Apesar do candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PRTB, Pablo Marçal, ter dito que organizou um “grande mutirão humanitário” para ajudar as vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul, que distribuiu “4 milhões de quilos” (equivalente a 4 toneladas) de alimentos e que enviou 206 caminhões carretas à época para ajudar as vítimas, as “ações” foram apenas divulgadas nas redes sociais.
Acompanhe a apuração ao vivo aqui
Te podría interesar
Na verdade, os centros de distribuição criados no Rio Grande do Sul não foram confirmados. Embora ele tenha afirmado ter criado e aberto dez centros, uma investigação da revista Piauí revelou que pelo menos alguns dos endereços divulgados não correspondem a locais criados por seu “mutirão”. O estabelecimento chamado Mercadinho GG, em Guarulhos, inclusive foi o responsável por receber as doações entre abril e maio deste ano.
A Avenida Purús, onde está localizado o Mercadinho, não se encontra no Rio Grande do Sul, mas na Grande São Paulo. A chave Pix desse estabelecimento foi o destino das doações arrecadadas por Marçal. A campanha foi divulgada em suas redes sociais, com um apelo para ajudar "nossos irmãos" e um panfleto digital que mostrava imagens de enchentes. A origem da disseminação dessa mensagem foi em uma publicação no Facebook em 4 de maio, na página oficial do goiano.
Te podría interesar
Ali, panfletos digitais, com moldura verde escura, exibiam imagens de rios transbordando e invadindo ruas. O post incluía um apelo: “Vamos ajudar nossos irmãos”, juntamente com os dados bancários para doações. A identidade visual trazia o logotipo dele, com a palavra "Pablo", onde a última letra era formada pelo primeiro círculo do símbolo do infinito.
O nome do Mercadinho GG viralizou, ultrapassando os seguidores de Marçal. Em um acordo judicial que a reportagem acessou, uma mulher exigiu que a Telefônica depositasse R$ 4.500,00 em um mercadinho de Guarulhos, alegando que o estabelecimento estava auxiliando as vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul. No entanto, o gerente do mercadinho negou qualquer envolvimento com a campanha.
Em outros endereços, um localizado em Santa Cruz do Sul, que funciona uma loja de cristais, em outro, em Lajeado uma associação missionária que já realizava trabalhos sociais na região. Os responsáveis por esses locais confirmaram ter recebido ajuda, mas negaram qualquer ligação formal com a campanha de Marçal. “A gente nunca foi centro de distribuição de Pablo Marçal. Nós somos uma associação que já existia. Ele não montou”, afirmou a psicóloga Rosane Tunnermann, que coordenou o trabalho e é casada com um religioso da instituição.
Ela destacou que a maior parte do trabalho foi realizada por esses voluntários e pela própria comunidade local, sem o envolvimento direto de Marçal. Em Taquara, o endereço indicado por Marçal como um de seus centros de distribuição corresponde a um terreno amplo, onde funciona uma associação de motoristas. Segundo a secretária da entidade, Angela Boeira, o local foi utilizado temporariamente para armazenar doações, mas a iniciativa partiu da própria comunidade local. A associação negou qualquer vínculo com o mutirão de Marçal. A própria instituição nomeou o local de "Centro de Distribuição Paranhana Mais".
Maior propagador de desinformação da tragédia no RS
Um estudo realizado pelo laboratório de pesquisa da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ECO - UFRJ), o NetLab, identificou os maiores propagadores de desinformação da tragédia climática que ainda acomete o Rio Grande do Sul. Uma forte onda de notícias falsas e negacionistas acerca das doações, das iniciativas do governo federal e da crise climática circularam pelas redes sociais à época.
Muitas dessas fake news atacavam diretamente o governo federal. O ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Paulo Pimenta (PT-RS), chegou a expressar sua indignação com a situação. "É difícil de entender que em um momento de tamanha fragilidade, que pessoas se escondam em suas telas produzindo conteúdos que sabem ser mentirosos para que tenham algum tipo de ganho político ou econômico", disse ele.
O NetLab traçou uma análise do dia 27 de abril, quando começaram as chuvas intensas e alagamentos no estado, ao dia 10 de maio, e mapeou as principais informações falsas, além dos principais influenciadores, políticos, plataformas e narrativas compartilhadas pelos usuários. Nesse estudo, o grupo de pesquisa observou que o influenciador digital e ex-pré-candidato à presidência em 2022 pelo Partido Republicano da Ordem Social (PROS) Pablo Marçal e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) estavam entre os maiores disseminadores da desinformação.
Marçal, que oferece cursos de “desenvolvimento pessoal” e é proprietário do “La Casa Digital”, que ele define como “o maior Reality Show sobre Marketing Digital”, causou confusão nas redes sociais ao disseminar desinformação sobre as enchentes, acusando a Polícia Rodoviária Federal de impedir que as doações chegassem às vítimas.
Assim como Marçal, o filho 03 do ex-presidente afirmou que o governo federal impediu a entrada de caminhões com doações ao RS. Apesar da refutação dessa notícia, o deputado insistiu que a esquerda e a Globo estavam disseminando notícias falsas ao tentar “ocultar a realidade” do bloqueio de doações. Eduardo também atacou Lula e disse que ele “demorou” para autorizar o envio da Força Nacional ao RS. Além disso, repreendeu o presidente por visitar Santa Maria antes de Porto Alegre. No entanto, no dia da visita (2), Santa Maria era a cidade mais afetada do estado.
Entre as narrativas falsas mais compartilhadas e convincentes, estavam “Lula não está comprometido com as vítimas das enchentes”, “Marina insiste em culpar Bolsonaro por tragédia”, “Starlink é a única internet que está ajudando nos resgates”, “Show da Madonna recebeu recursos que deveriam ir pro RS”, “Governo está impedindo que doações cheguem às vítimas”, “As chuvas são um castigo de Deus”, “A tragédia foi planejada por globalistas” e “Figuras de direita estão ajudando mais que o governo”, apontou o estudo.