Em meio à volta generalizada da população com a PEC que abre brecha para a privatização das praias brasileiras, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), relator da proposta, sentiu a pressão e já admite que vai mudar alguns pontos do texto.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/22, que transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro do domínio da Marinha para estados, municípios e proprietários privados, abrindo caminho para a privatização das praias, está em discussão no Senado e vem dominando o debate político no país.
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Nesta segunda-feira (3), o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o governo Lula é frontalmente contra a proposta e que vai trabalhar para que ela não seja aprovada. Além disso, uma consulta pública no site do Senado sobre o tema mostra que a grande maioria da população é contra a PEC.
Diante deste cenário, Flávio Bolsonaro decidiu fazer um leve recuo. Em entrevista à coluna da jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo, o senador afirmou que vai alterar o trecho da PEC que prevê que quem ocupa os terrenos da Marinha, isto é, terrenos da União, seja obrigado a comprá-los.
A mudança proposta pelo filho de Jair Bolsonaro visa estabelecer que a transferência da propriedade será facultativa. Ainda assim a brecha para que esses terrenos possam ser comprados por entes privados seguirá presente.
Outro ponto a ser alterado é o que prevê a transferência de propriedade de portos, aeródromos e pistas de pouso operados em regime de autorização ao longo da costa brasileira.
“Teremos que olhar melhor como é que fica a situação das pessoas que não quiserem comprar. Como seria? As terras iriam a leilão, ou continuariam com a União? É preciso ter uma transição e essa opção deve ser facultativa. Quem quiser comprar, vai comprar, e quem não quiser vai continuar pagando o aluguel [foro ou laudêmio] à União”, disse Flávio Bolsonaro.
Câmara já aprovou proposta em 2022
Muita gente não sabe, mas o projeto que abre espaço para a privatização de praias havia sido aprovado em fevereiro de 2022 pela Câmara dos Deputados - e com esmagadora maioria.
Registrada na Câmara como PEC 39/11, a proposição - um substitutivo do deputado Alceu Moreira (MDB-RS) -, à época, foi aprovada em dois turnos com 377 votos a favor, 93 contrários e 1 abstenção. Bancadas dos partidos de esquerda e centro-esquerda (PT, PSOL, PSB e Rede) votaram contra o projeto que pode restringir o acesso da população às praias brasileiras. Já a maior parte dos partidos do centrão e toda a bancada do PL, legenda de Jair Bolsonaro, votaram sim.
Em meio às discussões da proposta naquele período, a deputada federal Sâmia Bonfim (PSOL-SP), por exemplo, já havia alertado que, na prática, a PEC culminaria na privatização das praias, chamando atenção para os riscos ambientais do projeto.
Veja vídeo:
Governo Lula se manifesta
A privatização das praias, que está em discussão no Senado a partir da PEC 3/2023 e que possui relatoria do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que já demonstrou ser favorável ao conteúdo da proposta, levantou uma ampla discussão no último final de semana.
O tema ganhou ampla exposição após a atriz Luana Piovani levar a pauta para as suas redes sociais e colocar em discussão. Posteriormente, o assunto ganhou ainda mais atenção quando a atriz revelou que o jogador Neymar seria um apoiador de tal medida. As duas celebridades trocaram farpas por meio das plataformas digitais.
Em todo o caso, o assunto "privatização das praias" dominou as redes sociais durante todo o feriado de Corpus Christi e chegou ao governo Lula, que se posicionou contra a medida. Quem fez a revelação foi o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, durante uma coletiva de imprensa realizada nesta segunda-feira (3).
"O governo é contrário a qualquer programa de privatização das praias públicas, que cerceiam o povo brasileiro de poder frequentar essas praias. Do jeito que está a proposta, o governo é contrário a ela”, iniciou o ministro Alexandre Padilha.
“Foi feito uma audiência pública que de uma certa forma teve uma coisa positiva: deu visibilidade ao tema. A audiência pública deu visibilidade, deu pauta, teve a Luana Piovani e Neymar discutindo sobre isso. Todo mundo agora está sabendo que o tema existe, então foi bom ter tido essa audiência pública [...] o governo é contrário a proposta do jeito que está nesse texto”, concluiu Alexandre Padilha.
Confira no vídeo abaixo a declaração do ministro do governo Lula sobre a privatização das praias:
Entenda a PEC da privatização das praias
O Senado Federal retomou, no dia 27 de maio, a discussão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, que transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro da União para estados, municípios e proprietários privados. O texto tem como relator o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
De acordo com a Constituição, o litoral brasileiro pertence à Marinha, ou seja, à União. A PEC propõe, justamente, a transferência, mediante pagamento, das praias aos seus ocupantes particulares e, gratuitamente, quando ocupados por estados ou municípios.
Com origem na Câmara dos Deputados, a proposta revoga o inciso VII do caput do artigo 20 da Constituição Federal e o parágrafo 3º do artigo 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
Com a retomada da pauta, que aconteceu por meio de uma audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), políticos e organizações ambientais se manifestaram contra a proposta, que representa um perigo ambiental.
O Observatório do Clima ressaltou que a PEC é mais um projeto do Pacote de Destruição que avança no Congresso Nacional. "Isso põe em risco todo o nosso litoral, a segurança nacional, a economia das comunidades costeiras e nossa adaptação às mudanças climáticas. Pressione os senadores a votarem contra", pontuou a organização.
Já o Grupo de Trabalho para Uso e Conservação Marinha, da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional emitiu uma nota em que afirma que a proposta representa uma “grave ameaça ambiental às praias, ilhas, margens de rios, lagoas e mangues brasileiros e um aval para a indústria imobiliária degradar, além de expulsar comunidades tradicionais de seus territórios”.
A audiência pública foi proposta pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE), que afirmou que a extinção dos "terrenos de Marinha" pode impactar o Balanço Geral da União (BGU) e as receitas correntes da União. Assim, "torna-se fundamental que a matéria seja debatida e aprimorada em audiência pública", defendeu o senador.