PRISÃO À VISTA?

Moraes desmente defesa e obriga Bolsonaro a se apresentar à PF

Defesa de Jair Bolsonaro havia avisado que ex-presidente não compareceria ao depoimento no âmbito do inquérito que apura tentativa de golpe; ministro, entretanto, retruca e dá recado

Alexandre de Moraes e Jair Bolsonaro.Créditos: Carlos Moura/SCO/STF/Valter Campanato/Agência Brasil
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O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou nesta segunda-feira (19) pedido feito pela defesa de Jair Bolsonaro para adiar o depoimento à Polícia Federal (PF). O ex-presidente foi intimado a depor aos policiais no âmbito do inquérito que apura tentativa de golpe de Estado. O interrogatório está marcado para quinta-feira (22). 

Mais cedo, a defesa de Bolsonaro havia avisado ao STF que o ex-presidente não comparecerá à PF para prestar o depoimento e que ele só iria cumprir a intimação quando tivesse acesso a todo o conteúdo dos celulares apreendidos durante os mandados de busca cumpridos no âmbito do inquérito. Na prática, seus defensores querem saber tudo que os outros investigados falaram sobre o golpe fracassado, sobre o próprio ex-presidente, assim como tomar conhecimento sobre qualquer mensagem atribuída ao antigo mandatário que possa ter sido armazenada nesses dispositivos dos aliados.

No despacho de resposta ao "aviso" da defesa de Bolsonaro, entretanto, Alexandre de Moraes desmentiu os advogados, afirmando que eles já tiveram acesso a todo o conteúdo das investigações, e autorizou a PF a manter a data do depoimento. O ex-presidente, portanto, é obrigado a depor, sob pena de sanções, como condução coercitiva (caso falte a mais de um depoimento) e, em último caso, eventual decretação de prisão preventiva. 

"Informe-se a Polícia Federal que inexiste qualquer óbice para a manutenção da data agendada para o interrogatório uma vez que aos advogados do investigado foi deferido integral acesso aos autos", escreveu o ministro. 

Confira trecho do despacho: 

Reprodução

Bolsonaro pode faltar ao depoimento? 

Fórum ouviu juristas sobre a negativa de Bolsonaro de comparecer para novo depoimento na PF, questionando se tal atitude seria legal e se, de alguma forma, poderia influenciar numa decisão de decretação de sua prisão preventiva, ou mesmo resultar numa condução coercitiva.

“Não, Bolsonaro não pode fazer isso. Como o STF tem se posicionado sobre essas coisas? O investigado tem o direito de permanecer calado, mas não tem o direito de não comparecer... Um não comparecimento pode ser porque está doente, porque tem outro compromisso inadiável, mas é obrigação comparecer... E comparecendo, tem o direito de permanecer calado... Mas a obrigação de responder à convocação da autoridade, ela é exigida pela lei... Se ele não comparece, sem motivo justificado, ele pode ser conduzido coercitivamente... Portanto, Bolsonaro está arriscando ser conduzido ‘abaixo de vara’, entre aspas, como dizia-se antigamente”, explicou o jurista Fernando Augusto Fernandes.

Já para o coordenador do Grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, a opinião é similar, embora o jurista saliente que os casos de condução coercitiva, segundo a lei, são aplicados quando o intimado não comparece para o depoimento por três vezes.

“Ninguém nega que ele [Bolsonaro] tenha e use plenamente do direito de defesa, e entre uma das estratégias, há o silêncio, mas o que ele não pode fazer, a pretexto de ficar calado, é simplesmente não comparecer. Ele recebeu um chamado e existe uma regra na legislação penal e processual penal para isso... E se ele se negar a comparecer por mais de três vezes, sem justificativa, ele pode ser conduzido ‘sob vara’... Que é esse mesmo o termo, o jargão, para uma condução coercitiva”, frisou Carvalho.

Já para Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, a situação, em tese, seria passível da aplicação de uma condução coercitiva, mas ele destaca que tal procedimento, por prática, acaba se aplicando apenas às testemunhas, o que não é o caso de Jair Bolsonaro, que é investigado.

“É normal que o advogado queira ter acesso a toda a documentação antes de levar o cliente para depor. Se por acaso a PF insistir no depoimento, ele pode levá-lo e exercer o direito de ficar calado e isso não aumenta em nada a hipótese de prisão, até porque ele não teve acesso a tudo... Tem que comparecer, seria um caso típico de uma condução coercitiva, mas como ele é investigado, não será conduzido... A condução coercitiva ficou tão somente para quem é testemunha. Se a testemunha é intimada e não comparece ela pode ser reconduzida. É obrigada a falar tudo o que sabe... O investigado tem o direito ao silêncio, logo não precisa sequer comparecer”, disse o jurista.