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Será que Geraldo Alckmin aguenta o tranco de ser vice de Lula?

Sem a blindagem do PSDB, ex-governador será investigado como nunca foi; nesta semana os jornais já requentaram denúncia antiga

Geraldo Alckmin em campanha à presidência pelo PSDB em 2018. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Foram variadas as reações quando se começou a cogitar a escolha de Geraldo Alckmin para vice na chapa de Lula nas eleições de outubro. Houve quem aceitasse de bom grado como uma estratégia para unir setores em torno da derrota de Bolsonaro; houve rejeição à escolha dentro do próprio PT, diante do passado do ex-governador e do sentimento de que ele, ao contrário do que pensa Lula, não agregaria votos; houve quem, como os bolsonaristas e os ciristas, cobrassem "coerência" dos petistas por se juntarem a quem tanto criticaram no passado; e houve ainda quem o associasse ao golpe sofrido por Dilma Rousseff em 2016, temendo que a História se repita.

Experiente, o ex-tucano sabe que a artilharia midiática e judicial estará toda em sua direção ao dizer "sim" a Lula. Se aceitar a vice, aceita também o desafio de não ser abatido em pleno vôo, porque sem dúvida a temporada de caça a Alckmin está aberta

Esta semana, porém, a notícia de que a Polícia Federal estaria investigando a denúncia de um delator de que Alckmin teria recebido 3 milhões de reais em Caixa 2 da concessionária Ecovias colocou um novo fator na mesa: e se ele mesmo não quiser ter a vida esquadrinhada em uma campanha eleitoral que se avizinha sangrenta? Como todo candidato a cargo majoritário, e multiplicado por mil quando se trata do PT, o vice de Lula será investigado por jornalistas, MP e pela Polícia Federal de Bolsonaro. Sem a blindagem que o PSDB sempre teve, Alckmin aguentará o tranco?

entrou para o folclore político brasileiro o tratamento, digamos, diferenciado que os tucanos sempre tiveram da Justiça. Ao longo dos anos, enquanto petistas eram condenados e presos, inclusive Lula, os verbos mais associados a políticos do PSDB eram "inocentar", "arquivar", "extinguir", "rejeitar" e finalmente "prescrever". Se duvida de mim, dê um Google. O próprio Sergio Moro, nos diálogos revelados pela Vaza-Jato, rejeita investigar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para não "melindrar alguém cujo apoio é importante". Outro verbo emblemático.

É preciso dizer que a matéria com a "denúncia" jamais seria publicada pela Folha de S.Paulo e outros veículos com tamanho estardalhaço na quarta-feira, 16 de março, ou pelo menos teria sido melhor checada, se Alckmin ainda fosse tucano. Isso porque, segundo o ex-governador paulista disse no twitter, ela já havia sido arquivada pela Justiça Eleitoral na quinta-feira passada, dia 10. Em nota, Alckmin já havia reclamado que, "depois de tantos anos, mas em novo ano eleitoral, o noticiário seja ocupado por versões irresponsáveis e acusações injustas".

Embora possua a fama de "decorativo", desde que a democracia foi reinstalada no Brasil a escolha do vice-presidente é a jogada mais complicada do xadrez eleitoral. Em 1994, Guilherme Palmeira, do antigo PFL (hoje DEM), candidato a vice de FHC, foi acusado de elaborar emendas para favorecer obras de uma empreiteira e de ter duas aposentadorias precoces em cargos públicos e acabou sendo substituído por Marco Maciel. Anódino e moralmente inatacável, Maciel permaneceria na vice até o final do governo.

No mesmo ano, José Paulo Bisol, então no PSB, era cotado para vice de Lula, mas, devido a denúncias (nunca comprovadas) de que apresentou emendas superfaturadas, foi trocado por Aloizio Mercadante. Em 2002, a escolha do mineiro José Alencar agradou o empresariado, parte da militância petista torceu o nariz, e no final das contas deu certo. Sobre Michel Temer, vice de Dilma, é melhor nem comentar.

Político experiente que é, Geraldo Alckmin sabe que a artilharia midiática e judicial estará toda em sua direção a partir do momento em que disser o "sim" oficialmente para Lula. Até agora, ele ainda nem entrou no PSB –ao que tudo indica, a filiação será no dia 23, em Brasília. Se aceitar a vice, o ex-tucano aceita também o desafio de não ser abatido em pleno vôo, porque sem dúvida a temporada de caça a Alckmin está aberta.