Terceira edição do programa Terra em Transe discute os desafios e possibilidades da defesa dos direitos humanos no Brasil e no mundo

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Os direitos humanos têm sido atacados em diversas partes do mundo. No Brasil, por exemplo, a exaltação da ditadura civil-militar e seus agentes de repressão está presente nos círculos mais altos do poder. Nos EUA, a violência policial mais uma vez trouxe à tona o problema do racismo na sociedade norte-americana. Na terceira edição do programa Terra em Transe, Paulo Sérgio Pinheiro, professor titular (aposentado) do Departamento de Ciência Política da USP, ex-secretário de Estado de direitos humanos e ex-membro da Comissão Nacional da Verdade, conversou com membros do Grupo de Estudos sobre Conflitos Internacionais (GECI/PUC-SP) sobre o histórico de violações dos direitos humanos no Brasil e as possibilidades de mobilização internacional em torno dos direitos humanos.

No Brasil e no mundo, o respeito aos direitos humanos encontra-se sob tensão. O presidente Jair Bolsonaro e o governo federal, além da negligência no combate à pandemia da Covid-19, têm também se notabilizado por entraves às praticas do direito à memória e pela exaltação da ditadura civil-militar e seus agentes de repressão. O país também teve aumento dos homicídios cometidos pelas forças de segurança. Já nos EUA, o assassinato de George Floyd mais uma vez trouxe à tona o problema do racismo na sociedade norte-americana, levando a protestos pelo país e pelo mundo.

Questões como essas foram o tema do programa Terra em Transe do dia 10/06, apresentado pela pesquisadora do GECI Bárbara Blum. Para falar sobre o tema, Paulo Sérgio Pinheiro foi entrevistado por Isadora Souza, pesquisadora do GECI e discente do Mestrado Profissional em Governança Global e Formulação de Políticas Internacionais da PUC-SP, e Reginaldo Nasser, também membro do GECI e professor de Relações Internacionais da PUC-SP.

Falando sobre a situação brasileira, Pinheiro ressaltou que o país, mesmo em épocas de democracia, foi incompetente na busca pela superação do racismo estrutural, apesar de determinadas iniciativas tomadas nesse sentido. Este problema, conforme Pinheiro, se conecta e tem sido agravado pela conivência com a violência policial e a permanência de um sistema de segurança pública em grande medida herdado da ditadura civil-militar. Há, por fim, a questão da elevada desigualdade e da concentração de renda no país.

Para Pinheiro, o Brasil viu nos últimos anos a ascensão do comportamento e das ideias dos “porões” da ditadura aos altos círculos do poder – um processo que não se deu por acaso. As elites brancas brasileiras e a cúpula financeira nacional, destacou Pinheiro, apoiaram a candidatura de Bolsonaro. O entrevistado também ressaltou que há uma base popular na ascensão do atual governo, propiciada pelo distanciamento em relação aos movimentos populares e às organizações não governamentais (ONGs) ao longo dos últimos trinta anos de democracia no Brasil. Tendo em vista essas questões, Pinheiro destacou que, para evitar a continuidade da deterioração da democracia e a institucionalização da “ditadura do porãono Brasil, é necessária de imediato a formação de uma frente social ampla, comprometida com a maioria da população brasileira - principalmente seus grupos socioeconomicamente mais vulneráveis - e aberta desde à centro-direita aos movimentos populares.

Sobre as possibilidades de investigação e punição ao governo Bolsonaro pela negligência no combate à Covid-19 - o presidente chegou a ser denunciado ao Tribunal Penal Internacional por crimes contra a humanidade -, Pinheiro disse que há uma grande rede de comissões, ONGs e movimentos voltados para o monitoramento dos direitos humanos. Entretanto, é essencial também a atuação do aparato estatal brasileiro. Nesse sentido, na visão de Pinheiro, este fator pode ser dificultado nas atuais circunstâncias por uma tendência de complacência e submissão institucionais frente às forças que hoje estão no poder.

Quanto às possibilidades de movimentos da sociedade civil global em prol dos direitos humanos, assunto que entrou em evidência com as atuais manifestações nesse sentido em diversos países, Pinheiro ressaltou que há instâncias internacionais que lidam com esta questão. É o caso, por exemplo, do Conselho e dos Relatores Especiais de Direitos Humanos da ONU (com os quais podem se articular ONGs), bem como da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Na visão de Pinheiro, a atuação nesse sentido pode ser intensificada. Pinheiro ressaltou, por exemplo, a existência de órgãos relacionados às convenções internacionais de direitos humanos ratificadas pelo Brasil e a possibilidade de atuação da sociedade civil na Revisão Periódica Universal sobre a situação de direitos humanos no país feita no âmbito da ONU. As universidades também podem desempenhar um papel importante em iniciativas nesse sentido, comentou Pinheiro.

No encerramento da entrevista, Pinheiro, perguntado sobre as possibilidades de atuação em prol dos direitos humanos em meio a uma crescente cultura autoritária, ressaltou que não se deve perder de vista que a luta pelos direitos humanos sempre se dá em um campo contraditório: o Estado. Isto porque o Estado é teoricamente responsável, ao mesmo tempo, pelas garantias dos direitos humanos e pelo monopólio da violência. Nesse sentido, Pinheiro destaca a importância de um conjunto de órgãos e tratados na área de direitos humanos, bem como da atuação de movimentos sociais que dinamizam as cobranças nessa área – ainda mais em um momento no qual o Brasil tem um governo quefortes mostras de ruptura com o compromisso com os direitos humanos.

No último bloco do programa, Rodrigo Amaral, professor de Relações Internacionais da PUC-SP e membro do GECI, falou sobre iniciativas e organizações que têm se engajado na questão dos direitos humanos. O Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU (ACNUDH), por exemplo, é o principal ator global nesta área, prestando assistência técnica e monitorando a situação de direitos humanos pelo mundo.

Já a Human Rights Watch e a Anistia Internacional são duas ONGs internacionais que investigam, relatam e denunciam abusos contra os direitos humanos em vários países. No Brasil, a Conectas e o Instituto Sou da Paz são ONGs que atuam de maneira similar. A Conectas chama a atenção principalmente para questões como a violência policial, os impactos da guerra às drogas e o direito ao protesto. O Sou da Paz, por sua vez, monitora a violência e a segurança pública, tendo atuado em questões como o desarmamento e o controle de armas.

Ainda no Brasil, a Comissão Arns busca dar visibilidade e acolhimento institucional à investigação de graves violações de direitos humanos no país – principalmente aquelas cometidas por agentes do Estado contra populações discriminadas, como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBT e mulheres. Há, por fim, iniciativas da sociedade civil como a The Rising Majority, uma frente internacional ampla de caráter antirracista e anticapitalista que busca desenvolver uma estratégia coletiva de alinhamento de movimentos sociais em prol da justiça social.

O Terra em Transe continuará sendo exibido ao vivo às quartas-feiras, às 18h30, com transmissão pela TV PUC (YouTube), o Facebook do GECI e o Canal Universitário de São Paulo (CNU). Na próxima edição, no dia 17/06, o Terra em Transe terá como tema a economia política das redes de poder globais e a crise sistêmica em tempos de pandemia. O convidado entrevistado será Ladislau Dowbor, economista e professor da PUC-SP que teve atuação de consultoria junto a governos e agências da ONU.