Ex-secretária de Flávio Dino no Ministério da Justiça e presidente da Comissão de Proteção de Dados do Conselho Federal da OAB, a advogada Estela Aranha desmontou uma das principais narrativas dos chamados “Twitter Files Brazil”, divulgados pelo jornalista americano Michael Shellenberger, que serviu de álibi para Elon Musk iniciar os ataques a Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e à democracia brasileira.
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Ao analisar a publicação de Shellenberger, a advogada desmonta uma das principais "denúncias" feitas em parceria com dois jornalistas brasileiros, que atuam em site bolsonarista: de que "Moraes e outros funcionários do governo ameaçaram processar criminalmente o advogado do Twitter no Brasil se ele não entregasse informações privadas e pessoais, incluindo números de telefone das pessoas e suas mensagens diretas pessoais".
Segundo a advogada, embora tente "relacionar esse caso a uma tentativa das cortes superiores brasileiras usarem políticas de moderação das plataformas", o único processo criminal contra a Rede X foi feita pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo, que visava obter dados de um perfil ligado a uma liderança do PCC.
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"A troca de emails dos funcionários do twitter que ele publica refere-se a uma ação do GAECO do Ministério Público de SP, que pede acesso a dados cadastrais, no seu poder legal de requisição, visando prender uma liderança do PCC em uma ação contra o tráfico de drogas", revela Estela.
Segundo ela, a discussão jurídica do processo nada tem a ver com “liberdade de expressão”. O pedido do Gaeco, no entanto, sobre os dados do criminoso é negado duas vezes pelo Twitter, que alega que "somente poderia entregar os dados por determinação judicial".
"Não tem STF, TSE, não tem Ministro Alexandre de Moraes, não tem liberdade de expressão ou debate politico. Esses trechos de comunicações internas entre funcionários do twitter nada tem com o STF e foram usados para manipular o debate. Uma bela narrativa sem base fática", diz a advogada, desmontando a narrativa.
"Estou falando dos trechos da narrativa que se referem a ação criminal contra funcionário do Twitter. Como disse no primeiro fio, eles misturam um monte de coisas sem conexão uma com a outra, para criar uma narrativa", alerta, ressaltando que "esse é o único procedimento em âmbito criminal contra advogado do Twitter que existia" no período das trocas de e-mails revelada pelo jornalista estadunidense.
Musk é representando no Brasil pelo advogado e cientista social Diego de Lima Gualda, que se define como "diretor jurídico no Twitter". No entanto, o advogado consta como sócio - cumprindo exigência legal para empresas estrangeiras atuarem no país - do Twitter International e da T.I. Brazil Hodings, responsáveis pela rede de Musk no Brasil.
Contestação
Estela ainda rebateu um dos jornalistas brasileiros parceiros na "investigação", David Ágape, que admite que "o comentário do Mike [Shellenberger] tem uma imprecisão".
"De fato, não foi Moraes que processou o advogado, mas o Ministério Público", diz. Ele ainda ataca a advogada ao dizer que a ex-secretária do Ministério da Justiça "desinforma em dizer que 'não tem STF, TSE, não tem Ministro Alexandre de Moraes', fazendo parecer que tudo se resume a esse caso do MP de SP".
"Se você tivesse tido a pachorra de ler nosso trabalho, ou as versões traduzidas para te facilitar, teria visto que há diversas menções a Moraes e ao TSE nos outros emails do Twitter Files Brasil", diz o jornalista do site bolsonarista.
Estela, então, desmonta a contestação, afirmando que os e-mails da "investigação" e "denúncia" contra Moraes são justamente dos advogados que "defendem os interesses da empresa, sobre diversas decisões que não tem conexão, em diferentes âmbitos (nesse caso de investigação criminal sobre atuação do MPSP) para criar uma narrativa".
"Em um fio anterior, que comento todo o caso, afirmo: estão misturando os debates do time jurídico de casos bem diferentes, como se fosse tudo uma coisa só. Como se a investigação criminal/entrega de dados nesse caso tivesse a ver com liberdade de expressão, cortes superiores", emenda a advogada.
Veja as sequencias de publicações na rede X
Inelegibilidade
A defesa de Jair Bolsonaro (PL) estuda usar os chamados “Twitter Files Brazil”, que motivaram o levante do bilionário, como "fato novo" para tentar reverter as decisões do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que deixaram o ex-presidente inelegível até 2030.
Segundo Bela Megale, no jornal O Globo, a ideia é discutida pelos advogados de Bolsonaro, que pretendem "surfar na onda" dos ataques do bilionário ao ministro, à democracia e ao presidente Lula nas redes.
A divulgação dos chamados “Twitter Files Brazil” motivou os ataques de Musk à democracia brasileira e incediou a ultradireita bolsonarista.
Após os ataques do bilionário, que foi incluído por Moraes no inquérito das fake news, Bolsonaro divulgou um vídeo de um encontro em que diz que "Elon Musk é o mito da nossa liberdade”.
Nesta terça-feira (9), o ministro do STF impôs uma derrota ao bilionário ao negar uma exigência do escritório da rede ‘X’ no Brasil para que processos contra a plataforma não fossem direcionadas à representação brasileira da empresa, mas sim remetidos à matriz da companhia, nos EUA.
Na decisão, Moraes salientou que a atitude do ‘X’ de pedir para não ser responsabilizado no Brasil pelas ações da empresa e de seu dono, uma vez que o Judiciário brasileiro não tem jurisdição no exterior, “beira a litigância de má-fé”.
“Não há dúvidas da plena e integral responsabilidade jurídica, civil e administrativa da X Brasil Internet Ltda., bem como de seus representantes legais, inclusive no tocante a eventual responsabilidade penal, perante a Justiça brasileira”, disse Moraes em sua decisão que negou o pedido da companhia de Elon Musk.
O ministro, no fim de sua decisão, deixou claro que o objetivo do ‘X’ é simplesmente seguir impune, reivindicando uma espécie de imunidade para fazer o que bem entende no Brasil e não poder receber processos judiciais.
“Em última análise, a empresa requerente busca uma verdadeira cláusula de imunidade jurisdicional, para a qual não há qualquer previsão na ordem jurídica nacional. Pelo contrário: o fato de que uma das chamadas operadoras internacionais compõe o seu quadro social sugere um abuso da personalidade jurídica, pois poderia optar por não atender às determinações da Justiça brasileira sem sofrer qualquer consequência, encoberta por sua representante no Brasil”, concluiu Moraes.