Oposição é algo necessário, indispensável e desejável numa democracia e pode ser feita de várias formas, inclusive de maneira insistente, implacável e até “agressiva”. Só que quando a oposição vira desespero e esbarra no ridículo, a coisa muda de figura. Que Lula não teria moleza em seu terceiro mandato, isso já era esperado e até óbvio, mas um pedido feito por um deputado federal do Partido Novo à Justiça mostrou que essa percepção do que é esdrúxulo está um pouco debilitada.
Felipe Camozzato (Novo-RS) entrou com um pedido na Justiça Federal para que o governo Lula não seja chamado de governo Lula nos textos ou notícias divulgados pelos órgãos de comunicação estatais e institucionais. Segundo o parlamentar, ao fazê-lo “ferem-se os princípios norteadores do direito administrativo brasileiro, em especial o da impessoalidade”. Não, você não leu errado. O governo Lula, ao chamar-se de governo Lula, como o governo Bolsonaro era o governo Bolsonaro e o governo FHC era o governo FHC, teríamos um problema legal, segundo o deputado.
O que chama a atenção é que o partido de Camozzato, o Novo, espécie de legenda bolsonarista envergonhada e cínica, foi a sigla que se manteve mais fiel na Câmara dos Deputados ao governo extremista, caótico e beligerante de Jair Bolsonaro (PL), atrás apenas do próprio partido do ex-presidente. A gestão de Bolsonaro ficou conhecida pelo culto grotesco à personalidade do líder radical, que em tudo era enaltecido, quase como um ditador, e que desfilava pelo país em suas motociatas, gastando milhões dos cofres públicos, apenas para ser saudado pelos seus fanáticos e violentos seguidores, e usando os órgãos da imprensa estatal para divulgar as infames arruaças. Pelo visto, Camozzato não via problema nisso, mas o governo Lula chamar-se governo Lula não pode.
Um outro fato que salta aos olhos é a admissão tácita, ainda que inconfessável, de que Lula tem um colossal apelo junto ao povo. Um dos argumentos do bolsonarista não assumido é que “no imaginário popular governo federal e governo Lula são expressões intercambiáveis, promovendo continuamente a captura do poder público por parte de um agente político”. Ele assume o poder político e eleitoral do atual presidente ao implorar à Justiça que Lula não se associe a um governo que é seu, conquistado nas urnas.
“O compromisso do governo Lula é melhorar a vida de todo o povo brasileiro, em especial de quem mais precisa” é uma das frases usadas por Camozzato em seu pedido enviado à Justiça. É inconcebível para ele que Lula se associe a uma política que ele, Lula, desenvolve, uma vez que todos conhecem as prioridades de campanha e de governo do petista. Jamais alguém impediu que outro candidato também falasse desses temas. Se não o fazem, é porque essas questões não lhes são caras.