Na manhã da terça-feira, dia 19, o Brasil acordou com a notícia de que o plano do ex-presidente Bolsonaro e sua organização criminosa que pretendia um golpe de Estado em 2022 para impedir a posse do presidente eleito Lula, ia muito além do que se poderia imaginar.
Segundo investigações da Polícia Federal, a partir de depoimentos e acesso a material colhido em operações anteriores, parte da operação criminosa tinha como objetivo assassinar o à época presidente eleito, Lula, seu vice, Geraldo Alckmin, e o presidente do TSE à época e ministro do STF Alexandre de Moraes.
A convocação para a reunião golpista foi feita pelo general Braga Netto, ministro da Defesa e vice na chapa perdedora de Jair Bolsonaro, ainda presidente da República. Braga Netto marcou a reunião em sua casa onde seriam debatidos pontos do plano de golpe de Estado desenhado pelo general Mário Fernandes, secretário de Bolsonaro e até pouco tempo antes comandante geral das Forças Especiais do Exército, a tropa de elite da corporação, conhecidos como kids pretos. O golpe foi impresso no Palácio do Planalto e levado ao Alvorada pelo general para um encontro com Bolsonaro.
Aparentemente, os golpistas ficaram animados com a nota divulgada no dia anterior, 11 de dezembro de 2022, pelas Forças Armadas, que "autorizavam" oficialmente os acampamentos golpistas diante dos quartéis, onde bolsonaristas exigiam golpe de Estado.
A nota não citava os acampamentos, mas foi entendida pelos manifestantes como um sinal verde para que eles continuassem diante dos quartéis. As manifestações se avolumaram e em alguns dias mais de 100 mil pessoas se aglomeraram diante do QG do Exército.
A Constituição Federal estabelece os deveres e os direitos a serem observados por todos os brasileiros e que devem ser assegurados pelas Instituições, especialmente no que tange à livre manifestação do pensamento; à liberdade de reunião, pacificamente; e à liberdade de locomoção no território nacional.
Nesse aspecto, ao regulamentar disposições do texto constitucional, por meio da Lei nº 14.197, de 1º de setembro de 2021, o Parlamento Brasileiro foi bastante claro ao estabelecer que: “Não constitui crime [...] a manifestação crítica aos poderes constitucionais nem a atividade jornalística ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais, por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais”.
Assim, são condenáveis tanto eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos, quanto eventuais excessos cometidos em manifestações que possam restringir os direitos individuais e coletivos ou colocar em risco a segurança pública; bem como quaisquer ações, de indivíduos ou de entidades, públicas ou privadas, que alimentem a desarmonia na sociedade. [trecho da nota]
Estranhamente, na mesma nota das Forças Armadas os comandantes das Três Forças se colocam como sommeliers da Constituição, destacando a importância de um dos Poderes, o Legislativo, em relação aos outros, num stilo que parece ter sido escrito por Bolsonaro:
Da mesma forma, reiteramos a crença na importância da independência dos Poderes, em particular do Legislativo, Casa do Povo, destinatário natural dos anseios e pleitos da população, em nome da qual legisla e atua, sempre na busca de corrigir possíveis arbitrariedades ou descaminhos autocráticos que possam colocar em risco o bem maior de nossa sociedade, qual seja, a sua Liberdade. [outro trecho a nota]
A inclusão desse parágrafo na nota emitia claro sinal ao Judiciário no sentido de não emitir ordens de remoção dos golpistas diante dos quartéis.
Animados com a nota dos comandantes militares, o grupo golpista reunido na cada de Braga Netto discutiu o plano, que hoje sabemos incluía os assassinatos de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes e a instalação de um governo do golpe.
Na manhã de terça, vários dos golpistas foram presos. Ontem, dia 21, outros deles foram indiciados, entre eles, os generais Heleno, Braga Netto, Paulo Sérgio (ex-comandante do Exército e ministro da Defesa), Mário Fernandes e o chefe de tudo, Jair Bolsonaro, que sempre ameaçou agir "fora das quatro linhas" quando achasse necessário, durante todo o seu mandato.
À luz do que sabemos hoje, fica evidente que a Nota das Forças Armadas foi um sinal verde para os golpistas partirem para a ação.
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