Em seu primeiro depoimento dentro do acordo de delação premiada firmado com a Polícia Federal (PF), o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, citou a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) como integrantes de uma "ala mais radical" da trama golpista.
O depoimento, revelado pelo jornalista Elio Gaspari, da Folha de S. Paulo, faz parte de uma série de mais de dez depoimentos e tem seis páginas. Mauro Cid afirmou que havia um grupo de conselheiros radicais de Bolsonaro que defendia a não aceitação da derrota nas eleições de 2022. “Tais pessoas conversavam constantemente com o ex-presidente, instigando-o para dar um golpe de Estado, afirmavam que o ex-presidente tinha o apoio do povo e dos CACs [Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores] para dar o golpe", diz a transcrição do depoimento.
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Apesar das citações, o relatório final da Polícia Federal sobre a trama golpista, encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR), não indiciou a ex-primeira-dama e o deputado federal.
Nesta segunda-feira (27), em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, foi questionado sobre o motivo pelo qual Michelle e Eduardo, apesar de citados por Mauro Cid, não foram indiciados junto às outras 40 pessoas, entre elas o ex-presidente Jair Bolsonaro, no relatório final da corporação no âmbito das investigações.
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“Volto a insistir na questão técnica da delação. Ele, ao colaborar e citar algumas pessoas, aponta alguns elementos que podem nos levar a coletar provas para responsabilizar ou não essas pessoas. No caso concreto, está lá no relatório do inquérito policial, não houve a busca de outros elementos que pudessem confirmar de que essas pessoas tenham participado. O fato de ser de um grupo radical, um grupo moderado, um grupo light, isso não traz nenhuma consequência jurídica para o processo", declarou Rodrigues.
O diretor da PF ressaltou que a investigação em como objetivo principal esclarecer os fatos com base em evidências. “É importante saber qual foi a efetiva participação das pessoas para o conceito criminal, para a ação criminosa que foi ali desenhada. E é importante salientar, e eu tenho repetido isso, que a Polícia Federal não trabalha, não investiga para culpar as pessoas, para responsabilizar as pessoas. Ela investiga para buscar a verdade real. Ela investiga para que todos os elementos sejam trazidos aos autos, ainda que para inocentar as pessoas", pontuou.
De acordo com Rodrigues, a ausência de indícios concretos sobre a participação de Michelle e Eduardo Bolsonaro na execução de um golpe foi determinante para a decisão de não indiciá-los. “Nós investigamos, apuramos, não encontramos elementos suficientes para várias pessoas, não só essas duas que você cita, e, portanto, fizemos a conclusão que tinha que ser feita.”
Michelle e Eduardo, ambos cogitados como possíveis candidatos à presidência em 2026, negam as acusações feitas por Mauro Cid. Agora, a análise das conclusões da Polícia Federal será feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que pode, ainda que eles não tenham sido indiciados, oferecer denúncia ao STF.
Veja vídeo da declaração de Andrei Rodrigues sobre o assunto:
Bolsonaro preso antes do julgamento?
O diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, afirmou em entrevista ao programa "Roda Viva", da TV Cultura, na noite desta segunda-feira (27), que sua corporação executa um trabalho técnico nas investigações que pesam contra Jair Bolsonaro e que, se o Judiciário emitir uma ordem de prisão contra o ex-presidente antes de um eventual julgamento, esta será cumprida.
Bolsonaro foi indiciado pela PF em três casos: o da tentativa de golpe de Estado; joias e artigos de luxo do Estado brasileiro subtraídos do acervo da presidência; e fraude em cartões de vacinação contra a Covid-19. A expectativa é que nas próximas semanas a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresente denúncia contra o ex-presidente no âmbito de algum ou de todos esses casos e, então, caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) aceitar essa denúncia e abrir uma ação penal, que culminará no julgamento do ex-mandatário.
Bolsonaro, entretanto, é alvo de medidas cautelares que, se descumpridas, podem ensejar uma ordem de prisão preventiva antes mesmo do julgamento. Entre essas medidas cautelares estão a retenção de seu passaporte, com proibição de viajar para fora do país, e proibição de contato com outros investigados do inquérito dos atos golpistas. A prisão preventiva pode ser decretada se, por exemplo, for constado que o ex-presidente está atrapalhando as investigações, obstruindo a Justiça ou oferecendo risco de fuga.
Questionado no programa "Roda Viva" pelo jornalista Rodrigo Rangel se a PF, de fato, vai esperar o julgamento para prender Bolsonaro ou se pode pedir a prisão imediata do ex-presidente, Andrei Rodrigues deixou as duas possibilidades em aberto.
"Esse é um caso, e são vários casos, que são questões técnicas. A prisão ou não prisão não depende da vontade ou do desejo ou do imaginário das pessoas, ou de pressão política ou pressão popular. Depende de requisitos legais, requisitos que estão no Código de Processo Penal, que estão no Código Penal e que também precisam de uma decisão judicial. A Polícia Federal, salvo situação em flagrante, cumpre mandados de prisão expedidos pelo Poder Judiciário e ouvindo o Ministério Público. Então, nesse caso, ou em qualquer outro caso, é uma questão técnica. Se estiverem presentes os pressupostos de alguma medida cautelar, a Polícia Federal não tem a opção de fazer, deixar de fazer, porque vai ser bom, vai ser ruim, vai ser desgastante ou não vai ser desgastante. Não é uma opção do Policial Federal ignorar o que está na lei", declarou o diretor-geral da PF.
"Qualquer pedido de medida cautelar, seja uma busca e apreensão, seja uma medida adversa da prisão, seja a própria prisão, ela tem requisitos legais. Se algum investigado incorrer naqueles fatores ali, que estão elencados, se não me engano, artigos 312, 313 do Código de Processo Penal, que estão elencados ali para prisão preventiva, por exemplo, o policial tem o dever de apresentar ao Poder Judiciário a sua representação em razão disso, e é o dever, não é um direito e não é uma pretensão pessoal", prosseguiu.