Após ser intimado pela ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), a se manifestar em até 24 horas sobre uma ação contra o presidente Jair Bolsonaro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, informou à magistrada nesta segunda-feira (16) que abriu uma “investigação preliminar”.
O PGR, que já havia sido cobrado pelo STF, passou 13 dias em silêncio sobre uma notícia-crime protocolada pelo PT junto à Corte que acusa Bolsonaro de abuso de poder e campanha eleitoral antecipada por ter usado a TV Brasil para transmitir live com fake news sobre as eleições e as urnas eletrônicas.
Chama a atenção o fato de que Aras informou à Cármen Lúcia que abriu a tal apuração no dia 12 de agosto, mas só comunicou o fato nesta segunda-feira. Além disso, uma "investigação preliminar", no Ministério Público, é um procedimento interno, e não a abertura de um inquérito de fato.
"A depender da robustez dos elementos obtidos por meio dessas diligências, cabe ao órgão ministerial, então, discernir em torno de oferecimento de denúncia, de dedução de pedido de instauração de inquérito ou ainda de arquivamento, comunicando-se, oportunamente, ao respectivo Relator", escreveu o PGR em seu despacho, sem fazer qualquer consideração sobre os elementos de possíveis crimes cometidos por Bolsonaro, classificados por Cármen Lúcia como "graves".
Enrolação
Em entrevista à Fórum, o deputado federal Alencar Santana Braga (PT-SP), que é um dos autores da notícia-crime em questão, afirmou que essa manifestação tardia de Aras, falando em "investigação preliminar", é uma "enrolação" do PGR.
"Isso é uma verdadeira enrolação, porque mesmo com essa manifestação dele de dizer que criou uma apuração preliminar, isso não existe no ponto de vista do direito. Ele não abriu o inquérito", declara.
"Nós representamos, a ministra Cármen Lúcia mandou ele se manifestar. Ele podia até dizer que não vê razão para abrir ou tomar uma providência. Agora ele abre uma investigação interna. O que é isso do ponto de vista jurídico e do Ministério Público em seus procedimentos?", questiona.
Segundo Alencar, "a demora [em se manifestar] e a revelação de que abriu esse procedimento interno mostra que ele age claramente pra proteger o Bolsonaro e para não apurar os crimes cometidos pelo presidente, que são reiterados".
"É para tentar enganar as pessoas dizendo que está fazendo algo e para evitar que os crimes de fato sejam apurados, porque ele sabe que a conduta do presidente foi criminosa", diz ainda.
À Fórum, o deputado revelou ainda que vai "provocar" mais uma vez a ministra Cármen Lúcia para saber se ela considera essa resposta de Aras satisfatória.
Notícia-crime
A ação apresentada pelo PT se deve ao fato de que o presidente usou a TV Brasil para transmitir live que disseminou fake news contra sistema eleitoral brasileiro.
Uma emissora pública, como é o caso da TV Brasil, por lei, deve ter caráter informativo e educativo. O espaço, no entanto, foi utilizado de forma a amplificar para mais pessoas as distorções e mentiras do presidente sobre as eleições.
“Sem nenhum pudor de ordem moral, o representado conspurcou seu honroso cargo de presidente da República para utilizar indevidamente bem público e um assessor também pago com recursos do tesouro nacional para fazer autopromoção e difundir mentiras sobre o processo eleitoral, por mais de 2 horas, ao vivo em rede pública de TV”, diz um trecho da notícia-crime dos deputados petistas, que aponta suposta prática de improbidade, crime eleitoral e abuso de poder econômico e político por parte de Bolsonaro.
Campanha antecipada e abuso de poder
Em entrevista à Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, professor de direito eleitoral e coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), disse que o uso da TV Brasil para a transmissão da live do presidente configura campanha eleitoral antecipada e abuso de poder.
“Uma TV pública não pode se prestar a isso. De forma alguma. Ela tem o pressuposto de informar a população, de mostrar diversas opiniões, e não de dar palanque a uma live do presidente que não apresenta nada de concreto, faz simplesmente um discurso retórico, requenta coisas anteriormente ditas. Isso é, sim, campanha antecipada, abuso de poder político e merece devida reprimenda, acionando o Ministério Público Eleitoral para que a Justiça Eleitoral tome as medidas cabíveis”, atesta.