DESCRIMINALIZAÇÃO

VÍDEO - Barroso sobe o tom e desmente Mendonça no julgamento sobre maconha: "Tom panfletário"

Presidente do STF e ministro "terrivelmente evangélico" indicado por Bolsonaro bateram boca em discussão que envolveu até mesmo bispo católico

Luís Roberto Barroso e André Mendonça, do STF.Créditos: STF/Divulgação
Escrito en POLÍTICA el

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, subiu o tom contra André Mendonça e desmentiu o ministro logo na abertura da sessão desta quinta-feira (20) que retomou o julgamento que pode descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. O placar está em 5 x 3 pela descriminalização, mas a análise foi interrompida após divergência aberta pelo ministro Dias Toffoli e será retomada na próxima terça-feira (25).

Ao iniciar a sessão, Barroso citou uma conversa que teve com o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Jaime Spengler, na qual o religioso teria manifestado preocupação com a possibilidade da Corte "legalizar a drogas". O presidente do do STF, então esclareceu que o que estava em julgamento não era a legalização, mas sim a determinação de critérios objetivos para diferenciar usuários de traficantes, estabelecendo que o usuário deve ser enquadrado na esfera administrativa e não penal. 

"Ninguém está legalizando drogas, drogas continuam sendo ato ilícito. Estamos discutindo a natureza da punição e apenas fixando a quantidade que distingue porte para consumo pessoal de tráfico. É o legislador que trata diferentemente, porte e tráfico. O que nós estamos fazendo é definindo a quantidade que diferencia uma coisa da outra porque se não fizermos passa a ser um critério aleatório que cada policial pode utilizar quando apreenda ou quando detecte a presença da substância em alguma pessoa, alguma parte da cidade", declarou Barroso. 

André Mendonça, o ministro "terrivelmente" evangélico que foi indicado ao STF por Jair Bolsonaro, então, interrompeu Barroso para dizer que o presidente da CNBB não foi vítima de desinformação e que concorda com o religioso sobre a tese de que o Supremo estaria legalizando as drogas. 

"Não creio que Ele não é vítima de desinformação. A opinião dele é compartilhada por mim, está consignada no meu voto", disse Mendonça. 

Barroso, porém, cortou seu colega de Corte e o desmentiu, afirmando que conversou com o bispo dom Jaime Spengler e que o próprio o confirmou que achava que o que estava em votação era a legalização das drogas. 

"André, me desculpe, mas ele me disse que não estava ciente de que estava ciente da discussão. Por isso me comprometi a esclarecer no início da sessão", disparou Barroso. 

A discussão prosseguiu e, ao final, Barroso chegou a subir o tom de voz contra Mendonça. Veja vídeo: 

Toffoli abre divergência 

O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quinta-feira (20) o julgamento sobre o recurso que visa descriminalizar o porte de maconha e estabelecer uma quantia que diferencie o usuário do traficante. 

Na retomada do julgamento, foi a vez do ministro Dias Toffoli dar o seu voto, que foi contrário ao recurso. Porém, o ministro destacou que os usuários não são criminosos e afirmou que o estabelecimento da quantia deve ser discutido entre o poder Legislativo, Executivo e Anvisa. Na visão de Toffoli, a lei vigente já assume que o porte de drogas, por si só, não é crime. Por isso ele votou contra o recurso.

Em seu voto, o ministro votou para manter válido o trecho da Lei de Drogas vigente no Brasil sobre o porte de entorpecentes para consumo pessoal. Na leitura do ministro, o que se precisa é aplicar as medidas socioeducativas já previstas na legislação. Dessa maneira, o magistrado abriu uma nova divergência ao afirmar que a atual legislação já presume que o ato de portar drogas não é crime.

Além disso, o ministro defendeu que seja estipulado um prazo de 18 meses para que os poderes Legislativo e Executivo formulem uma legislação sobre drogas que seja objetiva na diferenciação entre usuário e traficante. Ele também entende que a estipulação de uma quantidade para consumo próprio seja estabelecida pelos poderes em questão.

Com isso, o placar permanece com 5 votos favoráveis à descriminalização do porte e 3 contrários, com uma nova divergência defendida pelo ministro Dias Toffoli. Falta apenas um voto para que a Corte forme maioria a favor da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. O julgamento será retomado na próxima terça-feira (25) com o voto do ministro Luiz Fux. 

Descriminalização do porte de maconha: entenda o julgamento

O STF realiza julgamento sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. O A análise do tema foi iniciada pelo em 2015 a partir da análise da constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), baseado em um fato concreto de prisão por porte de 3 gramas de maconha. 

Apesar do julgamento tratar do porte de drogas como um todo, os ministros que votaram a favor da descriminalização o fizeram apenas com relação maconha. 

O STF, porém, não vai "legalizar a maconha" ao final do julgamento. Isso porque descriminalizar o porte para consumo pessoal não significa a legalização total, visto que a produção, venda e distribuição de maconha ou de qualquer droga seguem proibidos no Brasil. 

O efeito prático, caso o porte para consumo próprio seja, de fato, descriminalizado, seria apenas impedir que pessoas flagradas portando pequenas quantidades de maconha, desde que comprovado que é para uso pessoal, não sejam penalizadas. Atualmente, a Lei de Drogas considera crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal e prevê penas como prestação de serviços à comunidade.

A interpretação do que é quantidade para "consumo pessoal" e o que configura tráfico, entretanto, é feita, a princípio, pelas polícias, que recorrentemente consideram pretos e pobres como traficantes e pessoas brancas, de classe média ou alta como usuários. O julgamento do STF, portanto, atacaria este cenário e definiria, exatamente, qual a quantidade de droga que pode ser considerada para uso pessoal.