Em café da manhã com jornalistas nesta sexta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva rejeitou que as Forças Armadas voltem a ser utilizadas, como em governos anteriores, para garantir a segurança pública. "Não quero as Forças Armadas na favela brigando com bandido", disse Lula. "Não é esse o papel das Forças Armadas e enquanto eu for presidente, não vai ter GLO (Garantia da Lei e da Ordem). A gente não vai fazer nenhuma intervenção como já foi feita algum tempo atrás, se gastou uma fortuna com o Exército no Rio de Janeiro e não resolveu nada".
O presidente afirmou que a Aeronáutica poderá reforçar o policiamento nos aeroportos e a Marinha, nos portos, mas nem as Forças Armadas nem a Polícia Federal serão convocadas para suprir falhas dos governos estaduais, que são quem constitucionalmente têm a obrigação de cuidar da segurança pública. Lula garantiu ter boas relações com os militares e que o episódio do 8 de janeiro foi uma exceção incentivada por seu antecessor, Jair Bolsonaro.
"A relação é muito boa com os militares, não se pode julgar os militares pelo 8 de janeiro", disse Lula. "O que aconteceu em 8 de janeiro foi um desvio pela existência de um governante que sabia fazer tudo, menos governar, que achava que poderia utilizar as instituições como instrumento dele para fazer política, que não tinha nada de republicano na cabeça dele."
Lula também falou sobre o conflito Israel-Hamas e defendeu o fim do direito de veto no Conselho de Segurança da ONU, que beneficia cinco países entre os 15 com direito a voto: Estados Unidos, Rússia, China, França e Reino Unido. "Nossa proposta não foi rejeitada, é mentira. Ela foi aprovada por 12 países, 2 se abstiveram (Rússia e Reino Unido) e um vetou (EUA). Nós tivemos votos de dois países com direito de veto, China e França. O direito de veto é uma loucura, sou radicalmente contra, não é democrático."
O presidente fez questão de mais uma vez citar a "insanidade" do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. "Nós dissemos desde o primeiro momento que o ataque do Hamas foi terrorista, não é possível matar, sequestrar gente sem medir as consquências do que viria depois, porque agora o que temos é a insanidade do primeiro-ministro de Israel querendo acabar com a faixa de Gaza, se esquecendo que lá não tem só soldados do Hamas, tem mulheres, tem crianças, que são as grandes vítimas dessa guerra", disse, defendendo a criação de um Estado palestino. "Foi um brasileiro, Osvaldo Aranha, que presidiiu a reunião da criação do Estado de Israel, por isso a ONU deveria ter coragem de criar o Estado da Palestina."
Lula, que está completando 78 anos hoje, disse estar se sentindo muito bem após a cirurgia no quadril, mas que não pretendia comemorar por estar entristecido com as imagens que vê dos bombardeios israelenses em Gaza. "O mundo está mais para triste do que para alegre. Quando vejo essas fotos de crianças morrendo fico com o coração partido."
O presidente comentou ainda sobre a possibilidade de indicar o ministro da Justiça, Flavio Dino, para o STF (Supremo Tribunal Federal). "Flavio Dino é uma pessoa altamente qualificada do ponto de vista do conhecimento jurídico e do ponto de vista político. Mas eu fico pensando: onde será mais justo e melhor para o Brasil? É na Suprema Corte ou no Ministério da Justiça? Isso é uma dúvida que tenho e vou conversar com muita gente ainda antes de escolher."
Sobre a pressão que sofre do governo, Lula afirmou enxergar como natural da democracia. "O Congresso não é um espaço onde se diz amém a tudo que o Executivo quer. Eles não são obrigados a fazer tudo que eu quero. Sarney rebolava muito para conseguir governar", disse, negando negociar com o centrão. "Eu não converso com o centrão, eu converso com os partidos. Como o governo precisa do parlamento, tem que ter humildade para conversar. Em oito anos, Obama não conseguiu aprovar nenhum projeto. Estou vendo as dificuldades do Biden."
Lula lembrou que, se os brasileiros querem um Congresso tenha outra relação com o Executivo precisam se lembrar disso na hora de votar para o Legislativo. "O Congresso Nacional é a cara do povo brasileiro no dia do voto. Temos que mudar na próxima eleição", disse, e advertiu, sobre os papéis de cada poder: "O presidente não pode pedir o impeachment de um deputado, mas um deputado pode pedir o impeachment de um presidente."