A Polícia Federal realizada nesta terça-feira (26) a Operação Cianose, que investiga a contratação pelo Consórcio Nordeste de uma empresa para o fornecimento de 300 ventiladores pulmonares durante a primeira onda da pandemia de Covid-19.
O Consórcio Nordeste, fruto de uma articulação entre os governadores do Nordeste diante da inépcia do governo Bolsonaro no combate e prevenção à Covid, sempre foi alvo de acusações do governo federal e de bolsonaristas. Durante a realização da CPI da Covid, os senadores da base do governo tentaram emplacar investigações contra o Consórcio, mas sem sucesso.
Ao todo, quatorze mandados de busca e apreensão são realizados no Distrito Federal, São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, todos expedidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Na mesma linha da narrativa estabelecida pelos parlamentares bolsonaristas, a Polícia Federal afirma que a compra dos equipamentos contou com diversas irregularidades, tais como o pagamento antecipado de seu valor integral, sem que houvesse no contrato qualquer garantia contra eventual inadimplência por parte da contratada. A corporação também destaca que nenum respirador foi entregue. O contrato tem valor de 45 milhões.
Durante o auge da pandmeia, o Consórcio do Nordeste foi presidido pelo governador da Bahia, Rui Costa (PT), depois pelo ex-governador do Piauí, Wellington Dias (PT). Atualmente o Consórcio é presidido pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), todos eles são aliados do ex-presidente Lula, que vai disputar a eleição presidencial com o presidente Bolsonaro.
“É cortina de fumaça”, diz Carlos Gabas
Na época em que o Consórcio do Nordeste se tornou alvo dos bolsonarista, o secretário executivo do grupo, Carlos Gabas, conversou com a Fórum e afirmou que tudo não passava de "cortina de fumaça" e que o grupo foi vítima de um golpe.
Carlos Gabas declarou em entrevista ao Fórum Onze e Meia que a tática dos senadores bolsonaristas de a todo momento trazer a questão da compra de respiradores feita pelo Consórcio “é cortina de fumaça” e que na verdade eles deveriam estar explicando as mais de 400 mil mortes.
A base de apoio do governo Bolsonaro se refere a primeira compra feita pelo Consórcio de 300 respiradores, no valor de R$ 48,7 milhões, mas que, por má fé da empresa Hempcare, não houve entrega dos aparelhos e nem a devolução do dinheiro. Gabas destaca que à época eles denunciaram o caso.
“Quando começou a pandemia o primeiro consórcio que pediu reunião com o presidente da República e com o ministro da Saúde, que na época era o Mandetta, fomos nós. Os governadores pediram a audiência e o presidente concedeu. E o governador Rui Costa (PT-BA), que era o presidente do consórcio na época disse claramente: precisamos de uma coordenação nacional para enfrentar a pandemia. São várias frentes de enfrentamento: uma delas é com uso de máscara, distanciamento; e a outra é suprimentos: equipamentos, medicamentos, insumos, tudo que é necessário para o enfrentamento da pandemia”, relatou Gabas.
Em seguida Carlos Gabas conta que o presidente afirmou que o então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ficaria à disposição do consórcio. “Nós insistimos com mais duas reuniões com o ministro da Saúde e isso nunca aconteceu. O que tinha naquela época? Um quadro na Europa onde a gente via todos os dias as pessoas morrendo por falta de respirador e oxigênio. Era um quadro assustador onde as pessoas diziam 'só consegue salvar se tiver respirador’. E o que nós fizemos? Começamos a correr atrás de respirador. A primeira busca nossa foi na OMS. Nós entramos em contato com a Opas (Organização Panamericana de Saúde) que é o braço da OMS na América Latina e pedimos ajuda para que eles oferecessem empresas e fornecedores de respiradores, porque não tinha em lugar nenhum. Nós buscamos fornecedores no Brasil, mas por uma opção de política do governo federal, de desindustrialização, o Brasil não produz respirador em quantidade suficiente”, disse.
Gabas relata que a Opas não tinha lista de fornecedores e então eles tentaram outros caminhos. “Aí começamos a buscar outros fornecedores: a embaixada China, da Alemanha, na Índia, onde estão os principais fornecedores, mas também não tivemos sucesso. A China nos disse ‘os nossos fornecedores estrão com toda a produção comprada’. Vários estados tentaram e não conseguiram. Naquele momento de crise os fornecedores exigiam o pagamento adiantado para você garantir a compra do equipamento. Isso tanto é verdade que o governo federal, naquela época, editou um MP autorizando a compra emergencial sem edital”.
Diante de tal cenário, o Consórcio resolveu então organizar uma compra que seria centralizada no governo da Bahia. “Nós assinamos um convenio com o governo do estado da Bahia, pois o Rui (Costa, governador da Bahia) havia dito que o governo da Bahia tinha estrutura pra fazer a comprar, então nos firmamos o convenio com o governo da Bahia, para que operacionalizasse essa compra e assim foi feito”, revela Gabas.
Nesse ínterim, surge uma empresa oferecendo os respiradores. “Ao final da negociação, apareceu uma empresa oferecendo, mostrava um contrato com um fornecedor da china. Foram 300 respiradores para os nove estados do consórcio. Essa compra teve o pagamento antecipado só que empresa começou a atrasar. No segundo comunicado de atraso, eles diziam que tinha um erro na válvula dos aparelhos. Nós reunimos a equipe e eu disse ao governador Rui ‘tem problema. Eles não estão entregando porque venderam o que não tinham’. O que aconteceu naquele momento é que vários venderam equipamentos que já tinham vendido várias vezes. Imediatamente o governador disse ‘vamos denunciar’”, relata o secretário executivo do Consórcio do Nordeste.
“A empresa tentou entregar aparelhos diferentes, diziam que tinham um fornecedor. E nós dissemos claramente ‘não senhora, nós temos um contrato para uma marca e um modelo. Ou a senhora entrega essa marca e modelo, ou devolve o dinheiro’. A empresa não entregou e eu fui pessoalmente a secretaria de segurança pública, fiz um relato do que aconteceu e esse relato redundou numa operação chamada Ragnarok. A investigação da Polícia chegou a uma quadrilha e prendeu três empresários que confessaram ‘nós associamos para tomar dinheiro da Bahia’”, revela.
A Operação Ragnarok resultou na prisão de Cristiana Prestes, dona da Hempcare, e o sócio dela, Luiz Henrique Ramos, e do empresário Paulo de Tarso. A empresa vendeu e não entregou os respirados citados por Gabbas. Segundo investigação da PF "nunca teve aparelhos.
“E o depoimento dessas pessoas que estavam presas diz "tem R$ 10 milhões nos EUA, nós demos R$ 3 milhiões para não sei quem. Eles estavam começando a devolver o dinheiro. Na renovação da prisão houve uma contestação judicial aqui no Ministério público da Bahia dizendo que a Bahia não era competente pra fazer essa investigação". A juíza acatou essa manifestação e mandou soltar os presos e desbloquear os bens”, disse Gabas.