O NEXO PARLAMENTAR

Trama das bombas lança suspeita sobre general Girão, acusa Rogério Correia

General deputado teve contato com terrorista e falou em "surpresa de Natal" num comício

Coincidência.General Girão discursa em audiência pública tendo o terrorista Alan (vestindo camisa com bandeira do Brasil) ao fundoCréditos: Reprodução TV Senado
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A Polícia Federal tem prazo até o final da semana que vem para coletar o depoimento do deputado federal General Girão no inquérito aberto contra ele no Supremo Tribunal Federal por promover atos democráticos.

Nos meses de novembro e dezembro de 2022 e janeiro de 2023 o parlamentar teria incitado as Forças Armadas a agir contra outros Poderes.

Ele também fez publicações atacando a Justiça Eleitoral.

O deputado Rogério Correia (PT-MG), integrante da CPMI do Golpe, está interessado em saber se o parlamentar, do PSL do Rio Grande do Norte, teve conhecimento antecipado da trama para explodir múltiplas bombas em Brasília depois que o presidente eleito Lula foi diplomado.

Como mostrou o segundo capítulo do documentário da Fórum Filmes sobre o 8 de janeiro, em dezembro o general fez um discurso a apoiadores no acampamento diante do Batalhão do Exército de Natal.

Na fala, Girão sugeriu que os manifestantes colocassem um sapatinho na janela "que o Papai Noel vai chegar esta semana".

"Acreditem em Papai Noel", reforçou. Quando uma pessoa perguntou se poderia ser de verde, ele confirmou: "Camuflado".

Na madrugada da véspera de Natal, uma trama urdida no acampamento diante do QG do Exército em Brasília resultou na colocação de uma bomba num caminhão carregado de 60 mil litros de querosene, nas proximidades do aeroporto de Brasília.

Não se sabe a hora exata em que a bomba foi acionada e falhou.

A perícia não conseguiu determinar se os terroristas queriam esperar o caminhão entrar no aeroporto para descarregar e só então detonar os explosivos.

Os três envolvidos na trama estão presos, dois deles condenados.

George Washington deu depoimentos contraditórios. Num deles disse que recebeu a bomba pronta dentro do acampamento e apenas mexeu em um fio antes de entregá-la à dupla formada por Wellington Macedo e Alan Diego dos Santos Rodrigues.

Os dois levaram a bomba até o caminhão.

Foragido no Paraguai, Wellington foi preso recentemente e fez acordo de delação premiada com a Polícia Federal.

Falta saber exatamente quem financiou as bombas.

Quando a Polícia Civil de Brasília prendeu George Washington, descobriu na picape dele outras emulsões explosivas de pedreiras e detonadores.

Cabe ao Exército controlar o trânsito de explosivos no Brasil, que só podem ser comprados por CNPJs.

Investigadores ainda hoje se perguntam como os serviços de inteligência que monitoravam o acampamento de Brasília não foram capazes de se antecipar à fracassada ação terrorista.

Também falta esclarecer como é que Wellington e Alan sabiam que um caminhão carregado de querosene estava estacionado do lado de fora do aeroporto esperando a vez para descarregar.

Se a bomba explodisse o casco do caminhão, tinha potencial de fazer grande estrago, atingindo um posto de gasolina nas proximidades.

Além disso, o recuo onde estava o caminhão ficava sob a rota de pouso e a 300 metros de hangares e tanques com milhões de litros de querosene.

"O que se especula é que ele [deputado Girão] sabia que as bombas iam explodir lá", sustenta Rogério Correia.

O parlamentar mineiro se refere a outras bombas que deveriam ter explodido em Brasília, uma delas na rodoviária e outra numa subestação de energia elétrica.

Em 30 de novembro de 2022, com Lula eleito, o General Girão fez um discurso inflamado em uma audiência pública organizada por bolsonaristas no Congresso.

Foi um verdadeiro comício do golpe.

"Eu passei para a reserva por recusar a cumprir uma ordem absurda. A Polícia Federal deveria recusar a ordem de prender pessoas que não deveriam ser presas", ele afirmou, ao acusar o STF de agir como se fosse esquerdista.

O público se levantou para aplaudí-lo, inclusive o terrorista Alan Diego dos Santos, que estava sentado bem atrás do deputado.

Na audiência também estava George Washington, a menos de 20 metros do parlamentar.

Até hoje especula-se quem foi que autorizou a entrada dos dois no Congresso.

De acordo com a Folha de S. Paulo, no caso de George Washington a autorização foi dada pelo senador Zequinha Marinho, do Pará, o que demonstra que os terroristas tinham múltiplos contatos parlamentares.

Zequinha é um ferrenho defensor dos ruralistas no sul do Estado, onde George Washington atuava como gerente de postos de gasolina.

Em sua carreira militar, o deputado General Girão serviu como subcomandante do general Villas Bôas na ESAO, a escola de formação de oficiais.

Villas Bôas é o patrono no meio militar das ações que culminaram na derrubada de Dilma Rousseff e na prisão de Lula.

Na véspera do dia da diplomação de Lula, o terrorista George Washington disparou ao menos duas mensagens ao deputado General Girão e também se comunicou com o senador Eduardo Girão, que convocou a audiência golpista.

General Girão, vão esperar até quando para acionar os CACs? Tem CACs prontos! Acione general, coloque em treinamento militar intensivo

George Washington, ele mesmo um CAC -- Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador -- tinha viajado do Pará até Brasília fortemente armado, inclusive com um rifle com mira de longo alcance. Suspeita-se que ele considerou atirar em Lula durante a posse.

A mensagem de George Washington ao deputado Girão foi escrita na noite de 11 de dezembro de 2022, quando bolsonaristas ainda acreditavam ser possível impedir a diplomação de Lula.

Já o discurso do deputado Girão na capital do Rio Grande do Norte, garantindo que os golpistas teriam um "presente de Natal", foi no dia 19 de dezembro, quando a trama para explodir o aeroporto estava em andamento.