Já imaginou ter que pagar simplesmente para ficar um guarda-sol na areia de uma praia, tal como acontece em alguns países da Europa, como na Itália? É o que pode acontecer no Brasil caso o Congresso Nacional aprove a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, cuja discussão foi retomada nesta segunda-feira (27) no Senado. A PEC vem sendo considerada uma iniciativa para "privatizar" praias e rios.
O projeto, que tem como relator o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro da União para estados, municípios e proprietários privados, o que na prática poderia limitar o acesso da população às faixas de areia, a depender do empreendimento feito pelo novo "dono" do local.
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A maioria esmagadora da população brasileira, entretanto, rechaça a proposta. O site do Senado, através da plataforma e-Cidadania, abriu uma consulta pública sobre a PEC 3 e o resultado até o momento é avassalador: são mais de 59 mil votos "não" para o projeto, contra pouco mais de 964 votos "sim".
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Entenda
O Senado Federal retomou, nesta segunda-feira (27), a discussão sobre a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/2022, que transfere a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro da União para estados, municípios e proprietários privados. O texto tem como relator o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
De acordo com a Constituição, o litoral brasileiro pertence à Marinha, ou seja, à União. A PEC propõe, justamente, a transferência, mediante pagamento, das praias aos seus ocupantes particulares e, gratuitamente, quando ocupados por estados ou municípios.
Com origem na Câmara dos Deputados, a proposta revoga o inciso VII do caput do artigo 20 da Constituição Federal e o parágrafo 3º do artigo 49 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).
Com a retomada da pauta, que acontece por meio de uma audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), políticos e organizações ambientais se manifestaram contra a proposta, que representa um perigo ambiental.
O Observatório do Clima ressaltou que a PEC é mais um projeto do Pacote de Destruição que avança no Congresso Nacional. "Isso põe em risco todo o nosso litoral, a segurança nacional, a economia das comunidades costeiras e nossa adaptação às mudanças climáticas. Pressione os senadores a votarem contra", pontuou a organização.
Já o Grupo de Trabalho para Uso e Conservação Marinha, da Frente Parlamentar Ambientalista do Congresso Nacional emitiu uma nota em que afirma que a proposta representa uma “grave ameaça ambiental às praias, ilhas, margens de rios, lagoas e mangues brasileiros e um aval para a indústria imobiliária degradar, além de expulsar comunidades tradicionais de seus territórios”.
A audiência pública desta segunda-feira foi proposta pelo senador Rogério Carvalho (PT-SE), que afirmou que a extinção dos "terrenos de Marinha" pode impactar o Balanço Geral da União (BGU) e as receitas correntes da União. Assim, "torna-se fundamental que a matéria seja debatida e aprimorada em audiência pública", defendeu o senador.
Em postagem no X (antigo Twitter), o senador se posicionou contra a PEC, que afirmou ser mais "um absurdo".
Em defesa da PEC, Flávio Bolsonaro afirma que a mudança é necessária para regularizar as propriedades localizadas nos terrenos da Marinha. Segundo ele, "há no Brasil inúmeras edificações realizadas sem a ciência de estarem localizadas em terrenos de propriedade da União”.
“Não nos parece justo que o cidadão diligente, de boa-fé, que adquiriu imóvel devidamente registrado e, por vezes, localizado a algumas ruas de distância do mar, perca sua propriedade após vários anos em razão de um processo lento de demarcação", diz no relatório da PEC.
Impacto nas mudanças climáticas
A diretora do Departamento de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ana Paula Prates, explicou em entrevista à Rádio Nacional que os terrenos funcionam como uma proteção contra as mudanças climáticas.
“Acabar com essa figura é um retrocesso enorme. A PEC termina com essa figura dos terrenos de Marinha, que são terrenos da União, e passa gratuitamente para estados e municípios, para poder, inclusive, privatizar essas áreas”, disse.
Ana Paula também acrescentou que a PEC, em si, não privatiza as praias, mas dificulta o acesso a elas e pode levar à uma privatização futura. “Na hora em que esses terrenos todos que ficam após as praias forem privatizados, você começa a ter uma privatização do acesso a elas, que são bens comuns da sociedade brasileira”.