O Exercito mantém na ativa 19 militares envolvidos no caso da "Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro", um documento golpista que buscava pressionar o comando militar a impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2022. A confirmação, feita por meio de um pedido de acesso à informação, reforça a gravidade do episódio, enquanto o Exército mantém sob sigilo informações detalhadas sobre os envolvidos.
A carta foi escrita por quatro oficiais superiores, incluindo dois coronéis da ativa, e assinada por outros 33 militares, totalizando 37 envolvidos e divulgada em um momento crítico, quando apoiadores de Jair Bolsonaro acampavam em frente a quartéis exigindo intervenção militar. O documento apócrifo, publicado em 29 de novembro de 2022, fazia apelos explícitos por uma ruptura democrática e atacava diretamente instituições como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Abertura de inquérito formal
O Exército chegou a instaurar, no final de agosto, um Inquérito Policial Militar (IPM) para investigar formalmente quatro coronéis apontados como autores da redação e publicação da carta. Entre os investigados estão Alexandre Castilho Bitencourt da Silva e Anderson Lima de Moura, da ativa, e Carlos Giovani Delevati Pasini e José Otávio Machado Rezo Cardoso, da reserva.
Segundo a sindicância prévia, esses quatro militares teriam cometido possíveis crimes militares relacionados à elaboração e divulgação do texto. Os outros 33 signatários são acusados de transgressões disciplinares e são alvos de punições administrativas que variaram de advertências a detenções, dependendo da gravidade da infração e do julgamento de seus comandantes.
Entre os punidos, há 12 coronéis, nove tenentes-coronéis, um major, três tenentes e um sargento. No entanto, mesmo com as punições, 19 desses militares permanecem na ativa, fato que tem gerado críticas de especialistas e levantado dúvidas sobre a efetividade das ações do Exército para preservar a hierarquia e a disciplina.
Impacto político e institucional
A "Carta ao Comandante" foi escrita em um contexto de escalada das tensões políticas, quando bolsonaristas radicais pressionavam as Forças Armadas a intervir contra o resultado eleitoral. Investigação da Polícia Federal revelou que o texto foi enviado ao tenente-coronel Mauro Cid, então ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, antes de ser divulgado publicamente, indicando um possível alinhamento entre militares e lideranças civis em um plano para desestabilizar a democracia.
O conteúdo da carta fazia referência à suposta responsabilidade das Forças Armadas como "reais guardiões da Constituição" e apelava para o "restabelecimento imediato da lei e da ordem", justificando a insatisfação popular com as instituições democráticas. Apesar do tom golpista, o Exército afirma que apenas os quatro autores do texto são formalmente investigados por possíveis crimes, enquanto os demais signatários foram tratados como transgressores disciplinares.
Crise de imagem e desafios para as Forças Armadas
A permanência de 19 militares da ativa envolvidos no caso expõe um dilema para o comando militar. Enquanto o general Tomás Paiva, comandante do Exército, enfatiza a necessidade de preservar a credibilidade e os valores constitucionais da instituição, a falta de medidas mais firmes contra os envolvidos gera desconfiança pública.
Além disso, a decisão do Exército de manter sigilo sobre os nomes e funções dos militares da ativa ligados ao episódio levanta questionamentos sobre transparência e a verdadeira disposição da instituição em lidar com atos que desafiam diretamente a ordem constitucional.
O que está em jogo
Os desdobramentos das investigações terão impacto direto na relação entre as Forças Armadas, o governo e a sociedade. A expectativa é que o Exército demonstre compromisso com a hierarquia, a disciplina e os valores democráticos, punindo de forma exemplar os responsáveis e garantindo que episódios semelhantes não voltem a ocorrer.
A crise de imagem que envolve o caso da "Carta ao Comandante" sublinha a urgência de um reposicionamento estratégico das Forças Armadas, tanto em sua governança interna quanto em sua atuação pública. Mais do que nunca, a resposta do Exército será crucial para reforçar a confiança da sociedade em sua neutralidade e compromisso com a Constituição.