse acto me?dico e? ilegal se ocorrer fora das unidades sanita?rias.
Quando e? que se pode praticar legalmente o aborto?
Pelo Artigo 168 (Aborto na?o puni?vel) do Co?digo Penal, “Na?o e? puni?vel o aborto efectuado por me?dico ou outro profissional de sau?de habilitado para o efeito, ou sob a sua direcc?a?o, em estabelecimento de sau?de oficial ou oficialmente reconhecido e com o consentimento da mulher gra?vida”.
As condic?o?es para se efectuar um aborto legal sa?o as seguintes:
1. Constituir o u?nico meio de remover o perigo de morte ou de grave e irreversi?vel lesa?o para a sau?de fi?sica, psi?quica ou mental da mulher gra?vida;
2. Se mostrar indicada para evitar leso?es graves ou perigo de morte ou for realizado nas primeiras doze semanas de gravidez;
3. Houver seguros motivos para prever que o nascituro vira? a sofrer, de forma incura?vel, de doenc?a grave ou malformac?o?es congênitas, e for efectuado nas primeiras vinte e quatro semanas de gravidez, comprovadas por ecografia ou por outro meio adequado, segundo as normas da profissa?o e da cie?ncia me?dica;
4. O feto for invia?vel;
For recomenda?vel, em caso de doenc?a;
A gravidez tenha resultado de crime de violac?a?o sexual ou de relac?a?o de incesto, e o aborto tenha lugar nas primeiras dezesseis semanas.
A mulher deve consentir para que se efectue o aborto
De acordo com a lei, o consentimento sera? prestado:
Em documento assinado pela mulher gra?vida ou a seu pedido e, sempre que possi?vel, com a antecede?ncia mi?nima de tre?s dias relativamente a? data da intervenc?a?o;
Sendo a mulher gra?vida menor de dezaeseis anos ou psiquicamente incapaz, respectiva e sucessivamente, consoante os casos, pelo representante legal, por ascendente ou descendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes da linha colateral.
A lei tambe?m garante que:
“Na?o e? puni?vel o aborto efectuado por me?dico ou outro profissional de sau?de habilitado para o efeito, ou sob a sua direcc?a?o, em estabelecimento de sau?de oficialmente reconhecido e com o consentimento da mulher, quando for praticado nas primeiras doze semanas de gravidez”.
Nestes casos na?o se dispensa o consentimento da mulher ou, se for menor, dos seus representantes legais.
O Ministe?rio da Sau?de garantira? condic?o?es para que, quando o Co?digo Penal entrar em vigor, as mulheres que necessitarem de realizar um aborto possam beneficiar-se de servic?os seguros e de confianc?a, que na?o ponham em risco a sua vida ou a sua sau?de.
Eliminemos o aborto inseguro!
Salvemos as vidas de muitas mulheres e raparigas!
O link para o site da organização pode ser encontrado aqui.
As fotos desse post foram retiradas de reportagem em inglês, que pode ser lida aqui.
*Aborto legal, seguro e gratuito não é apenas direito das mulheres, homens trans e pessoas não binárias com útero também podem engravidar. A reivindicação é para todas essas pessoas. E nem todas as mulheres podem engravidar e tem útero.