Carla Zambelli (PL-SP) e Guilherme Boulos (PSOL-SP) só têm em comum o fato de serem os deputados federais mais votados de São Paulo nas últimas eleições. No campo político, estão em espectros totalmente opostos: enquanto a deputada segue a linha da extrema direita e é uma apoiadora ferrenha de Jair Bolsonaro, o psolista é um representante da esquerda e compõe a base do governo Lula no Congresso Nacional.
Apesar das diferenças, Carla Zambelli, nesta quinta-feira (31), compareceu ao Salão Nobre da Câmara durante o lançamento da Frente Parlamentar Mista de Combate às Desigualdades para procurar Boulos. Ela foi até o deputado do PSOL, que estava sentado, e falou algumas palavras ao pé do ouvido do parlamentar antes de deixar o evento. A cena causou estranhamento entre os presentes.
À reportagem da Fórum, que questionou o que de fato ela falou para Boulos, Carla Zambelli revelou que foi até o deputado do PSOL para expressar solidariedade com relação ao caso de Glauber Braga (PSOL-RJ), correligionário de Boulos que, recentemente, teve suas contas bloqueadas por uma decisão judicial.
Uma das contas de Glauber Braga bloqueadas pela Justiça é a de ressarcimentos, onde são depositados pela Câmara valores para cobrir gastos parlamentares com transporte e hospedagem, por exemplo.
"Veio essa multa de um milhão pro Glauber Braga e eu li na imprensa que foram bloqueadas duas contas dele, a conta salário e a conta de ressarcimento. Eu não sei se você sabe como que funciona, mas cada deputado tem duas contas. Uma conta é uma conta normal dele, onde é pago o salário dele, e outra conta é do gabinete, que a gente chama de conta ressarcimento. Essa conta é de dinheiro público. Por exemplo, eu compro uma passagem aérea, eu tenho que comprar com o meu dinheiro e o ressarcimento público vem nessa conta", explicou Zambelli.
Na sequência, a deputada destacou que sua conta de ressarcimento já foi bloqueada por decisão judicial, assim como as contas de outros parlamentares.
"Então, se tem algum dinheiro nessa conta, é um dinheiro público, para a própria gestão do mandato. E no caso do Glauber, bloquearam essa conta também de ressarcimento, que já aconteceu comigo, está acontecendo, por exemplo, com o Vermelho, que é um deputado do PL. Aconteceu com o Daniel Silveira e com diversos outros deputados, inclusive com a Jandira Feghali do PCdoB", prosseguiu.
Em seguida, Carla Zambelli contou que foi até Guilherme Boulos para se colocar à disposição de procurar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para tratar sobre o assunto, já que há um parecer da diretoria geral da Casa prevendo que contas de ressarcimento não podem ser bloqueadas. Segundo a deputada, este tipo de bloqueio impede o exercício do mandato.
"O que eu conversei com o Boulos foi que a gente deveria, já que tem tantas pessoas que estão sofrendo esse tipo de injustiça, porque não se deve bloquear uma conta com dinheiro público, que eu estaria disposta a ir com eles até o Lira, porque já existe um parecer que a Jandira Feghali conseguiu da diretoria geral da Câmara, falando que essa conta de ressarcimento não pode ser bloqueada", pontuou.
"Então, eu prestei solidariedade em relação a isso. E tem um outro ponto de que estão bloqueando 100 % do salário dele, sendo que deveria ser só uma porcentagem, mas esse é um outro ponto que ele deve rever isso na Justiça. Já aconteceu comigo também, já aconteceu com o Daniel Silveira, aconteceu com outros colegas... Então, o que eu prestei solidariedade, me coloquei à disposição, foi de a gente tentar fazer com que o Lira faça um depoimento público sobre a conta de ressarcimento", finalizou Carla Zambelli.
Bloqueio das contas de Glauber Braga
Um dia após revelar que teve sua conta bloqueada e zerada por uma decisão judicial, o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) descobriu que até mesmo os ressarcimentos de suas despesas parlamentares feitos pela Câmara foram inviabilizados. O motivo é o fato de Glauber ter criticado uma decisão da Justiça que proibiu a realização de um ato em solidariedade a uma deputada agredida por bolsonaristas.
"Soube agora que, além da minha conta pessoal, o juiz SÉRGIO LOUSADA bloqueou também a de ressarcimento. É onde entram os valores que garantem o exercício do mandato: aluguel de escritório, passagem aérea… A dívida que ele impõe a mim nessa conta, agora, está em mais de 955 mil reais", escreveu o deputado, na última terça-feira (29), em publicação nas redes sociais.
O bloqueio das contas de Glauber Braga foi determinado pelo juiz Sergio Roberto Emilio Louzada, da 2ª Vara Cível de Nova Friburgo (RJ). O parlamentar teve sua conta bancária pessoal zerada e ficou sem salário após uma multa de R$ 1 milhão imposta pelo magistrado.
Louzada aplicou a multa contra Glauber Braga pelo fato do parlamentar ter convocado, através de suas redes sociais, um ato em solidariedade à deputada estadual Marina do MST (PT-RJ), que havia sido atacada por bolsonaristas em uma plenária realizada no dia 12 de agosto no distrito de Lumiar, em Nova Friburgo (RJ).
A partir da convocação de Glauber, alguns moradores e e instituições da região entraram na Justiça para proibir a manifestação, ao que o juiz Louzada emitiu uma liminar atendendo aos pedidos. O deputado classificou a decisão como um "absurdo", desmarcou a mobilização e, então, foi sozinho a Lumiar, no domingo (27), para conversar com a população sobre o caso.
Dois dias antes, no sexta-feira (24), entretanto, o juiz já havia condenado Glauber Braga por "afrontar" sua decisão, determinando a aplicação da multa de R$ 1 milhão, o bloqueio de suas contas e o envio do caso para o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.
Na segunda-feira (28), o deputado do PSOL se deparou com sua conta bancária totalmente zerada, pois a decisão judicial determinou o recolhimento de todo o seu salário para que a multa seja quitada.
"Não sou patrimonialista. O que recebo é utilizado pra pagar as minhas contas, da minha família e pra luta política. Agora, eu pergunto: é justo o juiz SERGIO LOUZADA me aplicar uma multa absurda de 1 milhão de reais e ir descontando cada real do salário até zerar a conta?", questionou o parlamentar através das redes sociais, junto a uma imagem que mostra seu extrato bancário.
"Agora 'só' devo novecentos e tantos mil. Isso é uma brincadeira de muito mal gosto. É na verdade um grave abuso. O motivo? Ele afirma que eu afrontei o judiciário ao dizer que o cancelamento do ato de solidariedade à deputada Marina do MST era um absurdo, por dizer que a nossa organização tinha que se manter ativa e íamos apresentar um recurso contra a arbitrariedade. A obrigação do juiz era garantir a realização do ato pacífico que vários coletivos estavam organizando contra a violência que sofreu a deputada", prosseguiu.
À reportagem da Fórum, o deputado federal Glauber Braga informou que já entrou com recurso contra a decisão do juiz Sergio Roberto Emilio Louzada e que vai acionar o Conselho Nacional de Justiça contra o magistrado.
"Estamos recorrendo dessa decisão absurda. É um evidente abuso de autoridade. Além disso vamos representar contra esse juiz no Conselho Nacional de Justiça", declarou o parlamentar.