"AQUÁRIO"

Relato de Cid sobre gabinete do ódio confirma revelação feita pela Fórum em janeiro

Fonte do governo Lula já havia confirmado à Fórum que estrutura bolsonarista para divulgar fake news e atacar adversários funcionava dentro do Palácio do Planalto

Bolsonaro com uma caneca que ironiza a existência do.Créditos: Reprodução
Escrito en POLÍTICA el

O relato tenente-coronel e ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro Cid, à Polícia Federal, no âmbito de um acordo de colaboração premiada, dando conta de que o chamado "gabinete do ódio" do governo de Jair Bolsonaro funcionaria dentro do Palácio do Planalto, corrobora com informações reveladas pela Fórum em janeiro de 2023

No depoimento à Polícia Federal colhido em 28 de agosto, Cid revelou que pelo menos três funcionários do governo Bolsonaro utilizavam a estrutura oficial da Presidência da República, mais especificamente Palácio do Planalto, para pôr em funcionamento o chamado “gabinete do ódio”, onde eram produzidas, de forma sistemática, fake news e publicações de ataques a adversários que eram disparadas nas redes sociais e grupos de aplicativos de mensagens instantâneas, como WhatsApp e Telegram. 

Tércio Arnaud Tomaz, José Matheus Sales Gomes e Mateus Matos Diniz seriam os citados por Cid como responsáveis por operar uma sala do Palácio do Planalto onde esse tipo de conteúdo agressivo era criado, sob comando do vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), filho do líder extremista. Os dois primeiros estavam lotados no gabinete pessoal de Bolsonaro, enquanto o último era funcionário nomeado na Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom).

"Aquário"

Em 23 de janeiro deste ano, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua equipe começavam a ocupar o Palácio do Planalto, a Fórum revelou, com exclusividade, que o gabinete do ódio, grupo que, sob as ordens de Jair Bolsonaro, atuaria de forma coordenada para espalhar fake news e discurso agressivo contra adversários de seu antigo governo, através do disparo em massa de mensagens, utilização de robôs e perfis falsos, tinha uma estrutura montada dentro da sede da Presidência

Trata-se de uma sala "aquário" no subsolo do Palácio do Planalto que, segundo a Fórum apurou, contaria com tecnologia de ponta - além de alguns detalhes mais que suspeitos. 

As informações foram divulgadas, a princípio, pelo advogado especialista em direito público Tauat Resende, e confirmadas à Fórum por um membro do primeiro escalão do governo Lula. "A sala usada pelo Gabinete do Ódio era um aquário. Lá, todos os computadores eram MacBooks. E o acesso era por uma porta que abria com um crachá especial. Para sair, apenas um botão de dentro pra destravar a porta", relatou Tauat. 

Segundo o advogado, alguns dos membros do gabinete do ódio continuaram indo "trabalhar" normalmente após a vitória eleitoral de Lula, o que acendeu um alerta sobre a presença remanescente de bolsonaristas e militares dentro do novo governo. Não à toa, o presidente exonerou, ainda em janeiro, uma série de militares levados pelo general Augusto Heleno ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), e parte deles poderia ter ligações com o grupo montado para disseminar discurso de ódio e fake news. 

A equipe de Bolsonaro não deu as senhas da sala em questão para o novo governo, e apenas duas semanas após a posse de Lula que a administração atual conseguiu acesso ao local, segundo relato repassado à Fórum pelo membro do primeiro escalão do Palácio. 

"Não se desfez" 

No dia 15 de janeiro, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, tratou sobre a existência do gabinete do ódio ao anunciar a criação da "Rede da Defesa da Verdade", um mecanismo a ser instalado no bojo de sua pasta para contrapor a estrutura de mentiras que havia sido criada pelo governo Bolsonaro e que, segundo ele, segue em operação. 

Pimenta destacou que o governo anterior teria empenhado recursos públicos para manter o  gabinete do ódio. 

"Bolsonaro gastou 300 bilhões de reais do povo brasileiro para tentar se manter no poder. Fora a quantia de recursos não contabilizada oficialmente, de setores que tinham interesse em sua vitória, e despejaram rios de dinheiro para promover o medo o ódio e as Fake News", escreveu. 

"Uma poderosa máquina de comunicação com recursos públicos e privados, legais e ilegais, esteve no centro da estratégia de poder de Bolsonaro. Grande parte desta estrutura segue atuando e foi por onde os atos criminosos foram organizados. O 'gabinete do ódio' não se desfez", prosseguiu. 

Computadores do GSI 

Pelo menos cinco computadores do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, durante o governo de Jair Bolsonaro, foram usados pelo chamado gabinete do ódio para disseminar fake news nas redes sociais e atacar adversários daquela gestão. O fato teria sido descoberto pela Polícia Federal no âmbito das investigações dos atos golpistas que ocorreram no país após a vitória eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A informação é da jornalista Thais Bilenky, da revista Piauí, reportada numa live transmitida no início de fevereiro deste ano. 

Thais lembrou que o comando do GSI, durante todo o mandato de Bolsonaro, esteve a cargo do general da reserva Augusto Heleno, que é alvo de dezenas de acusação que o apontam como um dos maiores colaboradores e articuladores das tentativas de golpe frustradas levadas a cabo por seguidores do ex-mandatário brasileiro de extrema direita que fugiu para os EUA antes mesmo do fim de seu mandato.

Fórum já havia noticiado, em várias reportagens, que o GSI e Heleno teriam participação nesses eventos criminoso, segundo uma fonte da Polícia Federal lotada no Palácio do Planalto que falou sob condição de anonimato.