Após Jair Bolsonaro (PL) se tornar réu por tentativa de golpe de Estado em decisão unânime pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Lula se pronunciou sobre o julgamento e mandou um recado ao ex-presidente, que segue dizendo ser "inocente".
"Penso que, se ele for culpado, ele tem que se contentar com a punição. Isso vale para todos os 213 milhões de habitantes. Ao invés de chorar, caia na realidade e saiba que você cometeu um atentado contra a soberania desse país", destacou Lula. "É visível que o ex-presidente tentou dar um golpe no país, é visível por todas as provas que ele tentou contribuir para o meu assassinato, para o assassinato do vice-presidente, para o assassinato do ex-presidente da Justiça Eleitoral Brasileira e todo mundo sabe o que aconteceu nesse país."
A declaração ocorreu no Japão, onde Lula amplia relações econômicas entre os dois países, como mostra essa matéria da Fórum. Segundo o presidente, ao pedir anistia, Bolsonaro estaria assumindo culpa pela tentativa de golpe. "Ele deveria provar a inocência dele, porque ele não precisava pedir anistia. Prova que é inocente e vai ficar livre e acabou. Eu só espero, só espero que a Justiça faça justiça. Se nos autos do processo ele for inocente, que seja inocentado."
"Se ele for culpado, que seja punido. Não é o homem Bolsonaro que está sendo julgado, é um golpe de Estado que está sendo julgado. É a conduta desse cidadão que está sendo julgada", completou o presidente.
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De acordo com a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), Bolsonaro tinha conhecimento e acompanhou de perto a evolução do plano "Punhal Verde Amarelo", cujo objetivo seria assassinar o vice-presidente Geraldo Alckmin e o presidente Lula, além do ministro Alexandre de Moraes, que presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na época. O ex-presidente também tinha pleno conhecimento da tentativa de golpe, como apontou o relatório apresentado em fevereiro deste ano.
Decisão histórica para a democracia
Em decisão unânime e histórica, o Supremo Tribunal Federal aceitou na manhã desta quarta-feira (26) a denúncia contra Bolsonaro e tornou o ex-presidente réu pelos crimes de organização criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.
Os cinco ministros do colegiado, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Luiz Fux entenderam que há elementos de sobra para a instauração de uma ação penal contra o líder da extrema direita brasileira.
Também se tornaram réus os outros integrantes do chamado núcleo crucial da organização criminosa golpista, formado por colaboradores mais próximos de Bolsonaro, nomeadamente Alexandre Ramagem, Almir Garnier Santos, Anderson Torres, Augusto Heleno Ribeiro Pereira, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, Mauro Cesar Barbosa Cid e Walter Souza Braga Netto.
Ainda na tarde de ontem (26), na segunda sessão do caso, após o almoço, quando se esperava a decisão sobre o acolhimento ou não da denúncia, o presidente da turma, ministro Cristiano Zanin, abriu a palavra e a votação para os magistrados integrantes do colegiado decidirem sobre pedidos feitos pelas defesas dos acusados, como o afastamento de Moraes, Dino e Zanin do julgamento, a transferência do foro para o plenário do STF e questões relacionadas ao tempo fixado para a análise das provas por parte dos advogados.
Todas as posições anteriores, inclusive corroboradas em outros julgamentos pelo pleno do Supremo e pelas duas turmas que compõem a Corte, foram mantidas. A partir de agora, Bolsonaro e os demais réus vão responder pelos crimes a eles atribuídos, e a instrução de um processo penal terá início, com sessões em que acusados, testemunhas e outros personagens serão ouvidos para que, ao final do trâmite, o caso seja julgado. Se condenado, Jair Bolsonaro e seus cúmplices podem receber penas de até 40 anos de prisão.
Em entrevista à Fórum, o jurista Pedro Serrano destacou que a importância do julgamento está no fato de ser um "reconhecimento do sistema de Justiça de que houve tentativa de golpe de Estado empreendida por uma organização armada". "É a declaração de que isso é um crime", acrescentou.
O jurista também apontou a própria história do Brasil, que foi construída em cima de golpes desde o Império, e frisou, mais uma vez, a importância desse julgamento, principalmente no panorama atual que o mundo vive. "Nesse momento que o mundo está, considerar formalmente um ato criminoso uma tentativa de golpe pela extrema direita é um imenso avanço. É um fato histórico relevantíssimo", afirmou Serrano.
"Um golpe é sempre um empreendimento coletivo. O sujeito que teve uma participação consciente em uma conduta que foi uma das etapas do golpe tem que ser condenado por todo o crime, não por uma parte", acrescentou.
Leia a entrevista completa: Pedro Serrano: julgamento de Bolsonaro é "reconhecimento judicial do crime de tentativa de golpe"