PLANO DE ASSASSINATO

Policial Federal acusado de repassar informações sobre segurança de Lula contradiz a própria defesa

Denúncia da PGR aponta que Wladimir Matos Soares teria repassado informações sigilosas sobre a segurança de Lula para aliados do governo Bolsonaro, colocando em xeque sua defesa

Wladimir Matos Soares, agente da PF que foi preso por envolvimento no plano para matar Lula.Créditos: SINPF-SP/Vakinha
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A defesa do agente da Polícia Federal Wladimir Matos Soares, apontado como o responsável por repassar informações sobre a segurança de Lula para um plano de assassinato do presidente no âmbito da trama golpista, sustenta que ele apenas cumpria suas funções na segurança fixa dos hotéis durante a posse do mandatário. No entanto, a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) aponta contradições no depoimento do policial, que teria usado sua posição para monitorar e repassar informações sensíveis a aliados do governo Bolsonaro. A complexidade das provas apresentadas pela PGR coloca em xeque a versão da defesa e reforça a narrativa de que havia um esforço coordenado para interferir na transição de poder.

De acordo com a acusação, em 13 de dezembro de 2022, Wladimir enviou uma mensagem para Sérgio Rocha Cordeiro, então assessor especial do Gabinete Pessoal do Presidente da República, com a imagem da carteira de habilitação de Misael Melo da Silva, agente envolvido na segurança de Lula. Acompanhando a imagem, havia uma sequência de emojis de sirene, o que a PGR interpreta como um alerta sobre a presença do indivíduo. Esse detalhe reforça a tese de que o policial estava intencionalmente repassando informações para pessoas próximas ao governo Bolsonaro, em um momento em que a segurança do presidente eleito era tratada como um ponto sensível.

A defesa do policial argumenta que ele estava apenas verificando a identidade de indivíduos que haviam se hospedado sem se identificar no hotel. Entretanto, a estratégia de defesa se enfraquece ao considerar que a informação foi enviada a um integrante do governo Bolsonaro, e não aos seus superiores na Polícia Federal ou ao próprio GSI, que seria a instituição responsável por esclarecer a situação. Esse detalhe chama atenção, pois se Wladimir estivesse realmente cumprindo um protocolo de segurança, ele teria seguido a cadeia de comando formal e não se comunicado com um assessor político do governo anterior.

Outro trecho comprometedor da denúncia traz um áudio enviado pelo policial ao mesmo interlocutor bolsonarista, no qual ele demonstra incerteza sobre quem eram os indivíduos identificados no hotel e sugere que poderiam estar ligados à equipe do presidente eleito. A defesa usa esse áudio como argumento de que Wladimir não estava repassando informações e apenas buscava confirmação. No entanto, a própria sequência dos eventos coloca em dúvida essa versão, pois a informação já havia sido transmitida antes mesmo da suposta verificação. Além disso, o tom das mensagens sugere mais do que simples dúvidas operacionais – há um evidente viés político na forma como o policial trata a situação, reforçando a interpretação da PGR de que ele estava envolvido em um monitoramento extraoficial.

Outro ponto que complica a situação de Wladimir Matos Soares são suas próprias declarações em mensagens privadas. Em um trecho da denúncia, o policial escreve a Cordeiro:

"Essa porra tem que virar logo. Não dá pra continuar desse jeito não, irmão. Vamos nessa. Eu tô pronto."

A defesa tenta minimizar o conteúdo, alegando que se trata de um desabafo pessoal e que "tô pronto" é um jargão comum entre operadores de segurança. No entanto, a PGR argumenta que a declaração indica alinhamento com grupos que planejavam impedir a posse de Lula, considerando que foi dita a um ex-assessor do governo Bolsonaro durante um período de alta tensão política. Em um contexto no qual havia articulações de bastidores para questionar a legitimidade das eleições e impedir a posse do presidente eleito, tais mensagens não podem ser tratadas como meros desabafos.

Em outra mensagem, Wladimir afirma:

"Eu e minha equipe estamos com todo o equipamento pronto para ir ajudar a defender o Palácio e o Presidente. Basta a canetada sair!"

A frase sugere que ele estava ciente de um possível decreto que manteria Bolsonaro no poder. A defesa classifica a fala como "bravata", mas o contexto das mensagens e a interlocução com aliados bolsonaristas enfraquece esse argumento. Além disso, a menção ao uso de equipamento para "defender o Palácio" levanta questionamentos sobre qual seria exatamente o papel desempenhado por Wladimir dentro dessa estrutura. Se a frase fosse meramente um comentário informal, por que foi dita a um interlocutor estratégico ligado ao governo anterior?

A PGR também destaca que, se a intenção de Wladimir fosse apenas manter a segurança dos hotéis, ele deveria ter reportado qualquer movimentação suspeita aos seus superiores na Polícia Federal e não a um interlocutor de fora da cadeia de comando. A postura do policial indica que ele utilizava sua posição para fins políticos, o que reforça a tese da acusação. Esse ponto é central para a denúncia, pois demonstra que o réu não apenas compartilhava informações sensíveis, mas fazia isso com um viés alinhado ao grupo que questionava a transição democrática.

Outro aspecto relevante é o fato de que Wladimir Matos Soares não apenas manteve comunicação com Sérgio Rocha Cordeiro, mas também expressou frases que indicam uma disposição para ação. Se fosse um simples desabafo, ele não teria mencionado equipamentos prontos ou sugerido que faltava apenas uma "canetada" para uma movimentação. A soma desses fatores leva a PGR a sustentar que o policial não era apenas um espectador, mas sim um agente ativo em uma rede de comunicação que tentava minar o novo governo.

A defesa segue contestando as acusações e tenta afastar Wladimir Matos Soares das articulações do 8 de janeiro, mas as mensagens e a relação do policial com aliados de Bolsonaro dificultam a tentativa de desvinculá-lo do contexto golpista. Além disso, a ausência de um protocolo formal para a comunicação das informações que ele transmitiu levanta ainda mais suspeitas sobre seu papel na operação. Caso contrário, por que ele se comunicaria com um interlocutor político em vez de acionar diretamente os responsáveis pela segurança da posse?

A questão central agora é como o STF interpretará essas mensagens e qual será o peso atribuído às conexões políticas do policial dentro da investigação mais ampla sobre os atos antidemocráticos de 8 de janeiro. O fato de a defesa insistir na tese de bravata e desabafo pode não ser suficiente para afastar as evidências de que Wladimir estava, no mínimo, engajado em uma rede de monitoramento que beneficiava aqueles que tentavam questionar a transição democrática no Brasil.

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