TRAMA GOLPISTA

Defesa de general admite que militar esteve a sós com Bolsonaro

Peça jurídica tenta desqualificar provas da PGR, mas não explica por que o general se reuniu com o ex-presidente em um momento crítico da conspiração golpista

Créditos: Alberto César Araújo/Aleam
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A defesa do General da reserva Estevam Theophilo confirmou que o militar esteve a sós com Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada, no dia 9 de dezembro de 2022, em um dos momentos mais críticos da articulação golpista investigada pela Operação Tempus Veritatis. A admissão consta na petição enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), na qual os advogados tentam anular a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). Apesar de buscar desqualificar as provas reunidas pela investigação, a defesa não explica por que o general aceitou participar do encontro, nem rebate diretamente as acusações que o ligam à tentativa de golpe.

O documento assinado pelo advogado Diogo Musy reforça a presença de Theophilo na reunião e argumenta que o militar compareceu por determinação hierárquica e com o conhecimento prévio do então Comandante do Exército, General Freire Gomes. No entanto, a defesa não apresenta nenhum documento formal que comprove essa autorização, nem justifica por que Bolsonaro teria convocado Theophilo para uma conversa privada naquele momento.

A reunião e a minuta do decreto golpista

De acordo com a denúncia da PGR, Bolsonaro vinha insistindo na tese de que as Forças Armadas deveriam intervir no processo eleitoral e chegou a discutir um decreto que anulava as eleições de 2022. O texto previa a prisão de ministros do STF e a convocação de novas eleições sob supervisão militar. Os autos apontam que a proposta foi apresentada a comandantes das Forças Armadas, mas não obteve o apoio esperado.

Segundo as investigações, ao perceber a resistência de setores militares, Bolsonaro teria passado a buscar aliados no Alto Comando do Exército. No dia 9 de dezembro de 2022, Mauro Cid, então ajudante de ordens do presidente, enviou um áudio ao General Freire Gomes informando que Bolsonaro havia “enxugado” o decreto para tentar torná-lo mais aceitável e que havia chamado Theophilo para uma conversa no Alvorada.

O que foi tratado na reunião não é detalhado pela defesa, que apenas alega que não houve qualquer aceitação do general à proposta golpista. No entanto, o próprio Mauro Cid, em depoimentos prestados no âmbito da colaboração premiada, mencionou que Theophilo teria afirmado que o Exército cumpriria a ordem caso Bolsonaro assinasse o decreto. Além disso, uma mensagem de Cid para um terceiro, enviada no mesmo dia, reforça essa narrativa: “Mas ele quer fazer… desde que o PR assine”.

A defesa não nega a existência da mensagem, mas alega que ela não pode ser considerada prova suficiente. No entanto, a petição não apresenta nenhuma evidência concreta que desminta o conteúdo do depoimento de Mauro Cid.

Contradições na defesa

Embora os advogados de Theophilo tentem caracterizá-lo como parte de um grupo de militares legalistas, que não apoiaria uma ruptura institucional, a própria participação do general na reunião contradiz esse argumento. Se ele realmente era contrário a qualquer iniciativa golpista, por que aceitou se reunir com Bolsonaro naquele contexto?.

Outro ponto que enfraquece a tese da defesa é a tentativa de desqualificar a delação de Mauro Cid, alegando que ele teria prestado depoimentos contraditórios. No entanto, mesmo com ajustes em sua narrativa ao longo das investigações, Cid nunca negou que Theophilo esteve na reunião e que o tema do encontro era o apoio militar ao plano golpista.

Além disso, a petição sugere que Freire Gomes não sabia do motivo do encontro, mas o áudio de Cid enviado ao então Comandante do Exército mostra que a reunião não foi um encontro casual ou sem propósito. Se Theophilo realmente fosse contrário ao plano, poderia ter se recusado a comparecer – algo que sua defesa sequer menciona como possibilidade.

Omissões e lacunas

A peça jurídica também evita esclarecer a relação do general com outros investigados, especialmente aqueles que atuavam para garantir apoio ao golpe dentro do Exército. A defesa tampouco explica por que Theophilo permaneceu no Comando de Operações Terrestres (COTER) até o final de 2023, mesmo após o novo governo ter assumido. O documento apenas insinua que essa continuidade no cargo seria uma prova de que ele não esteve envolvido em atos ilegais, ignorando que a transição no Exército foi lenta e cuidadosa, e que outros militares suspeitos também permaneceram temporariamente antes de serem afastados.

Outro ponto que levanta dúvidas é a tentativa de desqualificar a condução da investigação, alegando que a Polícia Federal teria tentado “desestabilizar psiquicamente” o general durante seu interrogatório. A defesa argumenta que um delegado da PF mencionou um suposto vídeo da reunião, que nunca teria sido anexado aos autos. Entretanto, a defesa não comprova que o vídeo inexistia, nem apresenta qualquer elemento que torne ilegal a condução da investigação.

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