O Exército e a Marinha do Brasil admitiram que são dependentes do sistema de satélites da Starlink, do empresário Elon Musk, para atividades essenciais para a segurança nacional.
O assunto voltou à tona depois que o ministro Alexandre de Moraes, numa ação que está sendo questionada por juristas, decidiu congelar contas bancárias da empresa no Brasil, com o objetivo de garantir que Musk pague as multas em que incorreu por descumprir decisões judiciais em sua plataforma X.
A Starlink alega que não tem relação formal com o X.
Musk demitiu funcionários e ficou sem representante do X no Brasil, mas manteve os negócios da Starlink.
A empresa chegou ao Brasil pelas mãos do ex-presidente Jair Bolsonaro, com a promessa até agora não cumprida de conectar milhares de escolas na Amazônia à internet.
Os contratos com a Marinha e o Exército, sem licitação, foram fechados durante o governo Lula.
A Starlink tem 6.350 satélites em órbita e depende de autorização de governos para prestar serviços locais.
Ela tem hoje uma fatia significativa do mercado de internet na região Norte.
DEPUTADO BOLSONARISTA
Foi o deputado federal Coronel Meira, do PL de Pernambuco, quem questionou o Ministério da Defesa sobre a importância dos serviços prestados pela Starlink aos militares.
Ele também queria saber o impacto se os contratos fossem cancelados.
As respostas foram dadas em ofícios no dia 6 de junho deste ano.
O chefe de gabinete do comandante do Exército, General de Divisão Márcio de Souza Nunes Ribeiro, respondeu:
O referido Sistema é empregado em operações, em Ações Cívico Sociais, em adestramentos, dentre outras atividades. O contrato se justifica pela facilidade, flexibilidade e rapidez que o equipamento da Starlink confere ao estabelecimento dos enlaces de Comando e Controle, proporcionando a devida prontidão estratégica àquele Grande Comando Operacional para ser empregado em todo o território nacional. Entende-se que, no caso de um eventual cancelamento de contrato com a referida empresa, poderá haver prejuízo para o emprego estratégico de tropas especializadas, pois as capacidades entregues pela empresa proporcionam , entre outros fatores, redundância operacional, elevada confiabilidade, rapidez de instalação, altas taxas de banda, cobrindo grandes distâncias com praticamente nenhuma interferência do terreno ou das condições atmosféricas, bem como de uso em locais sem nenhuma infraestrutura.
Isso confirma que o Exército brasileiro depende, inclusive em operações de comando e controle, de uma fornecedora de tecnologia estadunidense que, em tese, poderia puxar o plug, causando "prejuízo para o emprego estratégico de tropas especializadas".
PRÉ-SAL E PESCA ILEGAL
Já a Marinha descreveu dez contratos fechados com a Starlink, que fornece internet para o navio veleiro Cisne Branco, a fragata Liberal, o Grupamento de Patrulha Naval do Norte, o Grupamento de Patrulha Naval do Sudeste, o navio patrulha Babitonga, o navio polar Almirante Maximiano, o navio de apoio oceanográfico Ary Rongel e o navio aeródromo Atlântico.
Instada a responder sobre o prejuízo que causaria o cancelamento dos contratos, a Marinha afirmou, sobre o Grupamento de Patrulha Naval do Sudeste:
A capacidade de manter comunicações por satélite faz parte dos Requisitos Mínimos de Comunicações do Navio, visando o envio de comunicações em tempo real, por voz ou dados, essenciais para o gerenciamento das ações desencadeadas em prol da salvaguarda de vida humana no mar ou para o atendimento a situações de crise.
O Grupamento do Sudeste, responsável por vigiar a costa do Paraná e de São Paulo, patrulha a bacia de Santos, onde se encontram importantes jazidas de gás e petróleo do pré-sal, e combate o narcotráfico e os assaltos a embarcações.
O Grupamento do Norte, baseado em Belém, tem como uma de suas funções, além de patrulhar a costa, combater a pesca predatória em águas territóriais brasileiras em parceria com o IBAMA:
O esforço principal tem sido dirigido contra a pesca predatória das espécies que tem sua origem natural na região estuarina dos rios Pará e Amazonas, dentre as quais se destacam o bagre e a piramutaba.
Os serviços da Starlink, de acordo com os documentos, são prestados aos navios patrulha Maracanã e Babitonga no Sudeste e Bracuí no Norte.
PRINCIPAL NAVIO DE ATAQUE
É praxe que as comunicações militares sejam criptografadas, mas o operador dos satélites pode ter acesso à localização dos navios que utilizam seus serviços.
Os contratos citados pela Marinha envolvem a instalação de antenas nos navios e um valor mensal pelos serviços de internet na casa dos R$ 250 mil mensais.
Comissionado em junho de 2018, o navio aérodromo Atlântico, que o Brasil comprou do Reino Unido, teria tarefa central em ação de assalto anfíbio, com capacidade para carregar 18 helicópteros e 40 veículos especializados.
O contrato específico do Atlântico é de valor inferior a R$ 40 mil mensais, mas segundo a Marinha não estava vigente uma vez que "o pacote de dados já foi consumido completamente".