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Zambelli pode ter que devolver dinheiro que ganhou em vaquinha criada para "pagar processos"

Advogado ingressou com ação na Justiça contra a deputada apontando que a iniciativa fere o princípio da moralidade pública e solicitando a devolução de todo o valor arrecadado

A deputada Carla Zambelli.Créditos: Paulo Sérgio/Câmara dos Deputados
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A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) anunciou, nesta terça-feira (9), o encerramento da  "vaquinha" virtual que havia criado para angariar dinheiro com o objetivo de, supostamente, pagar indenizações e custas de processos judiciais dos quais é alvo. 

Apesar de receber um salário bruto de R$ 41 mil mensais como parlamentar, Zambelli foi às redes sociais para pedir dinheiro à população e, em poucos dias, superou sua meta de R$ 100 mil e alcançou mais de R$ 168 mil arrecadados. Ao encerrar a "vaquinha", a bolsonarista ainda sugeriu doar o excedente para instituições de caridade ou mesmo fazer um "caixa" para futuras ações na Justiça contra ela. 

A deputada, entretanto, pode ser obrigada a devolver aos doadores todo esse montante. Isso porque a 14ª Vara Federal do Distrito Federal recebeu uma ação popular protocolada pelo advogado Amaury Soares Marques Junior contra a arrecadação virtual de Zambelli.   

Segundo Marques Junior, a iniciativa da parlamentar, apesar de não ser ilegal, é imoral, sendo que há normas que vedam a arrecadação de dinheiro por parte de agentes públicos. 

"O princípio da moralidade pública é anterior à legalidade; é a moralidade que norteia a norma. Considero que determinados atos quando praticados por entes públicos ferem a ética, e utilizar-se da notoriedade que a função de deputada confere com intuito de arrecadar dinheiro da população, mormente quando se diz perseguida pela Justiça, é uma dessas hipóteses. Cito na minha petição inicial que diversas normas vedam a arrecadação pelo agente público de dinheiro ou presentes", explicou o advogado em entrevista à Fórum.

Na ação popular, Marques Junior cita, por exemplo, o artigo 317 do Código Penal, que trata de corrupção passiva e veda "solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.

"Repito que não estou imputando responsabilidade penal à deputada, mas há vedação expressa no recebimento de qualquer vantagem e, se não há crime, ao menos imoralidade há. Em outro exemplo, menciono [na ação protocolada junto à Justiça] o episódio das joias presidenciais, para demonstrar que o Tribunal de Contas da União é intolerante com presentes com valores elevados (a vaquinha pretendia arrecadar R$ 100.000 e, nas palavras da própria deputada, arrecadou quase R$ 200.000)", salienta.

"Se considerarmos a lei eleitoral, então, a questão é mais óbvia ainda, porque não se pode captar recursos sem controle, sem fontes auditáveis", prossegue.

Marques Junior afirma, ainda, que a captação de recursos por meio da vaquinha virtual "pode servir à lavagem de dinheiro, uma vez que basta se utilizar de mecanismo de arrecadação sem controles para criar fontes de recursos ilícitas". 

"Alucinada conspiração" 

Na petição inicial da ação popular protocolada junto à Justiça, o advogado Amaury Soares Marques Junior afirma que a criação da "vaquinha" on-line por parte de Zambelli é um fato grave sob o aspecto da moralidade pública, pois "possibilita o uso desenfreado de instrumentos sem qualquer controle para arrecadar fundos para uma parlamentar".

De acordo com o advogado, o objetivo da ação é coibir a utilização do cargo para arrecadar dinheiro da população "que se vê manipulada com afirmações de que o sistema Judiciário participa de alucinada conspiração contra a deputada". 

"Tal versão, sem qualquer mínima prova, é consolidada e robustecida pela condição de deputada federal, que confere às alucinações perpetradas caráter de veracidade, a ponto de comover a população a doar para a campanha sem sequer avaliar o mérito dos pedidos", diz um trecho do documento encaminhado à 14ª Vara Federal do Distrito Federal. 

A partir desses argumentos, o advogado solicita à Justiça que seja determinada a interrupção da "vaquinha" virtual de Carla Zambelli, a retenção de todo o valor arrecadado e a devolução do dinheiro a todos os doadores

"Em verdade, entendo que, se por um lado não há vedação legal à captação de dinheiro privado por agentes públicos por meio de vaquinhas, por outro, tangenciar as normas proibitivas faz deste ato imoral, atingindo a administração pública", sublinha Marques Junior.