COMUNICAÇÃO

"Vivemos um processo de degradação do debate", diz José Fernandes sobre avanço da extrema direita

Ao Fórum Onze e Meia, Fernandes defende mudanças na comunicação do governo e Lula como liderança no embate com a extrema direita

José Fernandes Junior, jurista e comunicador.Créditos: Reprodução de Vídeo/Portal do José
Escrito en POLÍTICA el

O Fórum Onze e Meia desta quinta-feira (20) recebeu o professor de Direito e comunicador José Fernandes Júnior, que abordou o avanço da extrema direita, principalmente na área de comunicação, e os desafios impostos ao campo progressista diante dos ataques desse grupo. Fernandes afirma que a ascensão da extrema direita nas redes sociais serviu para reforçar as desinformações e omissões que a mídia corporativa já propagava, mas com linguagens e ferramentas mais intensas. 

O comunicador destaca que a extrema direita provocou uma degradação do debate público ao utilizar ataques muito mais agressivos e fomentar discursos de ódio e atitudes violentas de seus seguidores. "A grande mídia sempre passou as suas mensagens do ativismo político, ativismo econômico, ativismo ideológico, ativismo moral, sempre de uma forma mais envernizada. A extrema direita não, ela vai na lama, ela vai no esgoto", diz José.

"Pegando as franjas dessa mentalidade, dessa lavagem cerebral que países como o nosso sofrem durante décadas, [a extrema direita] consegue atingir um extrato social mais ressentido, mais nervoso, mais revoltado, mais despolitizado, mais ignorante. E trouxe para o debate público aquilo que nós, que viemos de longe, nunca tínhamos costume de enfrentar, que é uma espécie de ignorância-ostentação, a boçalidade-ostentação, a virulência-ostentação", analisa o comunicador. 

Fernandes ressalta que, diante desse cenário em que a extrema direita empodera ameaças e mensagens aterrorizantes contra seus adversários, o campo progressista "tem que se dar muito valor" por ter conseguido eleger Lula em 2022. 

O comunicador também comenta as declarações misóginas do deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) sobre a nova ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT), após a fala de Lula sobre ter colocado uma "mulher bonita" no cargo. Fernandes destaca que hoje o país vive "um processo de degradação do debate".

"Nós, como não entramos, enquanto esquerda, enquanto progressista, no embate da disputa política, a gente foi deixando cada vez mais ter um avanço da extrema direita, da normalização do crime, da ofensa, injúria, calúnia, difamação, distorção do que é de fato a imunidade parlamentar, que foi distorcida por essa extrema direita como uma liberdade para prática de crimes contra qualquer pessoa", afirma. 

"Então, isso ficou tão enraizado, criou uma confusão tão grande no entendimento da sociedade do pode e não pode, que hoje fica muito complicado você pegar uma pessoa tão criminosa quanto Gustavo Gayer, uma pessoa tão sem caráter, um mentiroso contumaz, uma pessoa violenta, uma pessoa vil, e tirar do parlamento. Porque haverá sempre um discurso de que a liberdade do parlamentar atinge inclusive esse campo", acrescenta José. 

O comunicador aponta, ainda, que o próprio STF já entendeu e mostrou que não existe direito absoluto. "Nem o direito à vida é absoluto. Porque se o direito à vida fosse absoluto, você não poderia praticar legítima defesa, né? Então, todos os direitos estão sujeitos a uma contemporização com outros direitos", explica.

"Então, quando se tem uma imunidade parlamentar, essa imunidade não pode ser um valor preponderante a outros valores, ao direito à integridade física, à intimidade, à vida privada de uma outra pessoa. Você não pode destruir uma reputação, você não pode praticar crimes pelo uso da palavra", defende.

Lula como liderança nesse campo de disputa 

Fernandes também diz que, diante desse "processo de distorção" que o Brasil vive, ele tem feito uma grande cobrança para que haja uma liderança política que faça a disputa nesse campo da comunicação contra a extrema direita. Para ele, o presidente Lula deveria realizar essa função. 

"O presidente Lula tem a atividade dele de governante, que já dá um trabalho gigantesco, mas ele nunca pode se divorciar da persona política, daquele que tem que encantar a sociedade para abraçar as pautas principais, valores éticos, valores políticos, valores democráticos. Isso tudo é permeado assim nas falas do Lula, mas no tempo que a gente está vivendo hoje, era muito importante que o presidente da República funcionasse como um farol para iluminar as trevas que se abateram sobre muitos segmentos da sociedade", defende.

"Por isso, tenho defendido, desde o primeiro dia do governo Lula, que ele sempre fizesse lives de manhã cedo explicando o que é que ele recebeu, os problemas que nós estamos enfrentando, o problema da mentira, da fake news, como foi destroçado o Estado brasileiro, mas isso nunca foi feito", lamenta o comunicador. 

Fernandes acrescenta que chegou a batalhar muito essa ideia com o ex-ministro da Secretaria de Comunicação Social, Paulo Pimenta (PT), para que tivesse "uma comunicação politizadora do governo e não uma comunicação publicitária". No entanto, o comunicador afirma que é exatamente desse segundo modo que está sendo feita com a entrada de Sidônio Pereira. 

"Com esse tipo de comunicação, nós não vamos ter uma melhoria na politização da sociedade para que em 2026 a gente tenha um sucesso prático eleitoral, que a gente consiga eleger os governadores, uma bancada grande de senadores, uma bancada grande de deputados federais, porque a gente acaba tendo um presidente que é um presidente eleitoral", avalia. 

Ele acrescenta que Lula acaba "funcionando bem no período eleitoral", mas que não há força para travar essa disputa no campo de comunicação contra a extrema direita. Fernandes aponta que, diante de tudo isso, talvez nem eleitoralmente o campo progressista consiga ter um grande sucesso nas próximas eleições, "haja vista o que nós vimos nas eleições para prefeitos e vereadores, que a esquerda, de um modo geral, tomou um 'sacode' gigantesco", alerta.

"Não adianta querer tapar o sol com a peneira. O que aconteceu em 2024 já estava absolutamente previsto pelas pessoas do campo progressista que estavam vendo que nós estamos deixando um buraco muito grande nessa disputa política aqui no Brasil", avalia.

Confira a entrevista completa do jurista e comunicador José Fernandes Júnior ao Fórum Onze e Meia 

Siga o perfil da Revista Fórum e da jornalista Júlia Motta no Bluesky.

Reporte Error
Comunicar erro Encontrou um erro na matéria? Ajude-nos a melhorar