FASCISMO NEOLIBERAL

Novo golpe? De Temer a Tarcísio, burguesia brasileira se reúne em Nova York com a terceira via

Enquanto Lula firma acordos de R$ 27 bi na China para driblar guerra comercial de Trump, burguesia brasileira se une à terceira via em Nova York em eventos pagos, em parte, com dinheiro de contribuintes de governos estaduais convidados

Em sentido horário: Doria com Temer, Hugo Motta na capa da revista Lide e Tarcísio com João Camargo.Créditos: Divulgação Lide e Esfera / Reprodução de Capa
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Enquanto Lula firma acordos no montante de R$ 27 bilhões com a China para driblar a guerra comercial desencadeada por Donald Trump, a nata da burguesia brasileira se reúne em Nova York com representantes do Centrão em meio às articulações promovidos por Michel Temer (MDB) em torno do Movimento Brasil, uma reedição do Ponte para o Futuro, que busca aglutinar forças historicamente golpistas em torno de uma candidatura anti-Lula na chamada Terceira Via - tendo Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos-SP) como principal aposta - com vistas às eleições de 2026.

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Figuras como Hugo Motta (Republicanos-PB), presidente da Câmara, e Ciro Nogueira (PP-PI), presidente do Progressistas, perambulam pelas luxuosas avenidas nova iorquinas desde o fim de semana, aguardando a participação em dois eventos de grupos brasileiros de lobby empresariais que acontecem simultaneamente na cidade. Os trabalhos legislativos no Brasil estão paralisados, já que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), também está em viagem, acompanhando a comitiva de Lula na China.

O grupo Lide, do ex-governador paulista João Doria (sem partido), promove nesta terça-feira (13) o 14º Lide Brazil Investment Fórum no famoso The Harvard Club.

Apesar de ser anunciado como um evento "para impulsionar investimentos entre os dois países e ampliar relações comerciais em setores estratégicos", o Fórum não conta com nenhum representante direto dos governos brasileiro e dos EUA.

“Apesar das diferenças políticas e das mudanças na administração norte-americana, empresários brasileiros vêm ampliando as frentes de cooperação e consolidando interesses comuns em diversas áreas. A segurança institucional, ponto considerado crucial para esse avanço, é um dos temas em destaque no Fórum", diz Dória no release do evento, prometendo que reunirá cerca de 300 empresários no Fórum.

Ao lado de Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), as estrelas do evento são Temer e Motta, juntamente com uma gama de governadores que aspiram a candidatura da terceira via.

Desafeto de Doria, Tarcísio não foi convidado, mas confirmou presença em outro evento, o Diálogos Esfera, grupo de João Camargo, presidente da CNN Brasil, que surgiu para fazer um lobby empresarial mais alinhado ao bolsonarismo.

Luxo da burguesia, dinheiro do contribuinte

Buscando um lugar ao sol junto à terceira via, os governadores Ronaldo Caiado (União-GO), Ibaneis Rocha (MDB-DF), Eduardo Leite (PSD-RS), Cláudio Castro (PL-RJ) e Raquel Lyra (PSD-PE) estarão nos dois eventos.

Teoricamente, as despesas com passagens e hospedagens em Nova York são pagas por Doria e Camargo. Teoricamente. Na prática, os próprios governadores bancam os eventos com dinheiro do contribuinte por meio de anúncios nas mídias dos dois lobistas.

A Lide Revista, de Dória, por exemplo, divulgou uma nova edição com Hugo Motta na capa às vésperas do evento. Além de empresas privatizadas, como a Vale e a Light, a publicação conta com anúncios dos governos estaduais que tiveram os mandatários convidados para o evento.

Ibaneis Rocha, por exemplo, publicou anúncios do Banco de Brasília (BRB) e da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb).

Entre reportagens sobre golfe, relógios e restaurantes de luxo, temas distantes da realidade dos brasileiros, a publicação de Doria ainda angariou publicidade dos governos Claudio Castro (RJ), Eduardo Leite (RS), Ronaldo Caiado (GO), Raquel Lyra (PE). Anunciaram ainda o governo de Renato Casagrande (PSB-ES), também convidado para o evento, e Mauro Mendes (União-MT), além do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD).

A publicação não revela os valores que cobra dos governos pelos anúncios. Porém, em 2024, uma nota divulgada pelo site Farolete mostra que a Prefeitura de Ribeirão Preto pagou  R$ 187,5 mil para veicular um único anúncio na revista Lide, de Doria. O valor é mais que suficiente para arcar com as despesas de viagem a Nova York.

Ainda na ala política, estão presentes Soraya Thronicke (Podemos-MS) e Tereza Cristina (PP-MS), que têm forte ligação com ruralistas; Nelsinho Trad, presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. O governador bolsonarista Jorginho Mello (PL-SC) também marcará presença.

Pela Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ex-presidente da casa e relator da proposta que aumenta o Imposto de Renda aos ricaços, vai discursar. Assim como o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Ilan Goldfajn, que comandou o Banco Central no governo golpista de Temer.

Completam o lobby de representantes da burguesia o ministro Gilmar Mendes, do STF, o procurador-geral da República (PGR) Paulo Gonet, e o ministro Vital do Rêgo, do Tribunal de Contas da União (TCU).

Já no evento da Esfera, de João Camargo, foram convidados representantes do governo federal, como o ministro Renan Filho (Transportes), da cota do MDB, e Jorge Messias, Advogado-Geral da União (AGU), além de Dario Durigan, secretário-executivo do Ministério da Fazenda, e Bruno Dantas, ministro do Tribunal de Contas da União (TCU).

Dobradinha Temer e Doria

O lobby da burguesia reunido em Nova York remonta ao antigo convescote golpista que se uniu em torno de Temer ante a derrubada de Dilma Rousseff (PT) do poder em 2016.

Articulador do movimento, o ex-presidente golpista já anunciou que quer "unir a Direita" em um projeto sem Jair Bolsonaro (PL) para enfrentar Lula em 2026. E para isso ressuscitou a antiga parceria com o lobista, ex-governador de São Paulo.

Enquanto Temer ocupa espaços na mídia liberal e em agendas com a Faria Lima, Doria está usando o Grupo Empresarial Lide, que ele formou para fazer lobby junto ao empresariado, para unir atores centrais da terceira via e tentar cooptar até quadros das Forças Armadas que não se alinham a figuras como dos generais Eduardo Villas Bôas e Sergio Etchegoyen, que foram fundamentais para que o emedebista desse um golpe parlamentar em Dilma - entenda.

A dobradinha Temer e Doria remonta a 2018, quando o ex-presidente golpista, ainda no poder, trocaram afagos em contraponto à Geraldo Alckmin, que acabou saindo como candidato do PSDB, com apoio de coligação de oito partidos: DEM, PP, PR, PRB, SD, PTB, PSD e PPS.

Então prefeito da capital, Doria se lançou candidato à ao governo de São Paulo e fez forte oposição a Alckmin, que sequer chegou ao segundo turno na disputa nacional.

Em conluio com Michel Temer, Doria chegou ao segundo turno e automaticamente declarou apoio a Bolsonaro, em campanha ferrenha contra Fernando Haddad (PT).

Mídia liberal

Revelado por esta Fórum no dia 17 de abril, o "Movimento Brasil" articulado pelo ex-presidente Michel Temer (MDB) para resgatar a aliança golpista que o alçou à Presidência - agora tendo Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos) como candidato anti-Lula em 2026 - começa a ganhar corpo e ser propagado pela mídia liberal.

Em editorial neste domingo (11) intitulado "Uma Luz à Direita", o Estadão - representante da burguesia paulista desde os tempos do escravagismo - diz que a "iniciativa proposta por Michel Temer abre caminho para redefinir a direita brasileira num cenário sem seu maior líder – Jair Bolsonaro – e sem o radicalismo que marca o bolsonarismo".

Em tom risível, o folhetim da família Mesquita diz que "o movimento de Michel Temer propõe algo diferente", mesmo com o ex-presidente golpista resgatando o programa Uma Ponte para o Futuro, criado nas hostes do MDB em 2015, baseado em uma série de preceitos neoliberais para destruir projetos sociais e entregar as riquezas do país, como o petróleo, nas mãos dos financistas.

No entanto, na logo em seguida, o Estadão confirma que se trata de um golpe continuado, revelando que "Temer concebeu um calendário que, realisticamente, ao mesmo tempo afasta e preserva Bolsonaro". Ou seja, para atrair Tarcísio para a cabeça de chapa, a terceira via pode até salvar a pele de Bolsonaro para atrair os votos dos eleitores mais extremistas.

Já a Band, da família Saad, convidou Temer para disseminar sua negociata - que une Faria Lima e Centrão, além da mídia liberal - em entrevista o Canal Livre na noite deste domingo.

Indagado sobre as tratativas que teve com os governadores Ratinho Jr (PSD-PR), Ronaldo Caiado (União-GO) e Romeu Zema (Novo-MG) - além da aproximação de Eduardo Leite (PSD-RS), recém filiado ao PSD de Gilberto Kassab, outro artífice do movimento - revelou como o plano anti-Lula tem sido recebido.

"Eu vejo, em conversas que tive com alguns governadores, que eles estão muito dispostos a algo desta natureza", afirmou, ressaltando que não serão os cinco governadores que sairão candidatos no primeiro turno. "Espero que haja dois ou três candidatos de programas determinados, sem muitas candidaturas. Isso melhora os costumes políticos do pais”, emendou.

Temer ainda revelou a estratégia de fazer a campanha longe das definições de esquerda e direita, segundo ele "muito eleitoreiras", lembrando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), ainda hoje um dos mais adulados pela mídia neoliberal.

“Para mim isso não vale nada. O que vale para o povo é o resultado do governo. Essa coisa de esquerda e direita é muito eleitoreira. Até dou exemplos concretos de um governo que era liberal, como o de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), que fez muito pelo social, e um governo tido como esquerda, como o primeiro mandato de Lula, que fez muito pelos empresários”, disse, alfinentando Lula.

Temer ainda confessou que não fala mais com Lula, nem com Dilma Rousseff (PT), a quem derrubou por meio de um golpe articulado juntamente com o Congresso. 

“Não tenho [contato com Lula] porque não o procuro. Evidentemente ele também não me procura. Mas nenhum ressentimento”, disse.

“Não vou dizer que tenho pena do presidente porque seria impróprio, mas sei por que ele diz isso [a acusação de golpe]. Ele sempre se deu muito bem comigo, mas faz isso para agradar uma área do PT, o partido dele. Politicamente é natural, não tenho nenhuma objeção. Até porque ele fala, mas não pega. Se falasse e colasse, eu ficaria preocupado, mas não cola”, emendou, sobre a alcunha de golpista.

 

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