Era um fim de tarde em Buenos Aires, dia de eleição, bem em meio a um ato realizado por militantes do candidato de extrema direita à presidência da Argentina, Javier Milei, quando o filho “03” do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL), o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), apareceu ao vivo para uma entrevista, em plena da rua, no Canal 5 Noticias (C5N), a maior audiência da TV a cabo no país vizinho.
Entre as bobagens habituais, como “luta contra o comunismo” (imaginário) e o “combate à corrupção” (integrando uma família afundada em escândalos do tipo), o parlamentar extremista entra naquele que é seu mais conhecido “samba de uma nota só”: armas. Em poucos segundos, como invadiu a seara da segurança pública, já estava falando “da importância de liberar armas para todos os ‘cidadãos de bem’ e dar cursos de tiros” quando, de repente, o âncora que conduzia o programa jornalístico simplesmente deu ordem para cortá-lo e tirá-lo do ar.
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“Obrigado, Mariano (repórter)... A Argentina é generosa demais em receber esse tipo de gente... Por isso que seu pai foi, logicamente, tirado do poder pelos brasileiros”, disparou o comandante da atração jornalística televisiva, entrando com outro repórter, de outro local.
Imediatamente começou a gritaria na bolha da extrema direita reverberando a tese de que o descompensado parlamentar fora “censurado” e/ou “vítima de uma emissora comunista”. Houve até quem, mesmo não integrando a caravana dos ultrarreacionários, concordasse com a versão de que Eduardo teria sido “calado” em seu direito de “falar o que pensa”. Não. Definitivamente, não.
“Essa gente”, como bem definiu o âncora da C5N, falando essas barbaridades e plantando a semente do ódio e da violência desmedida, especialidade do clã extremista brasileiro, já mostrou seu poder de causar estrago a uma sociedade por meio dessa cantilena abjeta e nojenta que só fomenta esse tipo de absurdo. O Brasil é um país, hoje, conflagrado e isso se deve à entrada em cena desses desajustados morais, que acima de tudo sonham com um mundo de trevas, mortes, violência, tiros, torturas e maldades.
A Argentina tem mil defeitos como nação e sociedade, como todos os países, e até mesmo já pariu seu monstro, no caso o próprio Javier Milei, mas no lugar onde torturadores, ditadores e genocidas foram parar na cadeia, referência mundial em “justiça e memória”, é inadmissível que um sujeito rasteiro como esse apareça nos lares nacionais incentivando uma política de distribuição de armas para que cidadãos se matem e aumentem ainda mais a violência o caos social do país.
Bolsonaro, o pai, assim como seus filhos, num segundo momento, surgiu nas casas brasileiras com sua escatologia moral, em programas como o da apresentadora Luciana Gimenez, ou no extinto CQC, reverberando groselhas dantescas, como surrar gays, matar todos que ele considera “criminosos”, pagar menos para mulheres porque elas engravidam e homenagear ditadores assassinos notórios. O resultado? Isso deu luz a essa mentalidade obtusa e perigosa e suas frustrações como um indivíduo politicamente insignificante e moralmente parco se espalharam como um vírus. Aliás, ele não acredita no perigo dos vírus e na ação da ciência contra eles, o que não à toa nos fez o maior cemitério da Covid-19 no planeta.
A retirada do ar, de forma nada honrosa e pouco educada, de Eduardo Bolsonaro foi uma ação necessária e acertadíssima por parte da C5N. A tomada de decisão do âncora, e certamente dos editores responsáveis que estavam no switcher, visou tão somente à preservação do mínimo de paz social necessária a um país já polarizado e que também flerta com o autoritarismo (outra vez). Se tivéssemos feito o mesmo por aqui, talvez o cenário atual pudesse ser outro.